Não há dúvidas de que assistir a um brutal assassinato gera comoção e revolta. Principalmente quando não sabemos o contexto em que esse terrível ato aconteceu. Não penso que haja justificativa para o ocorrido, mas o histórico da vítima nos faz pensar que esse seria seu desfecho natural, mais cedo ou mais tarde. E assim é para todas as pessoas que, independente da cor ou raça, têm a violência em suas vidas. Seja por morte matada ou morte morrida.
Segundo o IBGE, somos 56% negros (pardos e negros) e 44% não negros (brancos, amarelos e índios). Há 52% de mulheres e 48% de homens. O Brasil é um país violento. Segundo o Atlas da Violência, a cada ano são 65 mil homicídios (60 mil homens, 5 mil mulheres, 50 mil negros e 15 mil não negros), 15 mil suicídios (12 mil homens, 3 mil mulheres, não havendo estatística sobre raça) e 40 mil mortos no trânsito (32 mil homens e 8 mil mulheres, 16 mil negros e 24 mil não negros). A população carcerária do Brasil é de 770 mil pessoas (700 mil homens, 70 mil mulheres, 510 mil negros e 260 mil não negros).
Há uma forte relação entre violência e transtornos mentais, tanto para causar como para sofrer. Os transtornos mentais mais relacionados à violência são dependência química, estresse póstraumático, esquizofrenia, deficiência intelectual, transtorno de humor bipolar e transtornos de personalidade. Há um claro predomínio do sexo masculino nesses transtornos. Não há estatísticas sobre raça nesse campo.
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Homens têm uma pior escolaridade do que mulheres. O analfabetismo é maior em negros do que não negros. O desemprego é maior em homens e em negros. A renda média mensal é menor para mulheres e para negros. 25% da população vive abaixo da linha da pobreza e 6% da extrema pobreza. A cada cem pessoas que vivem na pobreza, 73 são negras.
A violência está associada a fatores socioeconômicos, escolaridade, nutrição, estrutura familiar, cultura, religiosidade, ausência ou excesso de punição, transtornos mentais e escassez de recursos e oportunidades. Violência é muito mais comum em homens e negros são mais expostos, como vítimas e como algozes. Pode se perceber que há muito o que ser feito para reduzirmos a violência. Governadores, prefeitos e seus apoiadores que fecham escola e quebram a economia estão contribuindo diretamente para o aumento da violência. Executivo, Legislativo e Judiciário vivem numa bolha. Brigam entre si, num joguinho mesquinho de poder e privilégios, relegando a segundo plano medidas reais no combate a miséria, violência, desigualdades de oportunidades e desassistência à saude mental.
O homem que morreu no Carrefour não morreu por ser negro. Morreu por ser violento. E tinha muitos fatores para ser violento, a começar pelo próprio pai. Com escolas fechadas, desemprego, miséria e transtornos mentais, teremos mais violência e morte. Mas não para os habitantes do mundo encantado do lockdown. Esse desfecho terrível é para eu e você. Independente de cor, raça ou sexo.
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