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VENÂNCIO AIRES

Vila Mariante lamenta fim da escola estadual do distrito

Foto: Rodrigo Assmann

Casal de agricultores Paulo e Iria Terezinha mostra para o neto Isaque o que restou da escola onde a família costumava estudar

Passava das 14 horas dessa quinta-feira, 19, quando a agricultora Iria Terezinha da Silva, de 62 anos, aproximou-se das ruínas da Escola Estadual de Ensino Médio Mariante, no interior de Venâncio Aires, ao lado do neto Isaque Ribeiro da Silva, de 4 anos. Ela e o marido Paulo Ribeiro, de 73, percorrem a localidade em busca de materiais doados para reconstruir a casa onde moram. Com a voz embargada, a avó mostrou para a criança o que restou do lugar onde os três filhos – incluindo Adalberto, pai de Isaque – haviam estudado. As lágrimas escorreram pelo rosto de Iria ao se dar conta de que, no ano que vem, quando chegar a vez de o neto começar os estudos, não irá seguir a tradição familiar.

Isso porque a partir desta sexta-feira, 20, a escola de Mariante, fundada há 85 anos, fechará definitivamente as portas. O fim das atividades deve-se aos danos provocados pela catástrofe climática registrada entre abril e maio na localidade, que fica perto da RSC-287 e a 25 quilômetros do centro da cidade. Situada na ERS-130, próximo às margens do Rio Taquari, a instituição era a principal referência da localidade.

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Para os moradores, o fechamento das portas encerra um importante capítulo da sua história. A escola representava um registro do passado, um alento ao presente e o sonho de um futuro para as crianças. Nas paredes, que se destacavam pela estrutura colorida e uma enorme pintura com personagens do desenho Ursinho Pooh, os estragos provocados pela catástrofe climática ganham evidência. Logo na entrada, uma grande pilha de material escolar danificado pela inundação demonstra o pouco que restou.

De acordo com a Secretaria Estadual da Educação, os cerca de 120 alunos foram transferidos para outras instituições. Uma delas é a Escola Adelina Isabela Konzen, em Linha Estância Nova, a cerca de 13 quilômetros de Vila Mariante, que oferece Ensino Médio em tempo integral.

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A pasta informou que os danos foram severos e comprometeram o espaço, com estragos no pátio e nas instalações elétricas, assim como a perda de bens materiais e documentos. Além disso, laudos científicos atestam que a estrutura do terreno já estava fragilizada pelas enchentes de 2023.

Em nota, a direção da escola lamenta a decisão. Escreve que, para a comunidade, resta a tristeza, o desolamento e a sensação de impotência perante o fato. “No pós-enchente, as pessoas estão fragilizadas, procurando onde morar e trabalhar para colocar comida na mesa. A mobilização pela escola fica difícil diante da luta pela sobrevivência e da falta de vontade política daqueles que poderiam fazê-la.”

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“Traumas que dificilmente serão curados”

A servidora pública Débora Fernanda Santos, de 39 anos, mora em Mariante desde 2012. Possuía um forte vínculo com a escola, onde a filha Manuela, de 8 anos, cursava o terceiro ano do Ensino Fundamental. Foi também o local onde o marido e familiares estudaram. Por isso, ficou chocada ao ver o estado deplorável da instituição após as enchentes. “Foi uma cena que jamais vou esquecer. O colorido da nossa escola perdeu o encanto para a lama e a destruição”, descreveu.

Segundo Débora, a comunidade estava se reerguendo após os estragos provocados em 2023. Moradores uniram-se no mutirão de limpeza e reconstrução, com a expectativa de dias melhores. Os esforços, no entanto, foram destruídos na catástrofe histórica mais recente. Passados 233 dias, os danos permanecem evidentes no distrito de Venâncio Aires. A destruição está em toda parte, em especial nos escombros de lares. Em meio às ruínas, terrenos vazios, onde as casas foram arrancadas pela força das águas.

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Com os estragos sem precedentes em Mariante, o distrito se tornou inabitável. Muitos ficaram desabrigados e precisaram buscar um novo lar em outras localidades e municípios. “A tragédia deixou traumas que dificilmente serão curados”, afirmou Débora.

Débora Santos lembra que a instituição era um marco importante na comunidade | Foto: Rodrigo Assmann

A perda da escola, referência na comunidade, provocou um baque nos moradores. Débora precisou transferir a filha para a Escola Anita Ferreira Gomes, em Bom Retiro do Sul, a mais próxima da casa onde a família ficou por dois meses após a enchente. Mais tarde, passou a estudar na escola Adelina Isabela Konzen, em Linha Estância Nova, onde Débora trabalha atualmente.

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A notícia de que a antiga instituição de ensino não seria reaberta entristeceu a moradora. Para ela, não é apenas uma estrutura com tijolos e concreto, mas um espaço marcado pela emoção, memórias e sonhos. Débora acompanhou o empenho da comunidade escolar para evitar o fechamento. “Infelizmente, essa decisão não cabe àqueles que deram o seu melhor, com competência e coragem. A Escola Mariante ficará para sempre nas nossas memórias e nos nossos corações. Mas é lamentável estar sendo findada dessa maneira.”

Comunidade vive entre a dor e a saudade

A Escola Estadual de Ensino Médio Mariante foi fundada em 7 de janeiro de 1939. Na época, recebeu a denominação Coronel Brito. Por muitos anos, atendeu somente as séries iniciais (1º ao 4º ano). A partir de 1992, passou a oferecer Ensino Fundamental completo. Quatro anos depois, obteve a aprovação para o Ensino Médio, o que significou um grande avanço para o distrito de Venâncio Aires.

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Na metade dos anos 2000, a instituição finalmente recebeu o nome atual, sendo um destaque pela qualidade de ensino. Entre os projetos pedagógicos destacava-se a banda marcial, que desfilou pela última vez nas celebrações de 7 de setembro 2022, com a presença de egressos. 

Banda desfilou pela última vez em setembro de 2022 | Foto: Arquivo Pessoal

Porém, os sonhos foram interrompidos com as enchentes ocorridas nos últimos meses. As águas cobriram toda a estrutura da instituição. Em seu interior, nada restou, incluindo móveis, livros, documentos e registros históricos. O fim das atividades foi uma preocupação da comunidade escolar. Representantes da instituição, do Círculo de Pais e Mestres e do Conselho Escolar encaminharam um ofício solicitando definição sobre o futuro da instituição.

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Em novembro, em reunião com o responsável pela 6ª CRE, Luís Ricardo Pinho de Moura, foram informados de que as atividades seriam cessadas no fim do ano letivo. A justificativa, conforme a direção afirmou em nota, é de que o prédio encontra-se numa área de preservação permanente, somado ao baixo número de alunos. Além disso, de acordo com o texto, a construção de casas para as famílias desabrigadas em Mariante será feita próximo à Escola Adelina Isabela Konzen, onde o Estado investirá em novas salas.

As aulas foram paralisadas durante um mês, enquanto a 6ª Coordenadoria Regional de Educação e a Secretaria da Educação buscavam um local para que a instituição pudesse atuar. Diante da catástrofe, o número de alunos caiu consideravelmente. Em junho, três turmas de ensinos Fundamental e Médio em tempo integral foram abertas, totalizando 50 estudantes.

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A presidente do CPM, Maria Aparecida Gomes da Rosa, conta que as crianças estão se adaptando bem ao novo ambiente escolar. No entanto, aqueles que moram em localidades mais afastadas precisam lidar com um longo trajeto para poder estudar.

A mãe de Flávia, Gustavo, e David – de 16, 12 e 8 anos, respectivamente – afirma que todos sentem muita saudade do antigo prédio. “Era a segunda casa deles, de segunda a sexta-feira. Vai deixar muita saudade e uma dor muito grande em quem já fez parte da comunidade escolar e amava a escola”, afirmou Maria, que trabalha como professora.

Escola Adelina Isabela Konzen receberá investimento do Estado em novas salas | Foto: Rodrigo Assmann

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“Ninguém vai ficar sem aula”

Na manhã dessa quinta-feira, 19, o governador Eduardo Leite afirmou, durante coletiva de imprensa no Palácio Piratini, que o fechamento da escola de Mariante foi muito debatido com a comunidade. Após as enchentes registradas no fim de 2023 no Vale do Taquari, o Estado havia investido cerca de R$ 340 mil para compra de mobiliários. Ela estava em processo de reforma pelas secretarias da Educação e de Obras Públicas. Porém, com as inundações históricas neste ano, os reparos foram destruídos.

Assim, conforme a Secretaria da Educação, tornou-se inviável a continuidade das atividades presenciais na escola, classificada com o grau de criticidade mais severo pelos técnicos do Estado. “Quando se estava preparando a escola para ser reinaugurada, vieram as enchentes de maio e destruíram tudo de novo”, afirmou.

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Segundo o governador, o poder público continuará a dialogar com a comunidade para encaminhar a melhor solução. “Ninguém fica sem aula. Infelizmente, nessas condições, a simples reconstrução, naquele mesmo local e naquelas condições, não parece ser adequada levando em conta a recorrência de enchentes que se observa naquela comunidade.”

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