Considerado um dos casos mais emblemáticos de Santa Cruz do Sul envolvendo as áreas policial e política, a prisão preventiva do ex-vereador Paulo Lersch, em 2019, quebrou paradigmas. A primeira detenção de um parlamentar na história do município por crimes vinculados ao exercício de seu mandato foi o ponto alto da chamada Operação Feudalismo, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público (MP).
A captura completou cinco anos no último dia 5 de junho. Advogado que atuou na defesa do ex-vereador preso, Rafael Staub, foi o convidado do podcast Papo de Polícia, produzido pela Gazeta Grupo de Comunicações e lançado na última terça-feira. Entre bastidores do caso, ele revelou um fato até então inédito sobre a possibilidade de, na época, ocorrer uma delação premiada de Lersch sobre fatos envolvendo as investigações da Operação Feudalismo.
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No âmbito jurídico, a deleção premiada é um acordo entre acusado e MP, onde o delator colabora com as investigações e, em troca, recebe uma vantagem, que pode variar conforme as informações que forem prestadas. Ao final do rito, esse acordo deve ser homologado por um juiz, que vai analisar os fatos e avaliar o grau de colaboração e assim determinar o que será concedido, como, por exemplo, diminuição da pena, regime semiaberto, extinção da punibilidade ou perdão judicial.
“Na defesa, tentamos tudo o que estava ao nosso alcance, inclusive a delação premiada. O Paulo queria conversar. Tentamos uma conversa com o promotor e fomos até o MP. Mas o que nós percebemos é que tudo que ele falou já tinha sido salientado, visto e ventilado pela Promotoria nessa investigação que já vinha desde 2016”, comentou Staub.
Na prática, Lersch levou ao conhecimento do MP na época de sua prisão, em 2019, informações que considerava serem de relevância sobre eventuais práticas criminosas que poderiam estar ocorrendo no meio político. Contudo, a investigação da Operação Feudalismo já havia se aprofundado em tais elementos desde antes mesmo do pleito de 2016, de maneira que as alegações do vereador não representavam nenhuma nova evidência que já não tivesse sido apurada pelo Ministério Público.
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O advogado Rafael Staub relembrou no podcast da Gazeta que quando foi procurado para representar Lersch já estava sendo investigada a coação de testemunhas por parte do vereador, e ele alertou o parlamentar. “Imediatamente disse para ele que se aconteceu uma situação como a que estavam alegando, havia uma chance de ocorrer a preventiva. E foi a questão de falar e acontecer”, disse Staub.
Entre as estratégias adotadas pela defesa de Lersch na época estava a renúncia ao cargo de vereador, ocorrida em 1º de julho de 2019. A ideia do advogado, segundo o que disse no Papo de Polícia, era de que se Paulo Lersch não estivesse no exercício de suas funções – ou seja, impossibilitado de realizar qualquer ação delituosa ou manter contato com testemunhas – poderia ser evitada uma prisão preventiva.
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Contudo, a captura do parlamentar, diferente de outros colegas investigados por práticas criminosas semelhantes, decorreu de outros aspectos que foram detalhados por Rafael no podcast. “Foi principalmente em razão de um fundamento adotado pela juíza, a pedido do MP, que teria ocorrido pressão e coação de testemunhas. A juíza, sob alegação de que poderia estar ocorrendo risco de conveniência da instrução processual, determinou a prisão preventiva”, explicou Staub.
“O foco na época estava sobre os políticos. Em 2018 houve a prisão do Lula, que ficou detido até o fim de 2019. E já haviam sido presos políticos em Porto Alegre, então existia uma atmosfera da Operação Lava Jato em que era mais fácil mostrar uma fiscalização em relação aos políticos do que qualquer outra ação. E a Operação Feudalismo tinha uma robustez de provas de encher um HD”, admitiu o criminalista.
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A investigação do Ministério Público, encabeçada pelo promotor Érico Barin, provou que Paulo Lersch, então no segundo mandato, aplicava a prática conhecida pelo nome de “rachadinha”, ao exigir parcelas de salários de duas servidoras indicadas por ele na Câmara – fato confessado pelo acusado. Ao todo, ele teria se apropriado de cerca de R$ 60 mil em um período de um ano.
Em 28 de janeiro de 2020, a juíza Luciane Inês Morsch Glesse decidiu condenar o ex-vereador pelos crimes de concussão (obter vantagem com base na função que ocupa) e coação (ameaçar testemunhas). Para o advogado Rafael Staub, os méritos da defesa no que se refere à sentença incluem absolver a mãe de Lersch, que também havia sido denunciada pelo MP, e com isso absolver todos os denunciados do crime de associação criminosa (três ou mais pessoas).
Além disso, em relação ao ex-vereador, foi conseguir convencer a Justiça de aplicar uma redução significativa da pena de concussão com a tese do chamado crime continuado (uma pena só para todos os 18 atos de concussão inclusos na denúncia), de maneira isolada, em vez do concurso material (quando acumula-se as penas de cada delito semelhante) pedido pela Promotoria.
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A pena estabelecida ao final do processo foi de nove anos e sete meses de prisão em regime fechado. Lersch cumpriu um período de sua detenção no Presídio Regional de Santa Cruz do Sul, onde chegou a trabalhar na cozinha. A mesma magistrada que o condenou autorizou sua soltura em 25 de agosto de 2020, quando ele passou a ser monitorado por tornozeleira eletrônica. Atualmente, está em liberdade.
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