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VÍDEO: os 25 anos da maior rebelião registrada no presídio de Santa Cruz

Um presidiário ferido e amarrado nas grades; um agente isolado em um ponto entre alas cheias de presos; três detentos encharcados de álcool junto a colchões sob ameaça de serem queimados; uma retroescavadeira pronta para derrubar a parede; e a tropa de elite da polícia a postos para invadir. Parece cena de filme de ação, mas esse ambiente de tensão máxima aconteceu na realidade, há 25 anos, em Santa Cruz do Sul.

Considerada a maior rebelião na história do presídio, o episódio foi registrado em 1999 e contou com a participação de membros do alto escalão do Poder Judiciário local, Ministério Público, forças de segurança e representantes dos Direitos Humanos, que negociaram durante cerca de nove horas para evitar que o pior acontecesse. A Gazeta do Sul detalha a seguir, na décima terceira reportagem da série Casos do Arquivo, os bastidores da ocorrência histórica que ficou marcada na crônica policial local.

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Um agente isolado entre alas

Na época da rebelião, o Presídio Regional de Santa Cruz do Sul tinha capacidade para 180 presos, mas contabilizava 220. A revolta começou às 17h30 de 13 de setembro de 1999, quando 54 desses apenados, que estavam nas alas C e D, retornaram do refeitório, depois do jantar. Vinte e um, no entanto, decidiram não entrar nas celas. Ficaram em um corredor na parte da frente do presídio.

Negociação entre presos e forças de segurança aconteceu pela grade da casa prisional. Crédito: Inor Assmann/Banco de Imagens/GS

Foi quando eles iniciaram um quebra-quebra geral. Todas as janelas foram destruídas. Eles ainda feriram três apenados, que foram tomados como reféns, colocados sob colchões e ameaçados de serem queimados. A partir daí, iniciaria uma longa negociação. Um dos feridos, o detento Sadi da Silva, foi amarrado na grade para proteger os amotinados, que temiam um tiroteio.

Nesse momento, as forças de segurança já estavam presentes no entorno do presídio. Além da rebelião, o temor da polícia pairava sobre a vida do agente penitenciário Marco Antônio de Deus Vieira. Ele foi pego de surpresa no início da revolta e ficou isolado em um posto de controle, que era uma espécie de gaiola, localizado no extremo do corredor que separava o refeitório das galerias.

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Com isso, ele estava cercado dos dois lados e, para ser resgatado, precisaria passar pela área onde estavam os amotinados, que o ameaçavam com armas brancas. Pela janela, o agente penitenciário recebeu de colegas uma espingarda calibre 12 e um colete à prova de balas. Com a arma ele defendia o cadeado que garantia sua segurança e sobrevivência, por ora.

Presos escreveram carta com exigências

Às 18h45, chegou ao presídio uma comissão formada por líderes locais, entre eles o juiz Gerson Luiz Petry; o promotor Eduardo Ritt; o vereador João Pedro Schmidt, que era presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos; o assessor Edison Rabuske; o vice-presidente do Movimento de Direitos Humanos, padre Marcelo Guimarães; e o representante da Anistia Internacional, Neri da Costa.

Para tentar retirar o agente penitenciário que estava no posto de controle, o Corpo de Bombeiros chegou a levar uma restroescavadeira até o presídio. A máquina iria puxar as grades da janela e abrir um buraco para a passagem de Vieira. No entanto, a operação foi suspensa para que não atrapalhasse as negociações, principalmente após as 19h15, quando os presos colocaram fogo em colchões e quebraram mais vidros.

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Às 19h30, houve um fato inusitado em meio ao caos. Alguns presos, que estavam no regime semiaberto, retornavam para passar a noite na cadeia, mas terminaram liberados em razão da rebelião. Contudo, um desses, que estava embriagado, jogou gasolina no corpo e ameaçou atear fogo. Ele foi dominado antes de conseguir realizar o atentado. Depois de conversar com a comissão às 20 horas, os apenados que comandavam a rebelião escreveram uma carta de exigências.

A primeira reivindicação era o retorno do preso Válter Cândido de Moura, condenado a 13 anos por homicídio e que estava em um castigo na “solitária”, após desrespeitar um agente e ameaçar sua família. Eles pediam ainda a alteração nas regras de visita, principalmente as íntimas, e a transferência de alguns apenados para presídios de cidades onde ficassem mais próximos de seus parentes.

“Era um filme de terror”, diz promotor Ritt

Convidado do podcast Papo de Polícia, produzido pela Gazeta Grupo de Comunicações e lançado na última terça-feira no YouTube do Portal Gaz, o promotor Eduardo Ritt, que atuou no caso, contou bastidores da ocorrência histórica. “Eu era professor de Direito na Ulbra de Cachoeira do Sul e saía pelas 18 horas daqui de Santa Cruz para dar aula lá às 19 horas. Só que naquele dia foi diferente. Houve a rebelião, que foi muito feia”, disse ele.

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“Havia o agente penitenciário preso entre as duas alas, e os amotinados com estoques tentavam acertar ele, que estava nessa pressão. O juiz Gerson veio, assim como a comissão dos Direitos Humanos. Negociamos na grade, com os presos do outro lado mascarados, com estiletes. Era um filme de terror efetivamente”, complementou Ritt.

Para temor dos amotinados, às 22 horas chegou em Santa Cruz do Sul o Batalhão de Operações Especiais (Bope), da Brigada Militar de Porto Alegre. Foi quando os detentos pediram para falar com a reportagem da Gazeta do Sul que fazia a cobertura do caso. Eles queriam deixar registradas as exigências, afirmando ainda que se a administração do presídio não fosse trocada, eles dariam início a uma greve de fome.
Por volta das 22h40, a primeira exigência foi cumprida. O preso Válter Cândido de Moura, que estava no castigo, foi trocado por dois detentos feridos na revolta, Antônio Miguel Stobel e Antônio Valdemar, que estavam muito machucados, foram levados em uma ambulância para o Hospital Santa Cruz (HSC).

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Um refém por dois litros de refrigerante

Advogado, com atuação nesse caso, Edison Rabuske revelou um episódio inusitado durante a negociação. “O que me marcou é que tinha esses presos debaixo do colchão, embebidos em álcool, sendo ameaçados de colocarem fogo. A certa altura, lá perto da meia-noite, conseguimos retirar um dos reféns em troca de dois litros de refrigerante”, comentou.

Embora houvesse alguns avanços na negociação, a rebelião não era finalizada e já chegava perto das nove horas de duração. “A ideia do Bope, quando chegou, era invadir a cadeia. Nisso, conversamos com os amotinados dizendo que tudo que tínhamos para fazer por eles naquele momento a gente já tinha feito. E que se não houvesse o acordo, iria acontecer a ocupação pelo Bope. E esse foi o fator que acabou determinando o acordo, redigido pelo promotor Ritt”, complementou Rabuske.

Pelas 2 horas da madrugada de 14 de setembro de 1999 foi encerrada a rebelião, sem mortos, e com os feridos e o agente penitenciário liberados. Durante todo o dia seguinte, o juiz Gerson Luiz Petry – que faleceu vítima de Covid-19 em 28 de fevereiro de 2021 – foi ao presídio ouvir as reclamações dos 21 presos que lideraram o motim. Ao longo dos meses seguintes, foram feitas adequações possíveis, conforme a legislação, dentro da casa prisional. Foi a última grande rebelião no presídio santa-cruzense.

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Paula Appolinario

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Paula Appolinario

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