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Venda de tabaco sofre impacto dos atravessadores

O comércio da safra 2021/2022 de tabaco tem apresentado uma peculiaridade que reforça um movimento das negociações na cadeia produtiva. A possibilidade de falta do produto ampliou a ação dos atravessadores, que compram diretamente no galpão. É um dinheiro mais rápido para quem produz, porque o pagamento é imediato, mas uma incerteza sobre o futuro do setor. O aumento do volume acertado no paralelo fez com que se elevasse a concorrência e o valor pago pelo produto.

Diante da necessidade de garantir bons negócios, os atravessadores têm visitado com mais frequência as propriedades, insistido na compra e ainda oferecido rendimento médio equivalente a produto com qualidade elevada. “Nós visitamos as propriedades e conversamos com os produtores. Quando consideram favorável, vendem para nós; quando acham ruim, mandam para a empresa a qual são integrados”, conta um atravessador que atua na Região Sul do Brasil e que pediu para ter o nome preservado.

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Ele garante que há fumicultores que plantam além do que é declarado à empresa integradora, o que lhe permite uma margem maior de negociação no paralelo e rende valores acima do que está estabelecido na tabela oficial. A média da arroba, aprovada em reunião entre os representantes do setor, é em torno dos R$ 250,00. De acordo com o negociante, com esse preço as fumageiras da área de atuação têm levado pouco tabaco. Reforça que a classificação é mais simplificada. “Nesse ano, está tudo negociado como amarelo e fumo ‘top’”, resume. Assim, o preço pago tem sido acima dos R$ 18,00 por quilo, que soma R$ 270,00 na arroba.

Em alguns casos, conforme um produtor que também tem o nome preservado, a diferença pode ser ainda maior, ultrapassando os R$ 300,00 na arroba – 20% de ágio sobre a tabela. “Mas com esse preço que está sendo praticado, como dizer não?”, questiona. Ele enfatiza, porém, que o produtor não é o responsável por essa situação e faz uma analogia a quem está no mercado de trabalho. “Se você tem um emprego e ganha ‘x’, e o seu amigo do lado ganha 50% a mais, você não iria gostar de ganhar igual a ele?”. O fumicultor entende que as empresas são responsáveis por essa situação, em especial, quando não oportunizam maior reajuste na tabela oficial, fazendo com que fique em índices mínimos durante as rodadas de discussão. E partem para o leilão, pagando acima do que ficou acertado com as entidades para levar maior quantidade e o produto de melhor qualidade.

Todos correm risco nas negociações

Olhar o mercado do tabaco pela frieza dos números atuais é simplificar o processo. Nesta safra especificamente, em que deve faltar produto, a tendência é de elevação dos valores, sobretudo quando ganha força o mercado paralelo. A princípio, ganham os produtores, que vendem com maior rentabilidade; ganha o atravessador, porque consegue boa cotação na empresa – mesmo que, para isso, seja preciso segurar o tabaco no galpão à espera de uma ampliação do valor da arroba; e ganha a empresa, que consegue manter os números oficiais abaixo do praticado, fazendo com que em outros anos a elevação não seja tão expressiva.

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Mas ao mesmo tempo em que todos estão ganhando, todos podem passar a perder. O atravessador entrevistado conta que, em 2020, perdeu dinheiro. “A responsabilidade, depois que comprei, é minha. Naquele ano comprei e, depois, veio a pandemia e arruinou os preços”, recorda. E não falta crítica à malandragem de alguns produtores. “Às vezes, aparece algum fardo ‘premiado’, recheado ou enxertado com farelo e areia ou pedra”, comenta.

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Enquanto o atravessador vê o rendimento associado ao desempenho do mercado, o produtor, que negocia com essas pessoas, tem outro motivo de preocupação. “O produtor assina contrato com a fumageira. Se a empresa quiser cobrar uma multa, pode, mas como está faltando tabaco, muitas não têm acionado esse mecanismo”, conta. A falta de matéria-prima faz com que a fumageira evite a judicialização e entre, direta ou indiretamente, no leilão. A situação leva ao pagamento de um produto de qualidade maior por aquele exemplar que não teria essa classificação em outros momentos.

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Os bastidores

A atravessador surge, em especial, para sanar um problema de crédito dos produtores. Alguns tinham pendências com as fumageiras, mas precisavam de recursos para a manutenção da propriedade e garantir a próxima safra. Assim, para evitar eventuais descontos no momento da venda para a indústria, o negociador virou opção. É tabaco no caminhão e dinheiro na mão.

Eles vão até as propriedades e avaliam a qualidade – afinal, são pessoas que já plantaram ou que têm grande conhecimento sobre a classificação ideal. Em condições de escassez de matéria-prima, o preço é elevado. Somente na área do atravessador que falou com a Gazeta do Sul são 50 pessoas disputando o resultado da safra, intensificando o leilão. E a publicidade boca a boca ganha força com recursos como os aplicativos de conversação. “Um agricultor vende bem para o atravessador, comenta com o vizinho e já passa o Whats”, relata.

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Os atravessadores enfrentam a concorrência com as empresas que, segundo o produtor entrevistado, também estariam pagando acima da tabela. Não existe, sobre esse sistema de compra e venda, nenhum tipo de fiscalização em relação ao valor. O fumicultor emite a nota fiscal, que é o que lhe garante como trabalhador rural, mas essa informação somente é repassada aos órgãos públicos – que não têm gerência sobre o assunto – anualmente, no período de declaração de renda.

O Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco) foi contatado pela Gazeta do Sul para falar sobre o assunto, mas diz que não trata sobre a comercialização do tabaco. Também foi contatada a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), que respondeu entender se tratar de um assunto mais direcionado às empresas.

Desconfiança

As negociações têm sido tão intensas e com valores tão expressivos que fazem com que o produtor desconfie da estrutura orçamentária do atravessador. O fumicultor entrevistado afirma que os compradores no paralelo não teriam estrutura para garantir tamanho volume e com pagamento à vista, e desconfia que haveria grandes empresas os financiando.

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O processo tem sido profissionalizado. Em alguns casos, os atravessadores têm as próprias empresas para negociação. Ainda assim, acredita o produtor, não teriam condições financeiras para garantir volumes maiores e quitação. “Os valores são muito elevados. Se for pensar em cem arrobas a R$ 300,00, dá R$ 30 mil”.

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Heloísa Corrêa

Heloisa Corrêa nasceu em 9 de junho de 1993, em Candelária, no Rio Grande do Sul. Tem formação técnica em magistério e graduação em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. Trabalha em redações jornalísticas desde 2013, passando por cargos como estagiária, repórter e coordenadora de redação. Entre 2018 e 2019, teve experiência com Marketing de Conteúdo. Desde 2021, trabalha na Gazeta Grupo de Comunicações, com foco no Portal Gaz. Nessa unidade, desde fevereiro de 2023, atua como editora-executiva.

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Heloísa Corrêa

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