O diretor da JBS Ricardo Saud contou em delação premiada que a empresa distribuiu propinas por atacado no meio político brasileiro, detalhando os nomes de centenas beneficiários. Em depoimento prestado à Procuradoria-Geral da República (PGR), ele revelou que 1.829 candidatos de 28 partidos das mais variadas colorações receberam dinheiro do grupo controlado pelos irmãos Joesley e Wesley Batista.
As doações ilícitas foram de quase R$ 600 milhões. O grosso dos recursos, segundo o delator, foi destinado aos candidatos em troca de contrapartidas no setor público. “Tirando esses R$ 10, R$ 15 milhões aqui, o resto tudo é propina. Tudo tem ato de ofício, tudo tem promessa, tudo tem alguma coisa”, relatou.
Saud disse que o “estudo” foi feito por sua própria iniciativa. Em vídeo do depoimento, divulgado nessa sexta pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ele entrega aos investigadores uma pilha de papéis com a relação de subornados, agora potenciais alvos de novos inquéritos de corrupção. Os números têm a escala da chamada delação do fim do mundo, recém-acordada por 78 executivos da Odebrecht.
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“Eleitos foram 179 deputados estaduais, de 23 estados; 167 deputados federais, de 19 partidos. Demos propina para 28 senadores da República, sendo que alguns disputaram e perderam eleição para governador e alguns disputaram reeleição ou eleição para o Senado. E demos propina para 16 governadores eleitos, sendo quatro do PMDB, quatro do PSDB, três do PT, dois do PSB, um do PP, um do PSD”, contou.
O diretor disse achar que, no futuro, o seu estudo sobre as propinas vai servir de prova. “Aqui estão todas as pessoas que receberam propina diretamente ou indiretamente da gente”, entregou, concluindo com uma explicação sobre o esquema: “Se ele (o político) recebeu esse dinheiro, sabe, de um jeito ou de outro, (que) foi de propina. Essas pessoas estão cientes disso.”
Campanha de Sartori teve R$ 1,5 milhão; governador nega
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O depoimento de Ricardo Saud mostra que pelo menos cinco políticos gaúchos teriam recebido dinheiro da JBS. Entre eles está o governador José Ivo Sartori (PMDB), que teria recebido R$ 1,5 milhão em propina para sua campanha. Segundo o executivo, a “doação oficial dissimulada” ocorreu a pedido do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG).
Em um trecho de 26 segundos, Saud diz: “Uma coisa aqui você vai achar engraçada: o Aécio pediu pra dar R$ 1,5 milhão para o PMDB do Rio Grande do Sul.” Logo ele explica que o dinheiro foi para Sartori, a quem chamou de “dissidente” porque não apoiou a chapa Dilma-Temer, já que o PT também tinha candidato a governador no Estado.
Na prestação de contas entregue pela campanha de Sartori à Justiça Eleitoral, constam seis doações da JBS S/A, sendo uma de R$ 1,5 milhão, uma de R$ 1 milhão e outras quatro que somam R$ 184.250,00 – no total, R$ 2.684.250,00. O governo alega que não recebeu nenhum valor da empresa além desses que estão declarados.
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O PTB gaúcho também teria recebido R$ 1,5 milhão a pedido de Aécio. O montante, segundo Saud, era parte dos R$ 20 milhões pagos ao PTB nacional para apoiar o tucano. Da mesma forma, o valor teria chegado como propina dissimulada por meio de doação com depósito no Banrisul.
Outro lado
O coordenador financeiro da campanha de Sartori, João Carlos Bona Garcia, divulgou nota acerca do depoimento. Ele admitiu o recebimento do dinheiro, que foi declarado à Justiça Eleitoral. “As doações recebidas da empresa JBS pela campanha de José Ivo Satori foram realizadas dentro da legislação vigente, sendo efetivadas através de transferência eletrônica, saindo da conta da empresa diretamente para a conta da candidatura, bem como emitidos os respectivos recibos eleitorais”, diz um trecho da nota oficial. O PTB disse desconhecer as denúncias.
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Deputados
Os deputados Onyx Lorenzoni (DEM), Jerônimo Goergen (PP) e Alceu Moreira (PMDB), além do ex-tesoureiro do PT e ex-deputado Paulo Ferreira, também estão entre os beneficiados pela JBS. A conta chamada por Ricardo Saud de “reservatório da boa vontade” serviu para conquistar políticos “para que eles ajudassem” quando fosse necessário e para que não “atrapalhassem” a empresa.
A Alceu Moreira, Paulo Ferreira e Onyx, segundo o relato de Saud, teriam sido destinados R$ 200 mil e para Goergen, R$ 100 mil. As entregas teriam sido realizadas em 2014 pelo presidente da Associação Brasileira de Exportadores de Carne Bovina, Antônio Camardelli.
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Onyx Lorenzoni admitiu que recebeu R$ 100 mil. Ele disse que aceitou o dinheiro para fechar suas contas de campanha. Relator do projeto de lei que trata de medidas contra a corrupção, dentre eles o caixa 2, considerou sua atitude um erro.
Aliados articulam uma saída negociada
Aliados de primeira hora do presidente Michel Temer articulam uma saída negociada com o Planalto que seja uma continuidade do que, para eles, vem dando certo no atual governo. Diante da perspectiva de agravamento da crise deflagrada pelas delações da JBS, líderes de siglas como PSDB, PMDB e DEM pretendem bloquear qualquer iniciativa de realizar eleições diretas por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e buscam um nome de consenso para uma eventual disputa indireta no Congresso. Em meio a isso, também começam a ocorrer baixas.
Principal aliado do governo, o PSDB ensaiou uma debandada após a divulgação do áudio da conversa entre o Joesley Batista, da JBS, e Michel Temer, mas recuou após um pedido de tempo para a construção de um consenso que evitasse a implosão da base e comprometesse as reformas.
Enquanto a cúpula do PSDB atua para evitar a implosão das reformas, a base do partido pressiona pelo rompimento com o governo. Diretórios estaduais do partido em todo País começaram a se reunir para ter posição oficial sobre o tema. No Rio Grande do Sul o partido já se posicionou pelo desembarque.
US$ 150 mi na conta de Lula e Dilma
O termo de colaboração do empresário Joesley Batista, do Grupo JBS, descreve o fluxo de duas contas correntes de propina no exterior, cujos beneficiários seriam os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. O empresário informou à Procuradoria-Geral da República que o saldo das duas contas bateu em US$ 150 milhões em 2014. Ele disse que o ex-ministro Guido Mantega (Fazenda/Governos Lula e Dilma) operava as contas.
O delator informou que em 2009 destinou uma conta a Lula e no ano seguinte, outra para Dilma. Joesley revelou que em dezembro daquele ano, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) adquiriu debêntures da JBS, convertidas em ações, no valor de US$ 2 bilhões, para apoio do plano de expansão.
COMO FOI
Doações
Conversas
Em outra ocasião, em novembro de 2014, Joesley disse que depois de receber solicitações insistentes para o pagamento de R$ 30 milhões para Fernando Pimentel, governador eleito de Minas Gerais, feitas por Edinho Silva (tesoureiro da campanha de Dilma em 2014), e de receber de Guido Mantega a informação de que “isso é com ela”, solicitou audiência com Dilma. A presidente cassada o teria recebido no Palácio do Planalto para conversar sobre o dinheiro. Joesley afirma que, no mesmo dia, encontrou-se com Pimentel no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, e disse ao petista “que havia conversado com Dilma e que ela havia indicado que os 30 milhões deveriam ser pagos”.
OS PRINCIPAIS DESTINOS, SEGUNDO OS DELATORES
Michel Temer (PMDB)
Presidente da República,
teria recebido R$ 30 milhões em cinco repasses.
Aécio Neves (PSDB)
Senador afastado, teria recebido pelo menos R$ 60 milhões em propina para a campanha presidencial de 2014 e R$ 2 milhões para supostamente pagar a sua defesa na Operação Lava Jato.
Eduardo Cunha (PMDB)
Ex-deputado e preso desde outubro do ano passado, teria recebido R$ 30 milhões para sua eleição para a presidência da Câmara e R$ 20 milhões para atuar pela aprovação de projeto que desonerou a cadeia produtiva do frango.
Lula (PT)
Ex-presidente, teria recebido US$ 50 milhões por meio de depósitos em contas no exterior.
Dilma Rousseff (PT)
Ex-presidente, teria recebido US$ 30 milhões por meio de depósitos em contas no exterior.
José Serra (PSDB)
Senador, teria recebido R$ 6 milhões para sua campanha de 2010.
Marta Suplicy (PMDB)
Senadora, teria recebido uma mesada de R$ 200 mil por 15 meses entre 2015 e 2016.
Alexandre Padilha (PT)
Ex-ministro, teria recebido R$ 3 milhões em doações ilícitas na campanha para governador de São Paulo em 2014.
José Ivo Sartori (PMDB)
Governador do Rio Grande do Sul, teria recebido R$ 1,5 milhão para a campanha de 2014, a pedido do tucano Aécio Neves.
Beto Albuquerque (PSB)
Ex-deputado federal, estaria entre os que receberam dinheiro da empresa, mas os detalhes não foram informados pelos delatores.
Paulo Ferreira (PT)
Ex-deputado federal, teria recebido R$ 200 mil por meio de uma gráfica em Porto Alegre.
Alceu Moreira (PMDB)
Deputado federal, teria recebido R$ 200 mil em espécie na campanha de 2014.
Jerônimo Goergen (PP)
Deputado federal, teria recebido R$ 100 mil na campanha de 2014.
Onyx Lorenzoni (DEM)
Deputado federal, teria recebido R$ 200 mil em espécie na campanha de 2014. Ele admitiu o repasse, mas afirmou que o valor foi de R$ 100 mil.
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