“Às vezes os olhos veem, mas não enxergam.” Com essa frase a professora doutora Ana Paula Motta Costa permeou sua explanação durante o seminário Direitos humanos na produção de tabaco – Acomodações e contratação de mão de obra na agricultura familiar. O evento, realizado na manhã dessa terça-feira, 17, no Pavilhão da Agricultura Familiar, no Parque da Expoagro, em Rio Pardo, trouxe à tona questões importantes para a manutenção legal das relações de trabalho no campo.
Socióloga e vice-diretora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Ana Paula abordou o trabalho análogo ao escravo contemporâneo no Brasil; o enquadramento jurídico; as consequências para empresas e pessoas físicas; critérios para o reconhecimento por parte do Poder Judiciário; e ainda direitos humanos e trabalho digno. “Nós temos que buscar a mudança, uma consciência que nos permita enxergar, para além de apenas ver. Treinar e abrir os olhos. Rever a forma de pensar”, afirmou.
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A especialista também embasou sua fala na contextualização histórica da escravidão no Brasil, ao mesmo tempo em que abordou o conceito contemporâneo. Conforme a apresentação, o trabalho análogo ao escravo, hoje, configura-se como “relações abusivas de trabalho, onde a dominação sobre o trabalhador é extrema. Nas quais ele é submetido a situações desumanas, sem liberdade, ou igualdade em dignidade”.
Ainda de acordo com Ana Paula, diante dos números de trabalhadores resgatados nos últimos anos, há a necessidade de buscar respostas em estudos mais aprofundados. “Realmente houve aumento ou é apenas reflexo de estarmos falando mais sobre o tema?”, questionou. No decorrer da manhã, ela ainda abordou o Código Penal, os fatos que podem caracterizar o trabalho análogo ao escravo e as normas regulamentadoras.
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O seminário reuniu cerca de 350 participantes, entre produtores, lideranças e autoridades regionais, representantes das empresas associadas e de entidades representativas dos produtores, bem como de órgãos de fiscalização do Ministério do Trabalho.
A realização foi do SindiTabaco, com apoio da Afubra e da Fetag-RS. Tomar medidas imediatas e eficazes para erradicar o trabalho forçado está entre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU).
O encontro encerrou-se com a apresentação de vídeos que serão divulgados aos produtores, abordando as cartilhas Contratação de mão de obra na agricultura familiar, elaborada pela Fetag, e Trabalho análogo ao de escravo, elaborada pela Secretaria de Inspeção do Trabalho. Os 60 mil exemplares impressos serão disponibilizados aos fumicultores.
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O que disseram
“Se todos os setores, se todas as cadeias produtivas trabalhassem esses temas relacionados ao social, ambiental e à governança tanto quanto nós trabalhamos, teríamos mais soluções do que problemas. Somos pioneiros em inúmeras ações. Fomos os primeiros a levantar a bandeira para o combate ao trabalho infantil. Temos que estar preocupados com o futuro que vamos deixar, em como estarão as pessoas amanhã. Devemos estar atentos à saúde e à segurança do produtor. É importante que os trabalhadores tenham as mesmas condições que gostaríamos de ter.”
Iro Schünke
Presidente do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (Sinditabaco)
![](https://www.gaz.com.br/uploads/2023/10/seminario-direitos-humanos-e-producao-de-tabaco-iro-schunke.png)
PublicidadeMarcílio Laurindo Drescher
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Presidente da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra)
“Dignidade para o ser humano também é ter trabalho, mas vai além. É preciso saúde, educação, lazer, qualidade de vida. Temos que abrir o olho para as diferenças de trabalho. Não temos, por exemplo, uma legislação que ampare a contratação por diária. Ainda são muitas as questões que dificultam a contratação de mão de obra. Precisamos melhorar os números e fazer a coisa certa.”
Carlos Joel da Silva
Presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag-RS)
“O trabalho eventual, o diarista rural não é funcionário de carreira. Precisamos adequar a nossa legislação. Nossa sociedade está em constante movimento e adaptação. Devemos lembrar que uma relação de trabalho é, antes de tudo, uma relação humana. Existe uma cultura no campo que não será modificada do dia para a noite. Não se muda um uso e um costume de uma hora para outra. Por isso é imprescindível orientar e esclarecer, trazer a informação correta.”
Álvaro Moreira
Assessor jurídico da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul)
“É preciso pensar em mudanças sistêmicas, de longo prazo, independentemente das autoridades e do governo. Eventos como este servem para criar perguntas e e respostas cada vez mais pertinentes. Muitas das violações extremas estão no nível de consciência. Muito do que se encontra, não é preciso ser expert em norma para detectar a irregularidade. Esse é um amplo momento de diálogo social. É preciso discutir não somente a condição dos diaristas, mas de todos os envolvidos sob o guarda-chuva dos direitos humanos. Os processos de auditoria devem servir como agenda de transformação da realidade. E não podemos esquecer que essas violações podem ocorrer em qualquer cadeia produtiva.”
Rudy Allan da SilvaPublicidade
Chefe da Seção de Planejamento e Avaliação da Superintendência Regional no Rio Grande do Sul do Ministério do Trabalho e Emprego
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