Quantos inícios de ano teremos pela frente? Os filósofos estoicos, que voltaram a ser populares nos últimos tempos, ressaltaram a curta duração da vida para valorizá-la. Um dos mais famosos é Marco Aurélio, o imperador romano autor das Meditações.
Sobre isso, escreveu:
“Recorda que meramente vives o presente, que é um momento brevíssimo. Todo o resto é passado ou incerto. Pouco é o que cada um vive. Diminuto é o pedaço de terra no qual se vive. Breve é a mais longa fama póstuma.”
O tempo é curto para desperdiçar e o que existe vai terminar, mas não necessariamente desaparecer. Vai se tornar outra coisa. “Alguém teme a transformação? Pois o que pode existir sem ela?”, questiona Marco. Essa é a lei. O corpo só se desenvolve com a transformação dos alimentos que ingerimos, o fogo da lareira que aquece vem da metamorfose da lenha.
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“Não vês então que tu mesmo se transformas e isso é igualmente necessário à natureza do Todo?” Dito de outra forma, tudo é movimento, o repouso é uma ilusão. Nada é absolutamente estático, nem mesmo na morte. Só minha visão limitada me impede de ver, além da aparente imobilidade da mesa na sala, a efervescência dos átomos que a compõem. Ou a atividade frenética dos micro-organismos, da vida invisível que nos cerca em todo lugar.
O mundo também caminha para se transformar em algo diferente, não se sabe o quê. Nossas ações ou omissões vão decidir. Uma casa sem reparos nem manutenção está condenada à ruína pela ação do tempo, e não é diferente com a vida coletiva. Engana-se quem pensa que é possível manter um determinado estado de coisas para sempre, uma ordem social/cultural imutável.
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E não é por acaso que qualquer ano se inicie, invariavelmente, com ares de mudança, promessas e projeções de uma vida mais satisfatória. Depois a euforia passa, semanas e meses se sucedem, caímos na repetição de velhos hábitos e nos rendemos à rotina, mas o desejo de mudar continua lá. Todos querem mais, mesmo quem não têm motivo para se queixar.
Volto a Marco Aurélio e repito palavras escritas há quase dois milênios: alguém teme a transformação? O que pode existir sem ela?
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