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Uma tênue chama

“Quando os que mandam perdem a vergonha, os que obedecem perdem o respeito.” (Cardeal de Retz). A frase ilustra incensado artigo do advogado e ex-deputado federal e estadual Jarbas Lima, veiculado no Correio do Povo, sob o título “Sem-Vergonha”, veiculado na última segunda-feira (31/10). O texto reflete, com brilhantismo, a realidade que nos cerca.

A onipresença da desfaçatez já nem chama nossa atenção. O festival de barbaridades cometidas nas diversas áreas de atuação humana parece ser o “normal”. Exceção constitui cumprir leis, agir com dignidade social, proceder com base na solidariedade e pensar de maneira coletiva.

Todos os desvios de caráter têm desculpas que o tempo se encarregou de tornar palatáveis. Se os impostos são injustos, sonega-se sob o pretexto de gerar emprego e tributos. A política está eivada de corrupção? Então vamos aderir e nos locupletar. Até a Polícia Federal descobrir será possível usufruir de viagens paradisíacas, compras nababescas e do consumismo sem limites.

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A falta de constrangimento para fazer o mal, atropelar a legalidade e ignorar as convenções de convivência social chocam. Aos 56 anos, repiso a meus filhos – adultos – sobre a necessidade de coerência entre o que se cobra de nossos dirigentes e o comportamento que devemos adotar no dia a dia.

As tentações do mundo moderno são imensas, quase irresistíveis. Ilegalidades quase sempre vêm disfarçadas de facilidade. Como diz o ditado, “não existe almoço grátis” ou “quando a esmola é grande, até o santo desconfia”. Isso explica a atualidade eterna do “golpe do bilhete” e de falcatruas que têm, como isca fatal, a possibilidade do lucro fácil.

No meio desta polvadeira, porém, ainda há vozes de protesto contra o abandono da decência mínima. As recém-findas eleições municipais exigem análises criteriosas, interpretadas sob a ótica do protesto do eleitor. Em Porto Alegre, por exemplo, no segundo turno, 433 mil pessoas deixaram de escolher um candidato, entre votos brancos, nulos e as abstenções.

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Se a sedução do ganho fácil é quase irresistível, a “verdade da vergonha” é forte, lastreada em valores herdados de uma educação de decência. Enriquecer a qualquer custo, faturar “custe o que custar” ou levar vantagem em tudo esbarra em exceções firmadas na consciência de fazer a coisa certa. Essa chama, tênue e titubeante, é a réstia de esperança de uma reversão do quadro atual.

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