As gurias lá de casa entraram em férias nessa sexta-feira e, logo pela manhã, começaram os pedidos típicos desse período. A caçula, Ágatha, reivindica uma boia, em forma de jacaré, com a qual pretende enfrentar o oceano.
– Mas não é perigoso? – retruquei.
– Ahhh, pai. Não é um jacaré de verdade. É inflável. Já viu um jacaré inflável devorar alguém?
…
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É incrível observar as crianças neste período de Natal. É invejável a forma como mergulham no espírito natalino, com uma profundidade que os adultos – eu, pelo menos – não conseguem atingir. Dias atrás, as gurias visitaram a Praça José Bonifácio, em Vera Cruz, e se encantaram intensamente com a trupe de duendes, soldadinhos e palhaços que circulam por lá, em meio à decoração natalina. Estão rindo até agora de um certo palhaço que as posicionou para uma selfie e, ao invés de um celular, tirou uma pedra do bolso e – clic – “fez a foto”.
Também mergulharam na beleza do desfile natalino que ocorreu por lá, a todo momento abanando para os figurantes, imersas naquele momento mágico enquanto os adultos presentes – ou terei sido só eu? – dividiam a atenção entre o desfile e os pensamentos que tipicamente assombram nossas mentes crescidas nesta época: os compromissos de fim de ano, os prazos que se aproximam, as últimas metas a serem cumpridas, o IPVA, o IPTU…
Nessas horas, as crianças nos dão uma lição sobre a importância de viver o presente com intensidade. Sem ter estudado Epicuro, sem conhecer o budismo ou praticar mindfulness, elas nos transmitem lições que, de certa forma, a filosofia e outras linhas de reflexão tentam nos ensinar há milênios: um dos segredos da felicidade está na capacidade de dar atenção aquilo que está ao nosso alcance, ao que está a nossa frente naquele instante particular. Que devemos deixar para um momento oportuno aquilo que só poderemos resolver… em um momento oportuno.
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As crianças, em sua inocência, sabem exorcizar melhor que nós, adultos, os fantasmas que insistem em povoar nossos pensamentos, que nos deixam perturbados e distraídos. E que, assim, nos impedem de desfrutar a pleno o sabor de uma refeição, de apreciar um jardim ou o convívio em família. Os prazos a cumprir e os problemas a resolver, claro, sempre existirão. Seria tolice simplesmente ignorá-los e negar os méritos que têm, inclusive, em termos de nos impulsionar ao progresso. Mas é para eles que existe uma coisa chamada agenda.
Os pequenos nos ensinam que para tudo há um momento. E, mais uma vez, me dobro à pureza da resposta das crianças:
– Verdade, Ágatha. Um jacaré inflável não faz mal a ninguém.
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