Na condição de presidente da Comissão Oficial do Bicentenário da Imigração Alemã, instituída pelo governo do Estado, o professor e advogado Rafael Koerig Gessinger tem a missão de fazer a gestão de toda a programação associada às comemorações que marcam os 200 anos desde a chegada dos primeiros colonos germânicos ao Rio Grande do Sul, em 25 de julho de 1824. Ainda que tenha nascido em São Leopoldo, justamente a localidade na qual se fixaram os pioneiros, seu pai é um santa-cruzense: Ruy Armando Gessinger, desembargador aposentado, e que há muitos anos assina a coluna “Conversa Sentada”, de veiculação quinzenal às quintas-feiras, na Gazeta do Sul.
Efetivado à frente da comissão no início de 2023, desde então, em mais de uma ocasião, visitou Santa Cruz e a região. Em entrevista exclusiva à Gazeta, ele avalia os trabalhos realizados até o momento e a importância do legado dos imigrantes alemães.
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Uma longa bagagem de estudos, aperfeiçoamentos e vivências (pessoais e familiares) habilita, e plenamente, o professor e advogado Rafael Koerig Gessinger, 47 anos, a presidir a Comissão Oficial instituída pelo governo do Rio Grande do Sul para marcar o Bicentenário da Imigração Alemã. Subsecretário de Justiça e Integridade Institucional da Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, no início de 2023 viu-se convidado e, com o seu aceite, logo designado para liderar o esforço institucional a fim de celebrar o legado e as contribuições dos germânicos à socioeconomia gaúcha, e também brasileira. A comissão fora instituída pelo Decreto no 56.110, de 2021.
Rafael nasceu em 30 de dezembro de 1976, em São Leopoldo, ambiente ao qual chegaram os primeiros imigrantes alemães, em 1824. Se é um cidadão do Vale do Sinos, também tem fortes vínculos com o Vale do Rio Pardo. Seu pai, o advogado, escritor, desembargador aposentado e pecuarista Ruy Armando Gessinger, é santa-cruzense, enquanto sua mãe, Berenice Koerig, é catarinense.
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Ele lembra de, na companhia dos pais, durante a infância, visitar Santa Cruz. Das vindas, guarda com carinho a lembrança do contato com a vó Ludmila, que chamavam de Ludi e residia em casa de esquina na Rua Thomaz Flores (o avô era Armando). Nessas ocasiões, encontravam outros parentes, como os da família Kraether. Rafael tem duas filhas: Helena, de 19 anos, e Ana Maria, de 11. Atualmente, tem residência em Montenegro; e sua companheira é professora de História em Venâncio Aires.
Já na condição de presidente da Comissão Oficial para as celebrações em torno dos 200 anos da imigração alemã, tem prestigiado eventos na região. Neste sábado, no Museu de Venâncio Aires, participará de atividade alusiva ao Bicentenário, centrada nos imigrantes boêmios.
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Em outra oportunidade, em setembro de 2023, explanou na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) sobre os planos institucionais do governo do Estado, em parceria com entidades e organizações de diferentes localidades, para celebrar os 200 anos.
E refere que, embora tendo nascido em São Leopoldo, ali teve como colegas de aula e amigos de toda a vida dois descendentes diretos dos primeiros colonizadores de Santa Cruz, um deles tataraneto de August Wuttke. Coincidência que ele considera muito significativa, pois Wuttke veio da Alemanha com August Raffler, tataravô de Rafael.
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Rafael é bacharel e mestre em Direito pela Ufrgs. Além disso, é licenciado, mestre e doutor em Filosofia (mestrado e doutorado pela Ufrgs, com estágio de doutoramento no Thomas-Institut da Universidade de Colônia, na Alemanha). Sua área de pesquisa é a filosofia medieval, especialmente Tomás de Aquino.
Como professor, tem experiência em todos os níveis de ensino, superior, médio e fundamental. Foi professor na PUCRS por mais de oito anos, em diversas disciplinas (Filosofia do Direito, Direito Constitucional, História do Direito, Teoria Geral do Direito, Sociologia do Direito). Conduziu Oficina de Mitologia Grega para crianças e jovens, no Colégio São José, em Montenegro. Atualmente, leciona Filosofia e Ensino Religioso na Escola Mãe Admirável, em Porto Alegre.
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Como advogado, tem experiência no poder público, em Brasília e Porto Alegre. Serviu como assessor, diretor ou chefe de gabinete a cinco ministros da Justiça, em períodos diferentes. Foi chefe de gabinete de ministro no Supremo Tribunal Federal. Representou o Ministério da Justiça na negociação da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, em Viena. E foi membro do Grupo de Trabalho interministerial incumbido de elaborar o anteprojeto de lei para a implementação do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.
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Trabalha na Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul, como subsecretário de Justiça e Integridade Institucional. Suas pautas incluem política migratória, defesa do consumidor, integridade e governança, cultura de paz e convívio inter-religioso, e sistemas de proteção à vida.
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Como o senhor avalia os trabalhos realizados até o momento dentro das comemorações do Bicentenário da imigração alemã e o que destacaria de mais relevante?
A Comissão Oficial é enorme, abrange mais de 60 entidades e aproximadamente 200 pessoas. Já temos 181 eventos alusivos ao Bicentenário cadastrados no site www.bicentenarioalemao.rs.gov.br, eventos de diversas naturezas, de conferências acadêmicas a festivais de dança, de exposições de arte a Kerbs, de torneios esportivos a concertos de música erudita.
O decreto do governador Eduardo Leite afirma que o Bicentenário dura o ano inteiro e em todo o Grande do Sul. O diferencial está no fato de a pauta ser realmente importante; ou seja, não é algo artificial que alguém inventou do nada, mas algo vivo e vibrante que as pessoas, entidades e municípios querem celebrar. Cada evento tem valor, e já é um legado. Os concertos da Ospa em homenagem ao Bicentenário são especiais porque levarão às pessoas uma experiência de alto valor estético e simbólico. Serão cinco monumentais apresentações em Porto Alegre e mais 11 no interior. Santa Cruz do Sul receberá um desses magníficos concertos!
Qual, no entendimento do senhor, devem ser os principais propósitos de uma celebração em torno desse tema, da imigração alemã?
O Bicentenário envolve muitos temas e essa é a razão de termos 11 subcomissões temáticas (história, língua, fé, folclore, ciência, desenvolvimento etc.). A imigração é um fenômeno humano universal. O Rio Grande do Sul acolhe as pessoas e aqui elas conseguem se desenvolver, para benefício de todos. Esses vínculos humanos e institucionais merecem cultivo e carinho. Em cada evento, devemos nos lembrar de que formamos uma família humana. Alle Menschen werden Brüder tem sido o lema da Comissão. Todos os seres humanos tornam-se irmãos. A alegria genuína do convívio proveitoso é o que está em jogo.
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O senhor entende que, além de fazer lembrar do passado, é uma oportunidade para remeter ao futuro, em termos de relações sociais e de integração?
Quando o futuro é projetado com referências a valores como o diálogo e o respeito, diminuímos os riscos de uma sociedade fragmentada e demasiadamente violenta. Estamos vivendo o Bicentenário com esse espírito de construir pontes. Pontes entre entidades, empresas, governos, mas sobretudo pessoas. A integração, quando alicerçada sobre o respeito, traz benefícios duradouros.
Esperamos que o Rio Grande do Sul fortaleça suas relações institucionais com estados de língua alemã, como Rheinland-Pfalz, por exemplo. E que outros municípios possam avançar na aproximação institucional que tem sido tão importante para as 14 cidades gaúchas que já possuem irmandades formalizadas com cidades da Alemanha.
Como ocorre a relação pessoal ou familiar do senhor com o legado decorrente da imigração alemã no Sul do Brasil?
De modo natural. Por parte de pai, herdo nomes como Gessinger, Etges, Klafke, Raffler. Por parte de mãe, o sobrenome Koerig, mais comum em Santa Catarina, convive com outras origens, como a portuguesa e a italiana. Fui muito influenciado pelos colégios que frequentei em São Leopoldo, berço da imigração alemã. O Colégio São José foi fundado em 1872 por Irmãs Franciscanas procedentes da Alemanha. O Colégio Sinodal nasceu da comunidade luterana da IECLB.
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E com a cidade de Santa Cruz do Sul e o Vale do Rio Pardo, como era e ainda é a relação do senhor? Por ocasião dos festejos do Bicentenário, o senhor tem vindo seguido à região, não é?
Quando criança, visitávamos com frequência a vó Ludi (Ludmila Gessinger), na casa da Thomaz Flores; nossos primos Kraether (Leo, Juliana e Henrique), que moravam ao lado, e, às vezes íamos a Boa Vista, nas terras do tio Lino (Etges), irmão da vó. Além disso, dois dos meus melhores amigos, Antonio Wuttke e Fabiano Goetze, têm também suas raízes em Santa Cruz. Ultimamente, tenho ido, para minha alegria, com frequência a Santa Cruz, onde desde o início todos se entusiasmaram com o Bicentenário. A cidade está de parabéns! Poder público, entidades, universidade, escolas, imprensa, todo mundo! Tivemos três jogos do Gauchão, todos em Santa Cruz do Sul, em que houve homenagens ao Bicentenário. Foi muito lindo! Avenida e Santa Cruz estão de parabéns também!
Em que nível e grau foi a relação do senhor com a Alemanha? Entende que os laços do Estado com a Alemanha podem sair mais fortalecidos a partir do Bicentenário?
Estive na Alemanha e na Áustria pela primeira vez aos 19 anos, em 1996. Depois, voltei para lá algumas vezes, a maioria delas a trabalho. Durante o doutorado, morei por quatro meses em Münster e por um ano em Köln (Colônia), no estado de Nordrhein-Westfalen. Estamos nos esforçando muito para que as relações com os países de língua alemã sejam cada vez mais robustas. Já existe muita coisa, mas podemos avançar. Uma ousada aproximação, que tem a ver com a possibilidade de intercâmbio em áreas estratégicas, está sendo construída, e todo apoio nesse processo é sempre muito bem-vindo.
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O que o senhor destacaria de mais relevante do legado deixado pelos imigrantes alemães, e que permanece vivo nos dias atuais?
A própria vida é o bem que os imigrantes transmitiram para uma expressiva parte da população gaúcha. Mas não se trata apenas da vida biológica, e sim da vida interior, a vida com fé, com respeito aos outros e entusiasmo pelo trabalho e pela beleza da criação e do convívio. O cultivo da música e de jardins e a busca por conhecimento me parecem bons exemplos desse entusiasmo pela vida.
O que o senhor mais especialmente gostaria de ver concretizado, ou como uma decorrência, a partir desse movimento em torno do Bicentenário da imigração alemã no Rio Grande do Sul e no Brasil?
Eu gostaria de ver confirmada a maravilhosa impressão que estou tendo, ao conviver com as pessoas de todo o Rio Grande, de que a harmonia, a integração e a amizade são, em última instância, bens genuínos que dão sentido ao nosso viver.
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