É uma alegria voltar a Santa Cruz do Sul e a este festival de cinema que já é o mais querido do Rio Grande do Sul. O evento começou com uma mostra adequadamente intitulada “Olhares Daqui”, que destaca filmes realizados na região ou por santa-cruzenses espalhados pelo mundo. Vamos a eles:
Pivô (direção de Ana Gusson): peço adiantadas desculpas ao caro leitor pela resenha desta animação, porque dificilmente ela parecerá isenta. A diretora Ana Gusson é uma querida amiga com a qual tive o privilégio de trabalhar um par de vezes antes de ela se dedicar à arte da animação no Canadá. É de lá que vem esta pequena pérola. Feito por uma equipe 100% feminina, Pivô transcende o fato de ser “somente” importante pela sua representatividade e consegue passar uma mensagem forte. No começo, o traço gentil – e, por que não? fofo – de Ana parece prometer um filme de cores leves. Mas e se um vestido pudesse virar um monstro?
A Carne é Cara (direção de Alceu Silva): feito dentro da Unisc, tem aqueles problemas de acabamento comuns em filmes universitários. Vai desde a captação de som, que deixa a desejar à frase escrita numa folha de papel com uma caneta fraca demais para se ler: detalhes que, como se diz, resolvem-se com a estrada. Há questões no roteiro – não pela falta de ideias, mas pelo excesso delas. Sacadas como a do açougueiro que só come tomate parecem promissoras, mas acabam não levando a um desfecho satisfatório. Os trunfos são o carisma do protagonista Gilmar Almeida e a deliciosa trilha sonora sambista. É um filme leve e popular que quer dialogar com um público amplo, o que por si só é um mérito.
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Olhares (direção de Laura Zimmer Helfer e Luís Alexandre): este documentário-poesia colide imagens com poemas sendo recitados em off. O personagem-motivo do filme é o fotógrafo Lula Helfer, enquadrado em diferentes situações por uma câmera de elegante preto e branco. O filme é quase caseiro; contudo, me intrigou o texto que comparava as diferenças entre a fotografia e a poesia. Afinal, esse choque entre texto e imagem não é o que define a existência própria do cinema? Talvez sem muita intenção, a dupla de diretores fez um filme sobre o audiovisual em si.
Refém Intergalático (direção de Douglas Top Gun Martins): sendo eu um fã de rock pesado, simpatizo imediatamente com filmes com o mesmo tipo de atitude iconoclasta de “dane-se o status quo da arte”. Mas não se levar a sério também costuma maquiar problemas de realização. A narrativa parece ter sido criada à medida que a filmagem ia acontecendo – numa passagem hilária, os personagens tentam insistentemente destruir uma TV que deveria ter se quebrado na primeira pancada, mas que resiste bravamente. A mistura de ação inconsequente, truques práticos bacanas e efeitos digitais duvidosos torna impossível não abrir um sorriso durante a projeção.
Aos Amaros do Mundo (direção de Bruno Gassen): também feito na Unisc, este documentário faz parte de uma tendência contemporânea de filmes confessionais que se usam de imagens caseiras captadas por parentes dos realizadores. Tal estilo costuma ter diferentes graus de sucesso, a depender de como quem assiste se enxerga ou não na tela. Este doc usa as filmagens do pai do diretor. Se na primeira parte parece criticá-lo com dura franqueza, na segunda acaba por acolhê-lo. Os dois últimos planos, os únicos que não são imagens de arquivo, são repletos de beleza simples: a caixa de tênis que guarda velhas fitas e o close do homem que as filmou.
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Tipo Borboleta (direção de Milena Morais e Vitor Vogt): um segredo sobre a arte do cinema: filmes baseados demais em diálogos exigem mais da direção do que do elenco. Afinal, é quem está atrás da câmera que precisa levar os atores, com suas diferentes formações e caminhadas, para um mesmo lugar harmônico. A dupla de diretores e roteiristas deste curta da Unisc parece querer respeitar demais as falas criadas por eles próprios, deixando o elenco sem a naturalidade que a história pede. Tipo Borboleta funciona melhor nas cenas silenciosas, até porque tem um bonito cenário e uma ótima fotografia solar. Mais é menos.
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