Pesquisa inédita na América Latina mostrou que 2% da população brasileira é de pessoas transgênero ou não binárias. O estudo foi desenvolvido pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foram entrevistadas 6 mil pessoas em 129 municípios de todas as regiões do país. Em números absolutos, essa população é de 3 milhões de indivíduos.
Segundo os participantes do projeto, os resultados mostram a urgência de políticas de saúde voltadas para esse público. “Uma pessoa que nasceu mulher, mas que hoje se identifica com o gênero masculino, um homem trans, vai precisar de uma consulta ginecológica”, disse a professora da Faculdade de Medicina de Botucatu Maria Cristina Pereira Lima, autora do artigo.
Maria Cristina lembra que, em todo o mundo, a expectativa de vida das pessoas trans é mais baixa. “É preciso capacitar esses ginecologistas, capacitar os médicos, os enfermeiros, os fisioterapeutas, enfim, todos os profissionais para poderem atender essa pessoa em suas necessidades de saúde. Se a gente não fizer isso, esse homem vai evitar os serviços de saúde por se sentir hostilizado e, aí sim, aumenta muito a mortalidade”, afirmou.
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Os resultados mostram que pessoas identificadas como transgênero representaram 0,69% e os não binários, 1,19%. O termo transgênero descreve “pessoas que se identificam com um gênero incongruente ou diferente daquele que lhes foi atribuído no nascimento”, conforme explicação da Unesp. Já o termo não binário diz respeito a indivíduos que sentem que sua identidade de gênero está fora das identidades masculina e feminina, ou entre elas.
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De acordo com Maria Cristina, a proporção encontrada é similar à de outros países que dispõem de estudos populacionais nesse sentido, como Estados Unidos e Inglaterra. A pesquisa buscou referências internacionais para chegar ao cálculo de 6 mil pessoas que deveriam ser entrevistadas. “Nós usamos os recursos de amostragem [com] que o Instituto Datafolha trabalha para que essa amostra fosse representativa da população do país”, explicou a pesquisadora.
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A análise dos dados mostrou que o número de indivíduos transgêneros e não binários obedeceu à proporção da população de cada região do país. Os dados sociodemográficos mostraram ainda que não há diferença significativa entre os dados coletados nas capitais e nas cidades do interior. “A gente não imaginava que fosse aparecer na mesma proporção. Isso significa que é preciso desenvolver ações de formação dos profissionais de saúde em todos os espaços, em todo país”, ressaltou.
Maria Cristina destacou que, embora o estudo tenha sido feito no âmbito da medicina, o dado encontrado é importante para diversos campos científicos. “Outras pesquisas com um recorte antropológico, um recorte sociológico, são necessárias para aprofundar a compreensão de como se pode ter uma sociedade mais inclusiva, que valorize as potencialidades das pessoas, independente do fato de elas serem transgênero ou cisgênero.”
Segundo a médica, políticas públicas podem e devem ser desenvolvidas. “O ano que vem é um ano de eleição e a gente deve encaminhar para alguns parlamentares, para que eles se envolvam com essa questão e coloquem nas suas pautas de proposições”, afirmou. A pesquisadora destacou, entre as medidas possíveis, ações afirmativas para pessoas identificadas como transgênero, além de políticas de saúde que atendam as necessidades de transformação corporal. “Em outros países, temos muitos dados de pessoas que querem fazer a transição para outro gênero e que se automedicam. A gente tem que ter políticas públicas voltadas para isso.”
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A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) listou os serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) que prestam esse atendimento. Para Maria Cristina, quanto mais se falar sobre a realidade das pessoas trans e dos não binários, mais se conseguirá transformar o mundo em um mundo inclusivo, em que as pessoas se sintam acolhidas e tenham um lugar.
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