Há menos de duas semanas, pichações começaram a tomar as ruas de bairros da Zona Sul de Santa Cruz do Sul. O logotipo – Grupo R7 filter cigarretes – faz menção a uma marca de cigarros do Paraguai, que já foi apreendida no Brasil em cargas contrabandeadas. A pichação, no entanto, tem um significado bem mais preocupante. A facção criminosa que domina o comércio de drogas no município, já conhecida por se impor pela violência, seria responsável agora também pela venda de cigarros contrabandeados.
A cada dia as pichações surgem em diferentes pontos, como muros, postes, moradias e até estabelecimentos comerciais. A marca, embora seja uma forma de propaganda, não indica necessariamente um ponto de venda. Os cigarros, segundo moradores e policiais, estariam sendo vendidos em pontos de tráfico da facção Os Manos. O grupo teria passado a lucrar também com esse outro produto ilegal. O cigarro, no entanto, só estaria sendo vendido em alguns pontos considerados mais lucrativos. “Não é em toda boca (de fumo) que tem. Vendem tanto a carteira como o pacote”, diz um morador.
No Bairro Bom Jesus, pelo menos dez pontos com pichações podem ser encontrados em ruas como a Padre Luiz Mueller e Adolfo Pritsch. As marcas estão nas principais vias de acesso ao bairro. No Santa Vitória, também há pelo menos três pontos com o símbolo. Além dos bairros da Zona Sul, a mesma marca também pode ser vista em alguns lugares do Centro, como na Rua Carlos Trein. A propaganda não se restringe somente às pichações, que seriam um aviso de delimitação de território da venda de cigarros contrabandeados. Bonés com o logotipo do cigarro já foram identificados pela polícia.
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Já é conhecido do meio policial que traficantes e contrabandistas de cigarros fazem uso das mesmas rotas criminosas para fazer os produtos chegarem aos pontos de venda. É do Paraguai que vem a maior parte da mercadoria ilegal vendida no Brasil. Mas o uso de pontos de tráfico dominados pela facção Os Manos, em Santa Cruz, para o comércio de cigarros, assim como a propaganda agressiva, é novidade. A lucratividade do contrabando e as penas mais brandas para esse tipo de crime estão entre os fatores que, segundo a Polícia Federal, podem explicar o envolvimento de traficantes com essa modalidade de negócio.
Apreensões
O cigarro R7 já foi apreendido pela Brigada Militar em Santa Cruz do Sul. Durante as abordagens, os policiais do município passaram a perceber que a marca vem sendo encontrada com mais frequência. Isso indica que a propaganda, pouco convencional, vem apresentando resultados para o grupo criminoso. O combate a esse tipo de delito esbarra ainda no fato de que a venda se dá em quantidades francionadas. Dessa forma, para a polícia é mais difícil configurar o crime de contrabando. A pena prevista no Código Penal é de dois a cinco anos de reclusão.
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Tática de “propaganda” é novidade
Segundo o presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf), Luciano Barros, a união do tráfico com o contrabando de cigarros também vem sendo percebida na Fronteira. No entanto, o usdo de pichações como forma de marketing do produto contrabandeado até então não tinha sido observado pelo Idesf.
Ainda conforme Barros, a marca paraguaia R7 é conhecida e já estaria em circulação no Brasil, por meio do contrabando, há pelo menos cinco anos. Em julho de 2013, cerca de 5 milhões de cigarros R7 foram apreendidos em um carregamento que seguia da fronteira do Paraná para o Ceará. O logotipo usado pela marca imita o de uma emissora de televisão. As fábricas paraguaias estariam usando imitações desse tipo com o intuito de enganar o consumidor.
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Os cigarros ilegais no Brasil também, muitas vezes, provêm de fábricas clandestinas. Em agosto de 2012, uma indústria desse gênero foi descoberta no interior de Candelária. Treze pessoas foram presas nesse local, que falsificava uma marca brasileira de cigarros, como forma de não despertar atenção no mercado. As fábricas clandestinas seriam um meio de driblar o cerco ao mercado ilegal.
O risco
Além de onerar os cofres públicos, ao entrar no País sem pagar imposto, os cigarros ilegais ainda representam um risco ao consumidor. Sem origem garantida, não há nenhuma segurança sobre as condições sanitárias em que são fabricados. Por outro lado, o valor mais acessível é o fator que mais contribui para que os consumidores acabem optando pelo item contrabandeado. Enquanto o produto legal tem preço mínimo de R$ 5,00, no mercado ilegal, em média, o valor do maço custa metade disso. O cigarro R7, no entanto, estaria sendo vendido por R$ 3,50 a carteira.
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Monopólio
Usuários de drogas dessas áreas dominadas pela facção estariam sendo pressionados para consumir somente a marca de cigarros R7. Além disso, as séries de pichações seriam uma forma de alertar quem vende cigarros contrabandeados para o fato de que só poderá continuar vendendo se for por intermédio do grupo criminoso. “Essa é a marca de um cara que comanda. As pessoas vão ter que vender pra eles. Ou não podem vender mais”, relata um morador do Bairro Bom Jesus.
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