O poeta e tradutor Thiago de Mello morreu na madrugada desta sexta-feira, 14, aos 95 anos, em casa, em Manaus, de causas naturais. Reconhecido com um dos grandes autores da literatura regional, ele alcançou fama internacional graças a poemas como o clássico Os Estatutos do Homem, escrito em abril de 1964, quando Thiago de Mello era adido cultural da embaixada do Brasil no Chile e amigo de Pablo Neruda.
Nascido em 1926 em Barreirinha, no Amazonas, ele sempre foi um defensor da natureza. “Para fazer algo em defesa da humanidade é preciso, em primeiro lugar, que cada um de nós tente persuadir pelo menos um companheiro, que cada um de nós faça qualquer coisa por este planeta Terra tão degradado”, afirmou, durante a Feira Internacional do Livro de Havana, em 2005. “A Terra flutua hoje no espaço como um pássaro em extinção”.
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O interesse sempre norteou a carreira do poeta, que largou a faculdade de Medicina para seguir a literatura e lançar, aos 25 anos, o primeiro livro de poemas, Silêncio e Palavras. Lançou diversas obras até ser exilado em 1964, quando esteve na Argentina, Portugal, França, Alemanha e Chile. Nessa época de repressão militar, tornou-se famoso um verso, no qual dizia: “Faz escuro mas eu canto”. Retornou ao Brasil em 1978, quando o nome dele já era conhecido internacionalmente por lutar pelos direitos humanos, ecologia e paz mundial.
A potência dos versos dele, especialmente os que pregavam contra a violência e opressão, conquistou muitos adeptos, a partir da década de 1970, no meio estudantil e entre grupos de opositores ao regime militar. E, entre os mais admirados, está Os Estatutos do Homem, que iniciava com os seguintes versos no primeiro artigo: “Fica decretado que agora vale a verdade / Que agora vale a vida / e que de mãos dadas / trabalharemos todos/ pela vida verdadeira”.
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Em 1981, Thiago de Mello publicou Mormaço na Floresta, no qual denunciava a destruição da mata da seguinte forma: “Enfim te descobrimos / Foi preciso que as águas mais azuis apodrecessem / que os pássaros parassem de cantar / que peixes fabulários se extinguissem / tua pele verde fosse aberta/ pelas garras de todas as ganâncias”.
“Thiago de Mello é um poeta na contramão da modernidade e isso bastaria para distanciá-lo de seus pares”, escreveu o crítico José Castello, no Estadão, em 1999. Segundo ele, havia muito preconceito e incompreensão cercando a vasta obra do poeta amazonense. “Antes de tudo, é reduzido, um tanto apressadamente, à figura do poeta engajado e sua poesia tomada, mais, como ideologia. Depois, numa época de sofisticação e rapidez, ele se mantém apegado aos temas primitivos e lentos do Baixo Amazonas, aos versos soltos e derramados e, apesar de ateu, a uma visão da poesia como milagre”, observou o crítico.
Ao entrevistar pessoalmente o poeta, Castello ofereceu uma precisa descrição de um homem marcado – e, por isso mesmo, valorizado – por contradições. “Cara de índio, cabelos revoltos, bata branca, Thiago tem mesmo um jeitão de profeta, ou de místico, que contraria (superficialmente, pois ele se considera um utópico) seu perfil de artista ateu e de esquerda. Fala mansa, acentuada pela idade, olhar perdido e grandes silêncios dão a impressão de possuir conexões secretas com outros mundos que não podemos ver. Mas não foge da vida social. Não dispensa convites para seminários, palestras e eventos literários, mas está sempre ansioso para voltar para o silêncio da floresta.”
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O corpo de Thiago de Mello será velado no Palácio Rio Negro, no centro histórico de Manaus, em horário a ser definido.
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