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JOSÉ ALBERTO WENZEL

Tempo das primeiras uvas

Há quarenta anos Paulo Roni Toledo de Moura trabalha na Prefeitura de Santa Cruz do Sul, onde realiza serviços gerais. Solteiro, mora com o irmão e colega de serviço, Santo Olinto, em Linha Santa Cruz. Dia a dia ganha o centro da cidade. Chega, se mune do carrinho e vassoura e, ao lado de colegas, varre, recolhe folhas, aparas de grama e resíduos. Lhes dá o destino recomendado. Agora, aos sessenta anos, admira as melhorias na praça da Bandeira, sua área de serviço há vinte anos. É reconhecido por muita gente. Retorna os cumprimentos gentis sem suspender sua tarefa. Relata que gosta dos cachorros que vêm passear na praça, sua casa.

A mesma casa que é de todos. Casa expandida de muitas infâncias, tão lembradas neste período natalino em que as primeiras uvas amadurecem. Lá em casa, por este tempo, já nublado por décadas passadas, também se limpava o pátio. Nem sempre, mas acontecia que se repintasse muros e paredes. Janelas eram lavadas. O forro da casa recebia uma atenção especial. Limpar o forro ou esfregar o piso nunca foi fácil. Empenho representado pelos flocos de algodão que eram levados ao presépio, ainda vazio. Cada porção de algodão equivalia a um “sacrifício”. Este, na forma de capina, arranjo dos canteiros de flores, limpeza, e também na briga evitada ou na palavra torta resmungada apenas em silêncio.

Quanto mais algodoado o berço que acolheria Jesus Cristo, maior o merecimento e, quem sabe, um belo presente nos aguardasse. Maria e José, os Reis Magos e também os animais ficariam felizes com nosso esforço. Na véspera, os pais estendiam um grande lençol para encobrir o local onde anoiteceria o recém- nascido, sob uma árvore abrilhantada por coloridas bolas e festões cuidadosamente retorcidos por entre os galhos. Musgo e plantas davam um toque especial. Até laguinhos eram ensaiados sobre o papel endurecido no polvilho e tingido nas cores das montanhas.

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Uma estrela esperançosa encimava tudo o mais. Ouvíamos sons misteriosos durante a noite, mas nada de sair do quarto. No anoitecer do dia 24, após sermos afastados para fora da casa, éramos chamados para ver o presépio. Impossível não buscar com os olhos algum presente, ou, ao menos, um pacote de bolachas natalinas que nunca faltavam, quando não uma maçã. Até brinquedos antigos recebiam nova roupagem, como se novos fossem. Todavia, antes de os presentes serem abertos pelas mãos inquietas, entoava-se “Noite Feliz” e orações ecoavam pela casa que fora preparada através de pequenos e “grandes” sacrifícios.

Assim, também Paulo e seus colegas preparam todos os dias a casa/praça para receber a quem dela quiser usufruir, o que nos oportuniza desejar um “Feliz Natal” a todas, todes e todos, e que 2023 seja melhor, especialmente àqueles nem sempre lembrados, aos sem casa, sem trabalho e sem oportunidades.

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