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Temer é suspeito de quê? Um guia para entender a semana

O presidente Michel Temer será investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de crimes de corrupção passiva, participação em organização criminosa e obstrução da Justiça. A Procuradoria-Geral da República afirmou, com base nas delações de executivos da JBS, que Temer e o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) – os dois são alvo do mesmo inquérito – têm atuado para impedir o avanço da Lava Jato.

A íntegra do pedido da Procuradoria-Geral da República e da decisão do ministro Edson Fachin, do STF, autorizando a investigação contra Temer, Aécio e o deputado afastado Rodrigo da Rocha Loures (PMDB-PR) foi tornada pública nessa sexta-feira.

Fachin destacou, entre os fatos que podem configurar crimes descritos pela Procuradoria, a conversa entre o empresário Joesley Batista, dono da JBS, e Temer sobre o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que está preso.

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Na conversa, o delator diz que tem procurado manter boa relação com Cunha mesmo após sua prisão e, segundo a Procuradoria, “Temer confirma a necessidade dessa boa relação”. “Tem que manter isso, viu”, afirma o presidente em áudio gravado por Joesley. “Joesley fala de propina paga todo mês, também ao Eduardo Cunha, acerca da qual há a anuência do presidente”, disse o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao pedir a abertura de inquérito.

Sete anos de favorecimento

A delação dos executivos do grupo J&F (holding que inclui a JBS) implica Temer em negociações feitas desde 2010. Segundo relatos de Joesley Bastista, pagamentos a pedido do peemedebista superam R$ 6 milhões. Outro executivo, o diretor Ricardo Saud, fala em repasses de mais R$ 15 milhões cuja distribuição foi definida por Temer, em 2014. Desse valor, R$ 1 milhão foi encaminhado ao amigo pessoal do presidente, o empresário e coronel da PM aposentado, João Baptista Lima Filho.

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Joesley disse ainda aos procuradores que sempre recebeu “sinais claros” do ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) e de Temer de que era necessário fazer pagamentos ao ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e ao corretor Lúcio Funaro, presos pela Operação Lava Jato, para que estes ficassem calmos e não partissem à delação premiada. Para negociar a delação, os empresários levaram à Procuradoria-Geral da República gravações em áudio e documentos, como planilhas e anotações da empresa. Na conversa gravada em março no Palácio do Jaburu, Temer disse que Cunha o “fustiga”. Joesley afirmou a procuradores que entendeu a fala como um “recado de que pagasse”.

Governo trabalha para anular provas

Após o presidente Michel Temer afirmar que não renunciará e destacar que não tem medo de delação, o governo agora vai trabalhar para desconstruir a imagem do delator Joesley Batista e tentar anular as provas que culminaram com o pedido de abertura de inquérito contra o presidente pelo STF.

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A iniciativa capitaneada pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, de pedir perícia nos áudios divulgados na quinta é a principal aposta do governo para desconstruir as provas. Interlocutores do presidente destacam que “é grotesco” e “evidente” que as gravações foram editadas pelo delator.

Manipulação

Reportagem publicada no site da Folha de S.Paulo na noite dessa sexta-feira apontava que a gravação da conversa do empresário Joesley Batista com o presidente Michel Temer sofreu “mais de 50 edições”. A perícia contratada pelo jornal foi assinada por Ricardo Caires dos Santos, perito judicial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Segundo a reportagem, o áudio divulgado pela PGR “tem indícios claros de manipulação”, mas não dá para falar com que propósito. Ele aponta vícios que poderiam invalidar o áudio como prova jurídica.

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O terceiro dia

Bolsa

  • Após a queda de 8,8% vista na quinta-feira, o mercado fechou em leve alta nessa sexta-feira, esboçando uma recuperação. O Índice Bovespa encerrou o dia em elevação de 1,69%. A delação dos executivos da JBS ainda é motivo de grande apreensão entre os investidores, só que a tensão do dia anterior parece ter diminuído. A avaliação do mercado é a de que o cenário político segue repleto de incertezas, que sustentam cautela e inibem projeções para os preços nos próximos dias.

Dólar

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  • A moeda americana passou por uma correção e devolveu parte da alta vista no dia anterior, de mais de 8%. Nessa sexta-feira, o dólar à vista encerrou cotado a R$ 3,2521 – uma baixa de 3,98%.

Juros

  • A equipe econômica tem agido para evitar distorções no câmbio e insiste que continuará com a agenda de reformas para dar suporte à retomada do crescimento. Porém, especialistas acreditam que haverá mudanças e a política monetária é um dos itens que terão de ser ajustados no curto prazo. Mesmo sem dar pistas dos próximos passos do (Copom), o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, reconheceu que as incertezas aumentaram.

Compra de dólares

  • A JBS admitiu ter comprado dólares nos dias que antecederam a divulgação da delação premiada. A operação teria levado a empresa a aumentar seus ganhos, pois a moeda disparou 8,15% na quinta-feira. A empresa não falou em valores, mas especulou-se que a compra tenha ficado entre US$ 750 milhões e US$ 1 bilhão.

Impeachment

  • A Secretaria-Geral da Mesa Diretora da Câmara registrou, na noite dessa sexta-feira, nove pedidos de impeachment contra Michel Temer. A análise técnica para o deferimento ou não da admissibilidade dos pedidos considera o cumprimento de alguns pré-requisitos formais. Caberá ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), decidir se vai autorizar o andamento do processo de impeachment.

Eleições indiretas

  • Rodrigo Maia começou a fazer consultas sobre as regras para eleições indiretas a presidente da República. A discussão voltou à tona porque, apesar de Temer dizer que não vai renunciar, ele pode ser cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A Corte marcou para 6 de junho o julgamento da ação que pede a cassação da chapa Dilma-Temer por abuso de poder econômico nas eleições de 2014. Caso Temer seja cassado, Maia assumirá interinamente o comando do País.

Nomes para a sucessão

  • Líderes políticos já iniciaram as negociações para uma eventual sucessão. No cenário de uma eleição indireta, ganham força neste momento os nomes do ministro Henrique Meirelles (Fazenda), Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, e o do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, enfrenta resistência dos parlamentares, responsáveis pela escolha no cenário de uma eleição indireta. Para o Congresso, onde muitos são alvo de investigações, Cármen estaria muito identificada com a Operação Lava Jato. Nessa sexta-feira, em uma conversa informal com jornalistas, a ministra disse que o Brasil vai sobreviver ao conteúdo das delações da JBS, rebateu os rumores de que poderia eventualmente assumir a Presidência da República e afirmou que pretende continuar na magistratura “até o último dia”.

Loures

  • A direção da Câmara decidiu cortar alguns benefícios do deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), afastado do cargo por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). A Casa deve decidir na próxima semana, em reunião da Mesa Diretora, se vai suspender também o salário de R$ 33.763,00 e se haverá convocação do suplente. Rocha Loures perdeu o direito à cota para exercício da atividade parlamentar de R$ 38.871,86, uma vez que está fora do mandato.

ENTENDA O QUE ACONTECEU

DEZ PERGUNTAS SOBRE A CRISE

1 – Por que todas essas denúncias começaram a vir à tona agora?
As denúncias têm origem em delações premiadas de executivos da empresa JBS. Tudo começou na quarta-feira à noite, quando uma reportagem do jornal O Globo revelou a existência dessas delações, bem como parte de seu conteúdo. Na quinta, foi deflagrada a Operação Patmos, cujos alvos eram pessoas apontadas nas delações.

2 – O que existe contra Michel Temer?
O Supremo Tribunal Federal autorizou a abertura de inquérito contra o presidente em razão de informações contidas na delação. O empresário Joesley Batista gravou uma conversa sua com Temer na qual lhe relata uma série de delitos, incluindo pagamentos indevidos a políticos e cooptação de agentes envolvidos em investigações contra a empresa. Em dado momento, o diálogo sugere que Temer dá aval para que Batista mantenha pagamentos ao ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, a fim de garantir o seu silêncio. Além disso, um deputado ligado a Temer foi filmado recebendo uma mala de dinheiro da JBS.

3 – O que existe contra Aécio Neves?
Joesley Batista também gravou uma conversa com Aécio na qual ele pede R$ 2 milhões supostamente para pagar a sua defesa em processos na Lava Jato. Nas delações, os executivos da JBS afirmaram que pagaram pelo menos R$ 60 milhões em propina para Aécio em 2014, ano em que o tucano concorreu a presidente da República. Além disso, um primo de Aécio foi filmado recebendo dinheiro da JBS.

4 – O que existe contra Lula, Dilma e o PT?
Na delação, Joesley afirmou que a JBS repassou US$ 150 milhões aos ex-presidentes Lula e Dilma, para obter vantagens junto ao BNDES e junto aos fundos de pensão Petros, da Petrobras, e Funcef, da Caixa Econômica Federal. O dinheiro teria sido depositado em uma conta no exterior. O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega seria o intermediário dos pagamentos.

5 – O que acontece a partir de agora?
As delações dos executivos da JBS foram homologadas pelo Supremo Tribunal Federal. Além de dar validade jurídica aos acordos, a homologação permite que, com base no conteúdo dos depoimentos, a Procuradoria-Geral da República (PGR) peça novas investigações.

6 – Os investigados podem ser presos?
No caso de Aécio, a PGR chegou a pedir a prisão, mas o pedido foi rejeitado pelo ministro do STF Edson Fachin. Com isso, a não ser que surjam novas provas ou alguma ameaça ao andamento das investigações, tanto ele quanto Temer, Lula e Dilma só poderiam ser presos após uma eventual condenação.

7 – Temer pode sair da Presidência?
Tudo deve depender dos próximos desdobramentos. Existem quatro maneiras de Temer deixar o cargo. A primeira, por renúncia, foi descartada por ele. A segunda seria um processo de impeachment. A terceira seria a cassação da chapa Dilma-Temer pela Justiça Eleitoral – o julgamento será retomado no dia 6. E a quarta seria por meio de uma denúncia oferecida pela PGR contra ele perante o STF.

8 – Pode ter nova eleição?
Apenas se Temer deixar a Presidência. Nesse caso, quem assumiria o cargo seria o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e em até 30 dias seria realizada uma eleição indireta, ou seja, caberia aos deputados federais e senadores elegerem o novo presidente. Para haver uma eleição com voto direto da população, seria necessário aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), antecipando o pleito do ano que vem.

9 – O que muda em relação às reformas trabalhista e da Previdência?
Os projetos continuam na pauta do Congresso, mas ao que tudo indica não devem avançar, ao menos por enquanto. O relator da reforma trabalhista no Senado, Ricardo Ferraço (PSDB), e o relator da reforma previdenciária na Câmara, Arthur Maia (PPS), já defenderam que a tramitação seja congelada. A avaliação é de que não se pode votar projetos dessa magnitude em meio a uma severa crise institucional.

10 – O que acontece com os donos da JBS?
O acordo de delação premiada prevê que eles não serão presos e sequer processados. Terão, no entanto, que pagar multa. Inicialmente, circulou que o valor a ser pago pela empresa seria de apenas R$ 250 milhões. Nessa sexta, porém, o Ministério Público Federal divulgou nota na qual afirma que o valor ainda está em negociação e o pagamento solicitado pelo órgão foi de R$ 11,1 bilhões.

QUEM É QUEM

MICHEL TEMER (PMDB)

  • Presidente da República, é acusado de ter autorizado Joesley Batista a fazer pagamentos para comprar o silêncio de Eduardo Cunha e ter silenciado diante de uma série de crimes confessados pelo empresário durante conversa gravada.

JOESLEY BATISTA

  • Ao lado do irmão Wesley, é proprietário do grupo JBS, uma das maiores indústrias de alimentos do mundo. Em acordo de colaboração premiada, confessou ter feito pagamentos indevidos a diversos políticos em troca de favores. Gravou conversas com Temer e Aécio Neves.

ROCHA LOURES (PMDB)

  • Ex-assessor direto de Temer, é deputado federal. Homem de confiança do presidente, teria sido indicado como intermediário para assuntos da JBS com o governo. Foi filmado recebendo uma mala de dinheiro da empresa.

EDUARDO CUNHA (PMDB)

  • Ex-presidente da Câmara, está preso desde outubro e já foi condenado a 15 anos de reclusão por receber propina em contratos da Petrobras. Segundo os irmãos Batista, ele recebia mesada para se manter em silêncio.

LUCIO FUNARO

  • Doleiro, tem ligações com Eduardo Cunha, de quem é apontado como operador, e está preso desde julho. Também é acusado de receber pagamentos indevidos da JBS.

AÉCIO NEVES (PSDB)

  • Ex-candidato a presidente da República, foi afastado do cargo de senador pelo STF na quinta-feira e se licenciou da presidência nacional do partido. Foi gravado pedindo dinheiro à JBS para, supostamente, pagar sua defesa na Lava Jato – é alvo de cinco inquéritos.

ANDRÉA NEVES

  • Irmã de Aécio e uma das pessoas mais próximas ao tucano, foi presa na quinta-feira. É acusada de pedir dinheiro à JBS em nome do irmão.

FREDERICO PACHECO DE MEDEIROS

  • Primo de Aécio, foi designado por ele para receber dinheiro da JBS em seu nome. A entrega dos valores foi gravada.

EDSON FACHIN

  • Ministro do Supremo Tribunal Federal, é o relator dos processos da Operação Lava Jato. Homologou, na quinta-feira, a delação premiada dos irmãos Batista e afastou Aécio Neves do cargo de senador. Rejeitou, porém, a sua prisão. n
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