Rosetta (Rashid) é uma pequena cidade egípcia no encontro do Rio Nilo com o Mar Mediterrâneo, a 65 quilômetros de Alexandria. A cidade teve seu nome eternizado quando, em 1799, soldados de Napoleão se depararam com um fragmento de pedra que seria usado para expandir uma fortaleza local. As inscrições gravadas na escura rocha ígnea vinda do Alto Egito se tornariam a chave para decifrar o alfabeto hieroglífico e entender a cultura e os hábitos do tempo dos faraós.
Um trecho referente à coroação e aos títulos do Faraó Ptolomeu V estava ali, repetido em três línguas: demótico (a língua comum), grego antigo (língua da corte) e em hieróglifos (língua sagrada). Com base neles, o egiptólogo francês Jean-François Champollion conseguiu decodificar o alfabeto dos egípcios. A Pedra Rosetta, capturada pelos ingleses em 1801, pode ser admirada hoje no Museu Britânico, em Londres, onde figura como um de seus objetos mais populares.
Essa ponte de compreensão permitiu entender registros deixados há cinco milênios, desvendando muitos mistérios que rondavam o surpreendente Vale dos Reis, em Tebas Ocidental. Obcecados com a preparação para a eternidade, faraós do Novo Reino e sua elite de adoradores do deus sol construíram tumbas secretas nesse isolado desfiladeiro a 5 quilômetros da margem do grande rio, gerando possivelmente a mais ricamente decorada necrópole da história da humanidade.
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A preocupação com o segredo e a inviolabilidade das tumbas, contudo, não foi suficiente para evitar que, ao longo dos séculos, ladrões e arqueólogos levassem consigo boa parte das antiguidades ali guardadas. Ainda assim, a Cidade dos Mortos permanece inigualável como coleção da magnífica arte funerária egípcia. As tumbas subterrâneas dos faraós, além de tesouros, contêm passagens secretas e armadilhas astutas, e eram combinadas com grandiosos templos mortuários na região próxima à margem do Nilo, onde os monarcas seriam venerados pela eternidade.
O Vale dos Reis pode ser percorrido tranquilamente a pé. Nem todas as mais de 60 tumbas estão abertas ao público; porém, as mais famosas podem ser visitadas, como as de Ramessés IX, seu avô Ramessés IV, Thutmosis III, Amenhotep II e, é claro, do rei menino Tutancâmon.
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Além dos sarcófagos, paredes e tetos preservam uma rica decoração, que conta a história dos faraós e registra os textos do Livro dos Mortos e do Livro dos Destinos. Tutancâmon, que reinou por apenas dois anos, tem uma das menores tumbas, porém muito bem preservada, por só ter sido descoberta em 1922.
Para que seja visitada devidamente, Tebas requer pelo menos três dias e um certo planejamento. Percorri todos os templos mortuários de bicicleta, alugada na margem ocidental do Nilo. Foi a forma ideal de passar o tempo que eu queria em cada um, e encontra-los praticamente sem turistas.
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Nas paredes, portais e colunas das milenares construções, hieróglifos e desenhos narram glórias militares e o reinado de cada faraó. Os mais impressionantes são os de Hatshepsut, Ramessés III e Ramessés II. O último, conhecido como Ramesseum, tem grandiosidade comparável somente à dos templos de Karnak e Luxor. O Colosso de Ramessés, estátua de 17 metros do soberano, está ali aos pedaços e, mesmo assim, confere a dimensão da megalomania faraônica.
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Percorrendo o templo de Ramessés II, observo nos hieróglifos o nome do faraó repetido centenas de vezes. Na incerteza do que somos, que nos acompanha até a morte, e na impossibilidade de prolongar a vida, queremos ao menos ser lembrados. Os egípcios acreditavam que a cada vez que alguém pronunciasse um nome, um sopro de vida era concedido aos que tinham partido. “Se o nome de uma pessoa for dito, ela está viva”, diziam.
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Pensando bem, de alguma forma buscamos fazer o mesmo quando homenageamos antepassados e pessoas amadas que nos deixaram. Carregamos, por exemplo, o nome de nossos pais e, eventualmente, servimos como lembrança de seu exemplo e legado. O fato de uma vida plena e marcante ampliar-se no coração e na mente dos que nos sucedem é algo que, visivelmente, os antigos egípcios já conheciam.
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