A cobrança de um valor extra pela disponibilidade do médico para a realização de parto normal pode estar influenciando no alto índice de cesarianas. Embora seja contestada pelo Ministério da Saúde, a chamada taxa de disponibilidade é aceita pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), que segue um parecer do Conselho Federal de Medicina. O documento não estabelece nem limita valores e, por isso, deve haver acordo entre paciente e médico já no primeiro atendimento, segundo o Cremers.
Mesmo preferindo parto normal pelos benefícios à mãe e ao bebê, Thaís Luane Weschenfelder da Silva optou pela cesárea em razão de ser mais econômico à gestante. Aos 30 anos e grávida de sete meses e meio do segundo filho, tem cirurgia marcada para o fim do mês que vem. “Quero garantir que o médico que me acompanhou durante toda a gestação realize o procedimento. Conheço e confio nele, pois já fez o parto do meu primeiro filho. Se optasse por parto normal, teria que pagar o valor de dez chamadas para ter o profissional, caso contrário, precisaria contar com um plantonista”, justificou.
Segundo a administradora, ao escolher a cirurgia, terá todo o procedimento coberto pelo plano de saúde. “Nesta fase da gravidez já temos um custo alto. O valor extra para ter meu médico inviabiliza o parto normal. Não fosse essa cobrança, eu faria parto normal com certeza”, afirmou.
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Nos hospitais Santa Cruz e Ana Nery, a maioria dos partos são através de cesarianas (veja na página ao lado). Ao longo de 2015, 2.031 nascimentos ocorreram nas duas instituições. Do total, 1.436 foram cesáreas, o que representa 70%.
Conforme o setor de qualidade do Hospital Ana Nery, a casa de saúde não realiza procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), somente por convênios ou de forma particular. Se levado em conta apenas os nascimentos ocorridos no local, no ano passado, 96,4% foram por meio de cesarianas. Já no Hospital Santa Cruz, que atende também pelo SUS, o percentual foi de 70%. De acordo com a assessoria de comunicação da instituição, outro aspecto que influenciaria no alto índice seria o fato de o SUS não cobrir os custos de analgesia, o que levaria as mães desse convênio a optarem logo pela cesárea por não suportarem a dor.
Recomendação da ANS é pela redução
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Desde o ano passado, estão em vigor regras da Agência Nacional de Saúde que visam reduzir o número de cesarianas. A frequência do procedimento chega a 84% na saúde suplementar e 40% na rede pública, segundo dados do Ministério da Saúde. A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de que o índice nacional fique em torno de 15%. Conforme o Ministério da Saúde, entre os riscos da cesariana sem indicação médica estão o aumento em três vezes da possibilidade de morte da mãe e em 120 vezes da probabilidade de problemas respiratórios para o bebê.
Entre as mudanças estabelecidas pela ANS estão a elaboração de um partograma, disponibilidade de informações a gestantes e a criação de um cartão da gestante. No partograma, os médicos apontam a evolução do trabalho de parto, o que motivou a necessidade da cesárea e informações como dilatação e imprevistos. Já as informações sobre a quantidade de procedimentos realizados pelo médico, plano de saúde e hospital devem ser repassadas a pacientes em até 15 dias após a solicitação, podendo gerar multa de R$ 25 mil em caso de descumprimento. No cartão da gestante, deverão constar todas as informações necessárias para o profissional que realizar o parto, como o desenvolvimento da gestação, dados do pré-natal e detalhes sobre a saúde da mãe e do bebê.
De acordo com a assessoria de imprensa da Unimed Vales do Taquari e Rio Pardo, no caso de cesariana a pedido da gestante, a cooperativa cobre o procedimento de acordo com as definições da ANS. Porém, substitui o partograma por um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado pela gestante, tendo em vista que a cesárea é um procedimento cirúrgico e oferece riscos à mãe e ao filho. Em 2014, foram realizados 1.291 partos pelo convênio, sendo que 90% deles foram cesarianas. Já em 2015, o percentual das operações feitas via Unimed caiu para 88% – 236 partos normais do total de 1975.
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