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PELO MUNDO

Tajiquistão, os confins da cultura persa

Jardins do imponente Palácio Kohi Navuz atraem população e turistas

Por serem remotos, pouco conhecidos e pelo passado relativamente recente ligado aos domínios mongol, russo e soviético, pode parecer que os países da Ásia Central são muito parecidos. Porém, embora tenham em comum a hospitalidade e a gentileza de seus povos, os “stão” são resultado de ocupações e civilizações diferentes, o que dá identidade própria a cada uma das nações.

Ao desembarcar em Duxambé, a arborizada capital do Tajiquistão, constatei novamente as saudáveis diferenças culturais que fazem dessa região do mundo um tesouro histórico. Enquanto os vizinhos Quirguistão e Cazaquistão são originários de migrações de povos túrquicos, o Tajiquistão reflete a influência persa, tanto na língua tajique, uma variação do farsi, quanto nos costumes. A nação cultua a doutrina de Avicena (980-1037), pai da medicina moderna e da filosofia islâmica, e a literatura persa, com o poeta tajique Rudaki (858-940) e o multifacetado Omar Khayyam (1048-1131) como principais expoentes.

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A primeira grande ocupação do território tajique foi a do Reino Aquemênida. Transformado em império em 550 a.C. por Ciro, o Grande, a partir de Pasárgada (no atual Irã), esse primeiro domínio persa deixou o maior legado cultural no Tajiquistão, que se reflete na língua, na culinária e no espírito da nação. Seguiram-se as colonizações mongol e timúrida, antes de a Rússia czarista ocupar a região que depois se tornaria uma das repúblicas soviéticas.

Um dos impressionantes salões do palácio, que foi construído em 2014

Com a desintegração da URSS, o Tajiquistão tornou-se uma república independente, em 1991. Em 1994, em meio a uma guerra civil, Emomali Rahmon assumiu a presidência do país. Três décadas depois, ele segue no comando do governo, com um histórico sombrio de autoritarismo alinhado à Rússia de Vladimir Putin.

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O patrimonialismo e o culto à personalidade ficaram evidentes na visita à capital Duxambé. No imponente Museu Nacional do Tajiquistão, em meio à rica arte e aos registros históricos do país, pinturas e fotografias do atual presidente estão por toda parte. Próximo dali, o magnífico palácio Kohi Navuz foi concluído em 2014 para receber cerimônias nacionais e autoridades estrangeiras. Chamou-me a atenção, em um dos vários salões impecavelmente decorados em diferentes estilos persas, um mosaico em posição de destaque com a figura de Emomali Rahmon ao lado de sua mãe. A mensagem, nada subliminar, é a mesma do rei francês Luís XIV: “O estado sou eu”.

Deixando o totalitarismo de lado, caminhar pelas largas avenidas, pelos enormes parques da capital e pelo belo interior do montanhoso país permite um contato direto com o povo e com a fascinante cultura de uma nação que recebe pouquíssimos turistas.

Assim falou Zaratustra

Uma estátua do poeta tajique Rudaki, em um dos parques de Duxambé

Quando falamos em monoteísmo, pensamos automaticamente nas três grandes religiões abraâmicas. A crença em um só Deus, contudo, parece ter origem no Zoroastrismo, religião ainda mais antiga e que tem hoje cerca de 300 mil fiéis no mundo. Em termos proporcionais, o Tajiquistão é o país com maior concentração de zoroastristas. Embora seja predominantemente muçulmano desde o século 8, o zoroastrismo permanece como um dos pilares da base moral e cultural do país.

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Monumento ao monarca Ismail Samani

O monoteísmo não é o único ponto em comum. Como o judaísmo de Moisés, o cristianismo de Jesus de Nazaré e o islamismo de Maomé, no Zoroastrismo as ideias do profeta iraniano do século 13 a.C. Zoroastro (Zaratustra, em persa antigo) formaram a base dos textos religiosos conhecidos como Avesta. Neles, o universo é visto de forma dualística, dividido entre Asha (o bem, a verdade) e Druj (o mal, a mentira).

Atualmente, a inspiração vai além da religião. No prelúdio de Also Sprach Zarathustra, de Richard Strauss (1864-1949), as primeiras cinco notas ficaram eternizadas pelo filme 2001, Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick. A composição, que aparece ainda em outras trilhas e até em música do grupo britânico Deep Purple, foi baseada no livro homônimo de Friedrich Nietzsche (1844-1900). Escrita 15 anos antes do poema sinfônico de Strauss, a obra de Nietzsche introduz o conceito utópico do super-homem (übermensch), abandonando a ideia ascética de separação entre corpo e alma. No texto do filósofo prussiano, Zaratustra se mostra inconformado com o fato de a mediocridade humana ser recorrente e incurável. Nos dias atuais, o profeta talvez tivesse que se resignar definitivamente.

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