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Somos autômatos humanos

Domingo estava pronto para ir ao supermercado comprar os mantimentos para o tradicional churras, além da cerveja, claro. Pressionei o controle remoto e nada. Encostei o ouvido no capô dianteiro: téc, téc, téc… fazia o barulhinho preocupante. Depois de ligar para meu mecânico há 20 anos, que não atendeu, liguei para o corretor de seguros.

Cumpridas as formalidades, para a minha surpresa o socorro chegou em minutos, de moto. Logo o carro voltou a funcionar, mas por indicação do mecânico permaneceu por 20 minutos ligado para carregar a bateria, ainda original, mas com três anos de uso.

Antes de ir embora, o atendente sacou do celular e dedilhou freneticamente por uns cinco minutos. Pediu meu nome e CPF antes de alcançar o aparelho:

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– Por favor, o senhor pode rubricar a ocorrência? – pediu.

Com a ponta do dedo rabisquei a tela do celular. Em seguida ouvi um “bip” no meu aparelho: uma cópia do atendimento chegara por MSN para conferência. Admirado, comentei sobre a modernização a jato de vários procedimentos, como a vistoria dos veículos no momento da contratação do seguro.

Antes, o corretor marcava dia e hora e chegava equipado com uma máquina fotográfica, planilha e caneta. Hoje, o celular cumpre toda as funções com rapidez e inúmeros recursos.

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– Bah… a vida ficou facilitada mesmo, mas o problema é quando termina a bateria. Aí eu fico sem ação, completamente perdido! – murmurou o mecânico.

Lembrei do meu filho Henrique, que fez a carteira de habilitação virtual. Assim, ele está dispensado de portar a CNH de papel junto ao RG, CPF e cartões de crédito. Mas se for parado numa blitz e o aparelho estiver sem bateria, é multa na certa. É o outro lado da tecnologia.

A dependência do celular imposta pela modernidade não tem precedentes. Antes do Natal passei um fim de semana entre cascatas e lugares bucólicos, longe das antenas das operadoras. Foram algumas horas em que o celular fui usado apenas para fazer fotos. Bastou “voltar à civilização” para detectar 87 mensagens. A maioria indagava sobre o meu paradeiro.

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– Tu sofreu um acidente? Onde estás? Me liga urgente! – dizia uma delas.

Como jornalista, a escravidão à tecnologia é ainda mais dramática. Passar o fim de semana desconectado é impensável. A permanente veiculação de conteúdos na mídia nos obriga a dormir com um olho aberto, sempre.

A bateria do celular é como um coração que, sem carga ou batimentos, nos afasta do mundo real e virtual. Somos “autômatos humanos” dependentes, em vigília constante e com a vida pessoal comprometida.

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Naiara Silveira

Jornalista formada pela Universidade de Santa Cruz do Sul em 2019, atuo no Portal Gaz desde 2016, tendo passado pelos cargos de estagiária, repórter e, mais recentemente, editora multimídia. Pós-graduada em Produção de Conteúdo e Análise de Mídias Digitais, tenho afinidade com criação de conteúdo para redes sociais, planejamento digital e copywriting. Além disso, tive a oportunidade de desenvolver habilidades nas mais diversas áreas ao longo da carreira, como produção de textos variados, locução, apresentação em vídeo (ao vivo e gravado), edição de imagens e vídeos, produção (bastidores), entre outras.

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Naiara Silveira

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