Lembro como se fosse ontem. Meus pais eram trabalhadores rurais. Tinham uma propriedade modesta, não sei exatamente quantos hectares, mas era área suficiente para extrair o sustento da família.
Isso renderia uma longa história, que não cabe neste espaço. Então, vou tentar ser objetivo.
Recordo de muitas noites de verão quando meu irmão e eu, ainda meninos, sentávamos ao lado de nosso pai na frente de casa, em Quarta Linha Nova Alta, e olhávamos para o oeste, para os lados de Boa Vista e Alto Linha Santa Cruz, na esperança de ver algum relâmpago. Em outras palavras, a possibilidade de uma chuva que pudesse surgir no horizonte distante, porque as plantas, os arroios, as fontes, os potreiros que alimentavam os animais, as lavouras, tudo estava secando.
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É um recorte de memória daquela época. Cinquenta anos atrás, ou mais. Mas bem que poderia ser uma descrição do que ocorre hoje. Por que não aprendemos? Naquela época não se falava em El Niño, La Niña, ou outros “pivetes” que hoje atormentam nossas vidas. Mas ocorriam enchentes, estiagens e temporais até mais severos do que conhecemos hoje.
Repito: por que não aprendemos? Muitas décadas atrás, um grupo de visionários (não vou citar nomes para evitar melindres) percebeu que a fumicultura, motor da economia da nossa região, seria inviável se não houvesse um amparo ao produtor que investia todos os seus recursos e o trabalho da família durante um ano inteiro em uma lavoura que poderia ser destruída em questão de minutos por uma granizada.
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Nem governo, nem ministério algum, muito menos sistema bancário. Ninguém aceitou bancar esse risco.
Lembra de um ditado que diz que, se um problema não tem solução, resolvido está? Pois foi o que fizeram as lideranças dos produtores naquele momento. Foi na solidariedade, no mutualismo, inspirados na filosofia do “um por todos, todos por um”, que uma associação se formou, se consolidou e hoje dá amparo a milhares de famílias de produtores que se dedicam à fumicultura no Sul do Brasil.
A Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra) deveria ser objeto de estudo e inspiração para qualquer governo que realmente se preocupa em encontrar soluções para a sociedade que representa.
Pois é a partir deste exemplo de entidade, na minha opinião, que quero instigar mentes iluminadas a ajudarem a buscar soluções e alternativas para as famílias que, ano após ano, sofrem com as estiagens em nossa região.
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No lugar de heroicos trabalhadores que seguravam arados, arrastados por juntas de bois, hoje vemos desfilar pelas lavouras tratores com ar-condicionado, máquinas monitoradas por tecnologia de ponta que oferecem todos os indicadores de eficiência para uma lavoura bem-sucedida, do plantio ao manejo, à colheita.
Mas ainda não temos mecanismo algum que regule as chuvas. Como não se pensa nisso? De que adianta toda a modernidade tecnológica, o investimento nos melhores insumos, se as plantinhas na lavoura morrem sob um sol tórrido e inclemente e uma chuva omissa?
Esta é a questão. Faz anos que se bate na mesma tecla. Propriedades rurais desabastecidas de água, para consumo das famílias e para os animais, produção perdida, investimentos que evaporam.
Evoluímos em questões importantes, como produção de energia alternativa, tecnologia, assistência técnica, mas ficamos dependentes da boa vontade de São Pedro em nos mandar chuva. Para o interior e para a cidade.
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Vamos combinar: isso está ultrapassado. Temos que pensar em uma estratégia pública, comunitária, associativa, seja qual for o formato, para fazermos frente ao flagelo das estiagens. Acho que nosso problema não é falta de chuva. Temos precipitações mal distribuídas durante o ano. E não temos cultura e nem tecnologia para fazer uma reservagem de água para os períodos críticos.
Quem sabe se começa a pensar em construir barragens comunitárias para irrigar lavouras e abastecer propriedades. De que adianta escavar buracos interior afora em tempo de seca? Somos eloquentes na defesa de uma pavimentação de estrada ou rua. Mas o asfalto não supre a necessidade de água na propriedade de ninguém. Pense nisso!
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