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GAZ – Notícias de Santa Cruz do Sul e Região

Ser pai é fazer um nó no lençol todos os dias

Uma velha história, conhecida por muitos, conta que, em uma reunião escolar sobre a presença dos pais na educação dos filhos, um homem, humildemente, levantou-se e relatou que não desfrutava de muito tempo para ficar com o filho. Era cedo quando ele saía para trabalhar e garantir o sustento da família, e quando voltava já era tarde e o garoto não estava mais acordado.

Na mesma ocasião, esse homem afirmou, também, que a falta de tempo para o menino o deixava triste e a forma de se redimir era beijá-lo todas as noites quando chegava em casa. Assim, para que o filho soubesse da sua presença, ele dava um nó na ponta do lençol que o cobria.

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O ritual acontecia todas as noites. Quando o filho acordava e via o nó, sabia, através dele, que o pai havia estado ali e lhe dera um beijo. O nó era o meio de comunicação entre eles. O conto termina com uma lição: ao ouvir a história, a diretora ficou surpresa quando constatou que o filho desse pai era um dos melhores alunos da escola.

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Para esta reportagem especial de Dia dos Pais, entrevistamos três pais que têm profissões que exigem mais tempo longe dos filhos. O que não significa que a atenção destinada a eles seja diferente. O fato é que estar presente não é algo necessariamente físico. O amor, o cuidado e a dedicação podem ser demonstrados por meio de diversas formas: em uma mensagem de bom-dia, na atenção às notas do boletim, ou no esforço para manter a autoestima do filho ou da filha. Ser pai é, ao fim e ao cabo, deixar um nó no lençol todos os dias. Um nó que representa o diálogo, o respeito e o amor.

Três turnos trabalhados para garantir sustento

Leandro Ismael, de 31 anos, tem claro na memória todo e qualquer detalhe do nascimento da filha Leandra de Oliveira Ismael, de 9 anos. “Ela nasceu com sete meses e três semanas, com 133 batimentos cardíacos, 2 quilos e 220 gramas e 41 centímetros.” Foi a partir dos dois meses e 16 dias da menina que a mãe decidiu entregar a responsabilidade para Leandro. “Chegou um certo dia que ela chegou e disse que não queria a criança, assinou a guarda para mim, e a última vez em que ela viu a minha filha foi com 4 anos”, conta.

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O pai de Leandra é motoboy. O trabalho exige muito tempo dele e, sendo pai solteiro, precisa deixar a filha com a avó, em Passo do Sobrado. O diálogo com a criança é bem aberto. “Ela chama a avó de mãe, mas sabe quem é a mãe biológica. Já perguntei se ela queria conhecer, mas no momento ela não quer. Se um dia ela pedir pela mãe, eu vou procurar.”

Desde 2015, é do trabalho com telentregas que provém o sustento da filha. Além disso, ele já pensa em alternativas para o futuro da menina. “Eu tenho uma mente bem aberta e sei que a qualquer esquina posso morrer. Tenho um terreno onde eu quero construir quatro duplex, o que vai gerar um lucro caso ela queira fazer faculdade ou um curso”, conta.

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Quando soube que ia ser pai, Leandro lembra que ficou feliz, mas, por outro lado, apavorado. “Vem uma dúvida, tudo é novo, tu não sabe o que vai acontecer.” Hoje, como trabalha até três turnos para sustentar a filha, preferiu deixar a menina aos cuidados da avó. “Não tem como alguém sozinho criar um filho e ao mesmo tempo trabalhar tanto. Até tem, mas pode passar necessidades, e eu preferi ver ela bem com minha mãe.” Todos os domingos e segundas, Leandro fica com a filha. A programação especial deste 8 de agosto será no turno da noite, já que trabalhará com entregas no horário do almoço.

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Aprender a ser pai sendo pai

Neste domingo de Dia dos Pais, Lucas Rios da Silva, de 41 anos, enfermeiro do Hospital Santa Cruz, estará de plantão. O pai de Alice, de 5 anos, e de Arthur, 11, atua na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Covid da casa de saúde. Mais do que nunca, neste período de pandemia, a profissão do pai foi reconhecida em todo o Brasil por representar aqueles que nunca puderam parar, pois têm o dever de salvar vidas.

Sem uma referência paterna, foi com o nascimento de Arthur que Lucas começou o aprendizado de ser pai. “Eu não fui criado com a figura paterna, então eu aprendi a ser pai sendo pai. Fui criado pela minha mãe. Quando o Arthur nasceu é que fui desenvolver o que era ser pai e passar os valores que recebi da família. Acho que estou fazendo um bom trabalho”, frisa o enfermeiro.

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A pequena Alice comenta que o que mais gosta de fazer com o pai é “brincar e ir na piscina”. Esses momentos juntos são muito valorizados, já que a rotina do trabalho na área da saúde, muitas vezes, impossibilita alguns encontros. Além disso, a esposa e mãe das crianças, Daniele Leal dos Santos, 40 anos, também atua na saúde. “Eu trabalho no turno da tarde, e os plantões são de 12 horas nos finais de semana. A gente faz uma manobra, às vezes eu estou de plantão, ela também, e quando os dois estão no mesmo dia, é preciso deixar as crianças na casa de algum familiar. Toda oportunidade que temos, tentamos participar. Mas o mais difícil é estar presente em todos os momentos. Por exemplo, ela começou a andar de bicicleta e eu não estava junto, estava trabalhando”, relata Lucas.

Momentos vividos no trabalho durante a pandemia fizeram com que ele pensasse sobre o privilégio de estar com os filhos nesta data. “Quantos tinham a mesma idade, alguns até mais novos que eu, e não tiveram a oportunidade de serem pais, ou agora vai chegar o domingo e não terão a oportunidade de dar um abraço no pai, ou o pai não vai receber um abraço do filho? Tem pessoas que marcam e que, antes da intubação, falam com a família, e a gente não sabe, mas às vezes pode ser a última vez daquela conversa”, reflete. Neste domingo, mesmo com o plantão, Daniele, Arthur e Alice planejam visitar Lucas no intervalo do trabalho para não deixar a data passar em branco.

Uma dor chamada distância

O trabalho de Manoel Couto, de 31 anos, também exige mais tempo longe da filha Nicolly, de 5 anos. O motorista de caminhão conta que sua profissão o afasta, por vezes, durante dias da família. “Quando chega o final de semana, eu sempre tento tirar um tempo para ela, ajudar a fazer os temas, ensinar algumas coisas, como alfabeto, números ou desenhos. Mas sempre tive pessoas na minha família que me apoiaram, como minha mulher, irmãs, mãe, pai. Às vezes é ruim, mas eu sei que depois, lá adiante, ela vai saber o que o pai fez por ela.”

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Para ele, o mais importante da relação entre pais e filhos é ter amor, carinho e respeito. “Acho que todo pai deve querer ser um exemplo para o filho ou a filha, e acho que a gente sempre tem que tentar andar pelo caminho certo para que eles se espelhem na gente”, diz o caminhoneiro.

A parte mais bonita de ser pai, segundo Manoel, é chegar em casa e ter a filha Nicolly o recepcionando de braços abertos. “O melhor é chegar em casa e ver a felicidade dela me olhando com aqueles olhinhos brilhando, faceira, rindo, virada em dentes, às vezes até com o sorriso banguela. E a parte mais difícil é quando tenho que ficar longe, ficar dias sem ver ela. É uma dor difícil de aguentar”, completa.

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