Em setembro fomos à Normandia. Alugamos um carro e passamos alguns dias circulando pelas comunas e praias onde as tropas aliadas desembarcaram no dia 6 de junho de 1944, o Dia D. Foi uma viagem feita mais de silêncios do que de palavras. Oitenta anos depois, ainda há profundas marcas por todos os lados. Nos cemitérios onde estão sepultados milhares de soldados, chama a atenção a juventude perdida. Eram meninos de 18, 19, 20 anos. São lugares melancólicos, belos até. Mas eu, impactada pela experiência, me ouvi mais de uma vez murmurar enquanto caminhava entre lápides: “Que absurdo. Meu Deus, que absurdo”.
Nasci em uma cidade do interior no caminho para a fronteira gaúcha. Uma cidade com três quartéis do Exército. O impacto desse contingente em uma comunidade pequena é imenso – na economia, na cultura, na ideologia e até nos casamentos. São Gabriel e seus quartéis são uma realidade indissociável.
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Por conta dessa geografia, cresci entre filhos de militares e alguns são meus amigos até hoje. A Lucy, em especial, é a irmã que não tive. No voto, nossas diferenças, que não são poucas, ficam evidentes. Eu tendo mais à esquerda, ela ao contrário. Como uma amizade de mais de cinquenta anos não se atira pela janela, evitamos alguns temas, impomos limites a outros e vamos em frente.
Desde terça-feira me pergunto como ela estará vendo os últimos acontecimentos e os planos para matar Lula, Alckmin (pobre Alckmin) e Xandão. Acreditou? Estaria reticente? Por puro respeito, ainda não toquei no assunto. (E agora ela vai ficar sabendo isso pela coluna.)
Pela parte que me toca, prefiro os militares nos quartéis e não nos governos. A ideia de que as forças armadas podem ou devem comandar um país me soa incompatível com a farda. A res publica é para ser do povo. Governos impostos contrariam os princípios republicanos e a prática democrática.
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Talvez você que me lê pense: “Ora bolas, estamos cansados dos políticos, das denúncias, do circo midiático, das prisões. Nunca dá em nada”. E eu concordo. Nesta era em que tudo vira espetáculo, é como se até a política fosse apenas um jogo de cena. Também estou cansada. Também tenho minhas reservas.
Ainda assim, mesmo que seja difícil manter o bom-senso em meio a tantas idas e vindas dos atores, acho que apostar na paz continua sendo melhor do que apostar na guerra, seja ela qual for. Dá um trabalhão danado, exige paciência, mas vale a pena. Conflito só é bom em joguinho virtual. No mundo de carne e osso leva apenas à dor.
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