Boludo é um cachorro que mora em Paraty. Todos os dias ele vaga pelas ruelas históricas da cidade carioca em busca de um restinho de comida. Conhecido entre os comerciantes, o guaipeca já sabe até onde ir para receber almoço (e muito carinho). Basta aparecer para que o pessoal da rua comece: “Olha o boludo aí”.
Esperto que só ele, o cusquinho preto e avantajado de corpo vaga de mesa em mesa cumprindo a difícil rotina de receber um cafuné aqui e uma carninha ali. Cansado depois do árduo trabalho, vai até a praia sestear. É preciso tirar a sonequinha dos justos. Enquanto esperava pelo check in no hostel naquele ritmo de tranquilidade, calmaria, coisa e tal, Boludo, todo preguiçoso, chegou devagarinho e por ali se “aprochegou”. Estava dada a largada para as descobertas dessa cidade onde pouco fiquei e já quero voltar. Ainda bem.
Ingressar no centrinho de Paraty é mergulhar em outra época. Calçada de pedra, janelões e casas construídas no século 18 formam um conjunto arquitetônico colonial muito bem preservado. Outra maravilha que faz o tempo parecer outro é a proibição dos carros. Pelo menos na região central, a prioridade são os pedestres. E naquele embalo, nem as pedras irregulares que ocasionaram alguns tropeços – quem mandou não colocar um calçado confortável? – me fizeram deixar de flutuar. Paraty é um sopro de poesia.
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Além do clima, da beleza, das pessoas, me apaixonei pelas portas. Azul, amarela, verde, roxa. Uma mais carismática que a outra. Até tentei evitar o celular, mas não soube lidar, confesso. Tenho um book delas. De todos os ângulos. Ai, ai.
Também tive um caso de amor com as mesinhas de rua. Difícil era escolher em qual delas sentar. Mas daí quando a fome bate, meu amigo, você só quer resolver o problema. Refeição decidida (um peixinho), cervejinha pedida (estupidamente gelada, por favor), que comecem os trabalhos. “Como é bom estar aqui”, pensei. Nesse clima de férias, e com um sambinha de fundo, o garçom, queridão, rastafári paz e amor, engatou uma conversa.
De São Paulo, contou por que foi parar em Paraty e como é a rotina em tempos de grandes eventos. A Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) ele elogiou (ufa!). Já o Festival da Cachaça… “O povo perde a noção, ‘mano’. Depois de certa hora eles ficam se encostando e mexendo no meu dread”, contou bastante indignado. Eita, meu povo! Um tempo depois uma artista, a Wal, passou por ali e ofereceu alguns postais feitos em aquarela.
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Me contou ela que já percorreu o Brasil todo, mas foi em Paraty que escolheu ficar. “O clima é diferente. Eu amo, de verdade, isso aqui.” Nesse meio-tempo surgiu ainda outra figura caracterizada de Charles Chaplin. Ele montou uma florzinha feita de cipó e foi embora sem pedir contribuição. Na hora, encontrei potencial para a tal flor enfeitar o meu cabelo e deixei ela atrás da orelha até a noite chegar.
Após o almoço, mais uma voltinha me levou a um café. Aí é sentar e observar. Artesãos trabalhando, turistas aproveitando, a brisa batendo. Estava há algumas horas em Paraty, mas a sensação era de viver aquilo há dias. É essa noção de se perder no tempo o que mais me agrada quando viajo. As horas rendem, e o relógio? Esse a gente esquece.
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