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VENÂNCIO AIRES

Ataque à Peva completa seis meses; investigação segue em andamento

Foto: Cristiano Silva

Delegado Marcelo e o material apreendido após o ataque: correntes com miguelitos, escudos, esmeril e muitos cartuchos deflagrados

Passavam alguns minutos das 2 horas da madrugada de 23 de maio, um domingo. O policial militar Cláudio (nome fictício, para preservar a identidade do policial) estava no alto da guarita 1, observando o movimento interno da Penitenciária Estadual de Venâncio Aires (Peva), quando o primeiro tiro de fuzil atingiu a torre. Uma chuva de disparos se sucedeu, quebrando os vidros e perfurando o concreto da estrutura. “Foi em uma fração de segundos. Fiquei de pé e iniciou o tiroteio. Eram dois que chegaram a pé, com fuzis, e se colocaram próximos da guarita. Depois dos primeiros tiros, me posicionei e peguei a carabina CT 40 para repelir. Mas, do outro lado, o outro bandido começou a atirar e precisei recuar.”

O objetivo dos criminosos era neutralizar a reação do policial ao ataque para que os comparsas conseguissem acessar a casa prisional. Cláudio estava na guarita que separa a Peva do acesso à estrada, onde os carros usados pelos bandidos estavam. “Eu me lembro de tudo como se fosse agora. Na hora, não imaginava o tamanho disso tudo. Só depois foi cair a ficha. É uma coisa que não vai ter como esquecer. Foi tenso.”

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O policial foi um dos servidores que estavam na Peva quando bandidos fortemente armados tentaram resgatar um dos presos, ligado a uma facção criminosa. A Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) de Santa Cruz do Sul é a responsável por essa investigação e junta as peças para desvendar aquele que é considerado um dos maiores atentados ao sistema penitenciário gaúcho.

Marcas de tiros podem ser vistas na Guarita 1, na qual estava o policial militar
Guarita 1 (no canto inferior direito da planta) foi alvejada com pelo menos 31 disparos. Bandidos chegaram pelo acesso lateral, próximo à estação de tratamento de esgoto (no centro, abaixo)

“É algo que vai ficar marcado na lembrança”

Os bandidos dispararam com fuzis de calibres 223, 556 e 762, além de pistola 9 milímetros. Das dezenas de disparos efetuados, 31 marcas de projéteis foram identificadas pelo Instituto Geral de Perícias (IGP) na estrutura da guarita 1 da Peva, onde o policial militar estava, 13 nos vidros e o restante na alvenaria. Quatro orifícios também foram localizados na guarita 2, onde não havia agentes.

Segundo Cláudio, a ação dos bandidos não durou mais que quatro minutos, mas pareceu uma eternidade para o PM de 36 anos. “Nunca tinha passado por uma situação dessas em 12 anos de Brigada Militar. É algo que vai ficar marcado na lembrança, pois foge muito da rotina aqui do nosso Estado. Talvez em outros locais, como o Rio de Janeiro, esse tipo de ação seja mais comum. Mas aqui, sobretudo na nossa região, é algo fora do normal”, disse ele.

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“Embora eu estivesse em uma posição privilegiada, os criminosos estavam dos dois lados atirando. Os vidros foram quebrados pelos tiros de fuzil e se eu aparecesse para revidar, poderia ficar muito exposto. A intenção deles era justamente me deixar impossibilitado de tomar qualquer atitude, para eles acessarem o local e conseguirem concluir o plano deles.” Além dos dois bandidos que invadiram o terreno a pé, outros criminosos entraram em três veículos pelo acesso externo lateral, próximo à estação de tratamento de esgoto da penitenciária.

Eles tripulavam um Chevrolet Captiva prata, blindado, com placa de Pernambuco; um Jeep Renegade, também prata, de Porto Alegre; e um Ford EcoSport preto, com placa do Mercosul. A ação tinha como objetivo resgatar um presidiário, mas foi frustrada pelos agentes penitenciários e policiais militares, que trocaram tiros com o grupo. Nenhum servidor ficou ferido, mas sabe-se que um dos quadrilheiros foi baleado, pois o IGP encontrou sangue em diversas partes da Peva. Após minutos de trocas de tiros, os criminosos desistiram do plano e fugiram.

As autoridades policiais não revelaram o nome do preso ou facções envolvidas no caso, mas a reportagem apurou que o principal alvo do resgate seria um homem conhecido pelo apelido de Turco, natural de Lajeado. Ele tem 38 anos e possui antecedentes por homicídio, tráfico de drogas e lesão corporal. Imediatamente após o fato, a Superintendência do Serviços Penitenciários (Susepe) transferiu-o da Peva para a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), onde permanece recolhido.

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Juntando as peças do quebra-cabeças

Dezenas de metros de correntes acopladas a cadeados e miguelitos (metais pontiagudos, usados para furar pneus), escudos artesanais com chapas de aço, um grande alicate usado para corte de vergalhão e um potente esmerilhador para serrar grades, além de diversos pacotes com dezenas de estojos de calibres 223, 556, 762 e 9 milímetros, ocupam boa parte do espaço da sala de investigação da Draco, em Santa Cruz do Sul. Os itens, que estavam com os criminosos no ataque à Peva, foram apreendidos pelos policiais e servem de base para o inquérito, que está em andamento.

Na última terça-feira, 23, completaram-se seis meses do atentado. O delegado Marcelo Chiara Teixeira, responsável pela delegacia especializada, recebeu a Gazeta do Sul e detalhou parte da investigação sigilosa, que segue em curso e busca esclarecer quem foram os criminosos que agiram no local, bem como identificar de forma conclusiva a sua motivação. Segundo ele, embora a hipótese mais provável seja que os bandidos atuaram para resgatar um apenado com ligações com uma facção criminosa, não se descarta que o atentado tenha outras razões.

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“A hipótese mais lógica e que prevaleceu no início da investigação é o resgate de um apenado. Mas há outras linhas que, embora menos prováveis, ainda não descartamos, como até mesmo um possível atentado a alguém que estava recolhido no presídio ou até contra o sistema penitenciário”, afirmou Chiara. Em seu laudo, o IGP contabilizou que pelo menos 163 disparos foram feitos nos poucos minutos do ataque. Segundo o delegado, embora tenha sido ventilada a possibilidade de envolvimento de membros de facções de fora do Estado na ação, a maior probabilidade é de que os participantes do atentado sejam integrantes de quadrilhas com base no Rio Grande do Sul.

“Foi um fato criminoso muito bem organizado, o que gera dificuldade na investigação. É possível identificar que é um grupo bem violento, articulado, bem preparado, com poderio financeiro para adquirir veículos e armamentos de alto calibre. Estamos dando sequência a essa investigação complexa, fazendo diligências, realizando perícias, para tentar elucidar o fato por completo”, salientou Chiara.

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Bando instalou escudos de aço em seus veículos

Três veículos utilizados pelos criminosos foram apreendidos. A Captiva e o Renegade ficaram atolados na lama, durante a fuga. Nos carros havia dinamite, garrafas de combustível e um coquetel molotov – espécie de bomba incendiária artesanal, feita com garrafa pet e gasolina. Já a EcoSport foi localizada pelo Comando Rodoviário da Brigada um dia após o crime, em Picada Mariante, interior de Venâncio, sem as rodas e com marcas de tiros.

A Captiva era blindada. Os outros dois carros receberam escudos de aço adaptados, para proteger os ocupantes de disparos. Não se descarta que mais veículos tenham sido utilizados. Os policiais civis também apreenderam na Peva uma touca ninja suja de sangue e os dois escudos de aço portáteis, usados pelos criminosos para se proteger dos tiros.

Outra prova obtida pela Polícia Civil foram imagens de câmeras de segurança que mostram as correntes com miguelitos e cadeados, instaladas pelos bandidos em duas pontes na RSC-287. Uma fica cerca de 300 metros antes do acesso à Peva, para quem segue pela rodovia de Santa Cruz em direção a Porto Alegre, na localidade de Ponte Queimada. Já outra corrente com miguelitos foi instalada em uma ponte que fica 15 quilômetros depois da penitenciária, em direção à Capital, próximo de Mariante. O objetivo das correntes dá ideia da ousadia e periculosidade dos homens que realizaram o ataque: para impedir a chegada de viaturas, decidiram bloquear todo o trânsito em uma das principais rodovias do Estado.

Imagens de câmeras mostram a corrente com miguelitos cadeada a uma das pontes da RSC-287, para impedir o avanço da polícia

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