Esteve em Santa Cruz do Sul na sexta-feira, 1º de março, o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF). O magistrado veio ao município para participar do Simpósio Regional de Direito e Agronegócio, organizado pela Faculdade Dom Alberto, Grupo Educacional Faveni e Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc). Participaram do evento ainda os ministros Douglas Rodrigues, Hugo Scheuermann e Alexandre Ramos, todos do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Antes do simpósio, pela manhã, participaram também de um almoço no Hotel Águas Claras.
Em seu discurso inicial, Mendonça destacou a importância do contato entre os juízes e ministros das instâncias mais elevadas da Justiça brasileira com a população e a sociedade civil organizada. Em sua compreensão, isso “oxigena a magistratura” e traz relevantes percepções das realidades distintas no Brasil. Chamou a atenção ainda para sua origem humilde e disse ser fundamental para os integrantes do Judiciário brasileiro que não esqueçam suas origens e nem os problemas do País.
À noite, Mendonça abriu o evento com a palestra A constitucionalização do Direito do Trabalho: impactos no agronegócio. Em entrevista exclusiva à Gazeta do Sul, o ministro lembrou que a Constituição brasileira tem como preceitos fundamentais o desenvolvimento, o direito à livre iniciativa e a preservação do meio ambiente, que se unem no conceito de desenvolvimento sustentável. “Nesse contexto, o agronegócio se insere. É um setor que emprega, gera receita de tributos que contribuem para a prestação dos serviços públicos e gera riqueza para o País”, afirmou.
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Diante de tudo isso, ele entende ser essencial valorizar o agronegócio e ter uma legislação que favoreça o seu crescimento, ao mesmo tempo em que respeite e preserve os recursos naturais. “Na minha experiência, talvez o agro seja a atividade que mais busca respeitar a natureza, porque ele depende dela.” O problema, segundo Mendonça, são aqueles que realizam atividades ilícitas valendo-se do agronegócio. “É preciso separar o agricultor, que depende e protege a natureza, daqueles que querem apenas explorar as riquezas.”
Para o professor do curso de Direito da Faculdade Dom Alberto e um dos organizadores do simpósio, Diogo Durigon, a visita de André Mendonça e dos ministros do TST é histórica para Santa Cruz. “Não sei quando teremos novamente essa oportunidade”, disse. Para ele, trazer as cortes superiores para perto da comunidade e poder discutir o direito do trabalho no âmbito do agronegócio é de fundamental importância, visto que a atividade é o carro-chefe da economia do Vale do Rio Pardo.
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O evento teve o apoio da Gazeta Grupo de Comunicações, J&F, JBS, Ordem dos Advogados do Brasil – Subseção de Santa Cruz do Sul, Associação Comercial e Industrial de Santa Cruz (ACI) e Hospital Ana Nery.
Diante de um panorama de mudanças climáticas que podem, eventualmente, exigir mudanças na legislação ambiental do Brasil, o ministro Alexandre Ramos recordou que o agricultor não é inimigo da natureza. Segundo ele, os dados mostram que o percentual de violação das leis ambientais por parte do agronegócio é mínimo. “De um modo geral, as grandes empresas têm uma preocupação muito grande com essa temática e políticas de compliance também em observância dessa legislação.”
Um exemplo disso, conforme o magistrado, é que o setor tem conseguido ampliar a produtividade usando as mesmas áreas, sem necessidade de novas aberturas. “Isso é reflexo de aplicação de tecnologia, bom trato com o meio ambiente e, sem dúvida, está impulsionando a economia brasileira.” Esse avanço, avalia, também tem muito a ver com o uso de novas tecnologias no agronegócio, ainda que essa mudança gere insegurança aos trabalhadores sobre a manutenção dos postos de trabalho.
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Entretanto, ele frisa que a tecnologia chega para todos os setores e não é possível fazer uma distinção com a agricultura. “Em todas as revoluções industriais, sempre houve essa perspectiva de mudança do modo de produção e em um primeiro momento, extinção dos postos de trabalho por inadequação dos empregados a essas novas tecnologias”, recordou. Ainda assim, a história mostra que a sociedade conseguiu se adaptar após um tempo e reinserir essa força de trabalho em outros setores da economia.
Para André Mendonça, a reforma trabalhista promulgada em 2017 chegou para corrigir algumas distorções existentes em razão da evolução da sociedade. Segundo ele, ao resolver problemas do século 20, ela proporcionou garantia de direitos e emprego ao trabalhador. “Só que o mundo mudou, tivemos uma pandemia que mudou a forma de trabalhar, então já precisamos repensar o futuro no século 21.” Em seu entendimento, esse é o grande desafio que o Brasil tem pela frente.
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O ministro afirma que a legislação não pode estar afastada dos direitos e garantias mínimas, mas também não pode ser tão rigorosa. “Ela não pode inviabilizar aquilo que se propõe a proteger, que é o emprego.” De acordo com o magistrado, a dificuldade é encontrar o equilíbrio entre a preservação dos direitos mínimos do trabalhador e a preservação dos empregos, tudo isso em um cenário de avanço tecnológico cada vez mais rápido e inevitável.
Já o ministro Hugo Scheuermann, do TST, salientou que a reforma ainda possui pontos pendentes e que estão em discussão e validação pelo órgão. Mesmo assim, já é perceptível a redução no número de processos na Justiça do Trabalho. “No âmbito do agronegócio, houve uma redução significativa, na ordem dos 30% de queda de abertura de novos processos.” Para ele, no entanto, a grande frustração da reforma trabalhista é que ela não foi capaz de cumprir a promessa de criar novos postos de trabalho e reduzir os índices de desemprego.
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Outra mudança da reforma, citada pelo ministro Douglas Rodrigues, diz respeito ao empoderamento das entidades sindicais, considerando que os acordos e convenções coletivas de trabalho passaram a ter força de lei. Conforme o magistrado, isso alterou uma tradição de quase um século onde o Estado era responsável por organizar o sistema legal trabalhista. “A reforma tocou em mais de cem pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e muitas delas ainda geram dúvidas e incertezas”, observa.
Ao comentar o futuro, ele entende que as mudanças sociais são muito mais rápidas que a capacidade do legislador para regular. Rodrigues salienta que a tecnologia mudou visões muito antigas, como o compartilhamento do espaço físico entre o empregado e o empregador, a supervisão direta da produção e das horas trabalhadas, entre outros pontos. “Lidar com essas novas realidades e encontrar um modelo de regulação jurídica adequada é o desafio que se coloca para o Congresso Nacional.”
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