Foi concluído nessa quarta-feira, 9, no salão do júri Juiz Gerson Luiz Petry, o derradeiro capítulo de um dos homicídios mais cruéis dentre os cometidos em Santa Cruz do Sul nos últimos anos. Bruno Fleck, autor da tortura e assassinato do jovem Paulo Eduardo Bolico Schneider, de 19 anos, na madrugada de 25 de outubro de 2020, foi condenado por um corpo de jurados composto por seis homens e uma mulher.
O réu pegou 14 anos de prisão. Os sete jurados entenderam que Fleck, de 19 anos, cometeu um homicídio duplamente qualificado, tendo participado como executor. As duas qualificadoras – dispositivos que ampliam a pena – foram elencadas pelo uso do meio cruel (tortura) e de recurso que impossibilitou a defesa da vítima, pois Paulo foi amarrado e amordaçado.
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Fleck foi absolvido da acusação de ter cometido crime de corrupção de menor, apresentada porque um adolescente seria também um dos autores da execução. As teses de acusação foram apresentadas pelo Ministério Público, representado pelo autor da denúncia, o promotor criminal Flávio Eduardo de Lima Passos, que reconheceu o trabalho da imprensa na publicação do conteúdo referente às ações criminais. “Fica minha saudação à imprensa pela missão de informar a sociedade, pois é possível verificar como as notícias veiculadas no Portal Gaz levaram a uma linha de investigação que se revelou importante para o caso. Todos aqueles comentários nas matérias publicadas nas redes sociais, que a gente às vezes não dá bola, deram um norte inicial para desvendar esse crime”, salientou Lima Passos, mostrando aos jurados prints das matérias veiculadas, que foram juntadas aos autos do processo.
Natural de Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, o réu já cumpria prisão preventiva no Presídio Regional de Santa Cruz do Sul. Ele preferiu não falar ao júri, mas, por meio da manifestação do defensor público Arnaldo França Quaresma Júnior, confessou a autoria do homicídio. O resultado do julgamento saiu às 17h20 de ontem, com o pronunciamento da juíza Márcia Inês Doebber Wrasse, que presidiu a sessão e fez a dosimetria da pena. “A culpabilidade mostra-se em grau elevado, pois o réu, ajustado com outros indivíduos, planejou a morte do ofendido e demonstrou agir com frieza. Além disso, o crime foi cometido por meio cruel, uma vez que, de acordo com os laudos, a vítima teve um dos dedos decepados”, disse a magistrada.
Ao final do júri, o promotor comentou o desfecho. “A decisão dos jurados mais uma vez veio dar êxito à investigação brilhante feita pela Polícia Civil, que chegou à autoria do delito e esclareceu as circunstâncias por completo. A sociedade reconheceu as provas colhidas. A pena foi justa.”
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O caso
Na madrugada de 25 de outubro de 2020, Paulo Eduardo Bolico Schneider foi sequestrado pelos acusados e levado até uma residência do Bairro Faxinal Menino Deus. No local, foi amarrado e amordaçado, sendo colocado no porta-malas de um carro e conduzido, na sequência, até uma área de mata, na Avenida Rudi Falk, próximo ao Parque de Eventos, no Distrito Industrial de Santa Cruz do Sul.
No local, ainda preso por cordas nos pés e nas mãos, o jovem foi torturado, tendo um dedo da mão esquerda decepado, antes de ser morto com pelo menos dez golpes de faca que foram direcionados, a maioria, à cabeça. O corpo de Bolico foi encontrado pela manhã. A causa da morte foi identificada como “hemorragia cerebral e desorganização de massa encefálica devido a múltiplos ferimentos por arma branca”.
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Devido ao estado do cadáver, a identidade só foi confirmada na manhã do dia seguinte ao assassinato, quando um familiar fez o reconhecimento no Departamento Médico Legal (DML). Paulo era natural de Salto do Jacuí. Seu último endereço, antes de virar morador de rua, era no Residencial Viver Bem. Ele tinha passagens na polícia por delitos como vias de fato, ameaça e lesão corporal. Usuário de drogas, cometia furtos para sustentar o vício.
Como a 2ª DP localizou todos os envolvidos
Bruno Fleck foi identificado e preso rapidamente pela 2ª Delegacia de Polícia (2ª DP). Apenas quatro dias após o homicídio, em 29 de outubro de 2020, ele foi detido na residência onde morava, na Rua Deputado Lidovino Fanton, Bairro Faxinal Menino Deus – casa essa que era de propriedade de Bruna Daiane Esteves, a mandante do crime. Foi neste local que Paulo Eduardo Bolico Schneider foi mantido em cárcere.
Na casa, os investigadores encontraram um facão dentro de uma churrasqueira, visivelmente exposto ao fogo, que foi uma das armas usadas no crime. Na ocasião, além da lâmina, uma quantidade de drogas foi localizada. A polícia também apreendeu um carro. Já em 2 de dezembro de 2020, um adolescente de 17 anos foi apreendido no Bairro Jardim Boa Vista, em Rio Pardo. Ele era enteado de Bruno Fleck.
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O rapaz foi encaminhado à Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (Fase) de Porto Alegre e será julgado em processo à parte, pelo Juizado da Infância e Juventude. Seis dias depois, em 8 de dezembro, foi a vez de Bruna Daiane Esteves ser presa na Rua Guarda de Deus, Bairro Santuário, para onde ela havia se mudado logo após o crime. No local, a polícia também encontrou 11 gramas de cocaína.
Ela foi condenada em júri popular realizado em 6 de outubro de 2021, no Fórum de Santa Cruz. Pegou 16 anos pelo crime de homicídio duplamente qualificado, dado ser a mandante. Embora tenha coletado indícios da participação de mais duas pessoas, que teriam ajudado a levar Schneider até a casa onde o crime ocorreu, os agentes da 2ª DP não conseguiram comprovar tais participações, e os suspeitos não foram indiciados.
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Comentários divulgados na época davam conta de que Schneider teria assaltado um motoboy, que havia levado um lanche até a casa de Bruna Esteves, no Bairro Faxinal Menino Deus. Essa hipótese não foi confirmada no decorrer da investigação. No entanto, para o delegado Alessander Zucuni Garcia, ficou claro que a vítima tinha cometido um delito nas imediações do bairro, que tem como um dos líderes do tráfico um homem conhecido no submundo do crime pelo apelido de “Nego Drama”, e que está preso. Esse homem é marido de Bruna.
O homicídio, conforme a investigação, teria ocorrido em represália ao delito cometido pela vítima nas proximidades de um ponto de tráfico de drogas, onde os envolvidos no processo atuavam. Dentre os elementos apurados pelos investigadores estavam até mesmo fotos de Paulo amordaçado na residência, repassadas entre os autores, que foram obtidas com a quebra do sigilo nos aparelhos apreendidos.
Delegado foi a única testemunha no tribunal
O delegado Alessander Zucuni Garcia, titular da 2ª Delegacia de Polícia e responsável pelo inquérito que indiciou o rapaz e outras duas pessoas pelo homicídio, foi a única testemunha a falar no tribunal. Ele narrou, com riqueza de detalhes, o trabalho da equipe, o qual classificou como “um roteiro perfeito para uma investigação”. “Desde o início, quando começamos a receber imagens do cadáver, vimos uma cena realmente chocante, com dezenas de cortes no corpo da vítima, que estava com as mãos amarradas e amordaçada. Inicialmente, não tínhamos muitos elementos, mas as redes sociais nos dão um norte nessa questão. Nesse caso, começaram a surgir comentários nas matérias publicadas sobre o fato, nos quais relatavam sobre o possível furto ou roubo que o Paulo Eduardo poderia ter cometido no Faxinal Menino Deus”.
Na análise feita no celular de Fleck também foram encontrados elementos importantes para a investigação. “Verificamos que ele tinha apagado as mensagens enviadas para pessoas de suas relações. Mas a gente busca por outros caminhos e terminamos por recuperar três fotografias de quando a vítima ainda estava dentro da casa do Bruno e da Bruna, com as mãos amarradas e amordaçada.”
O facão apreendido na mesma residência dos acusados foi enviado para perícia. A derradeira prova não tirou dúvidas quanto à participação dos envolvidos. “Encaminhamos para análise e restou positivo para identificar sangue na lâmina. Mais do que isso, indicou que aquele sangue era da vítima, Paulo”, complementou Alessander Zucuni Garcia.
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