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OPINIÃO

Rose Romero: não nos afastemos

*Por Rose Zoch Romero

Quando eu tinha 7 anos, vivi meu momento de guerra. Em uma manhã luminosa de verão, fomos acordadas por um soldado que batia à porta com visível pressa. O fogo consumia o paiol do quartel na frente da nossa casa e a ordem era se abrigar até que o perigo passasse.

Meu pai já havia saído para o trabalho na padaria, no outro lado da cidade. Minha mãe, angustiada, achou mais prudente irmos para uma vizinha, a uma quadra de distância. Três meninas de 5, 6 e 7 anos, uma adolescente e duas mulheres adultas trancadas no quarto ouvindo explosões e o zunido das balas passando. Sem saber do tamanho do problema, num tempo em que as comunicações eram frágeis e que em casa de pobre não havia telefone e nem TV. Lembro de ficarmos embaixo da cama porque as mães acreditavam que, caso uma bomba explodisse ali, nós crianças estaríamos um pouco mais protegidas.

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Adulta, empoderada pela internet e o Google, busquei sem sucesso informações sobre o caso. O que realmente ocorreu naquele verão no final dos anos 1960 no 9° RCB em São Gabriel? Quanto tempo se passou entre o alerta dos soldados pelas ruas do bairro e o aviso de que estávamos seguras e podíamos retomar nossas vidas? Trinta minutos? Três horas? Foi tão terrível quanto parece hoje, meio século depois? Alguém se feriu? Nunca soubemos. Quem sabia não contou e nosso medo tratou de jogar o episódio para o canto das memórias confusas. Fiquei então com essas lembranças em fragmentos – seis mulheres trancadas em casa esperando os disparos cessarem. Uma fragilidade absoluta. 

Ano passado, cheguei aos 60 anos. Sou uma pessoa privilegiada. Tenho saúde e tempo. Sou o resultado das minhas escolhas. Mas também das escolhas de mulheres e homens que impactaram na minha vida. É bom estar aqui. Em paz por não precisar mais brigar. Brigar por respeito, brigar por reconhecimento profissional, brigar pelo direito de ser livre, de sair de casa, de mudar de vida, de não ter filhos, brigar pelo direito de ser inteligente, brigar e brigar. Quem é mulher e vai à luta, sabe do que eu estou falando.

Esta semana, em um áudio sem noção, um deputado sem noção se referiu às mulheres da Ucrânia como “fáceis”, entre outros adjetivos. Integrante de um comboio de ajuda humanitária no país em guerra, nosso parlamentar encontrou ânimo para constatar que seria moleza pegar as belas ucranianas, sobretudo as pobres, fragilizadas em um momento histórico que assusta o mundo.

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Não nos enganemos. Arthur do Val não está sozinho. Sua revelação sexista e insensível expressa um sentimento extremamente comum, ainda hoje.  É por essas e outras que nós mulheres vamos seguir dormindo com um olho fechado e outro aberto. As bombas, de todos os tipos, seguem por aí.

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