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Ritos e artes

Diferente da minha esposa e das crianças, não estou em total isolamento e sigo trabalhando, fiel aos princípios que mantenho em 25 anos de profissão como jornalista, de bem informar a comunidade, principalmente em momentos de crise, quando as pessoas mais precisam de orientação. Essa também é a filosofia da Gazeta, onde atuo como editor executivo. Ainda que tenha possibilitado o home office aos colegas que integram o grupo de risco, a Gazeta – como os leitores e ouvintes já perceberam – mantém em todas as suas plataformas robusta e imprescindível cobertura acerca dos avanços da pandemia e dos esforços para contê-la, e ainda esclarece, cotidianamente, o que é verdade e o que é fake entre os incontáveis relatos e orientações que circulam nas redes sociais.

Tudo isso, sem abdicar da atenção a outros temas que tanto preocupam o Vale do Rio Pardo, tais como a severa estiagem que castiga nosso interior e a necessidade de maiores cuidados com a água e o meio ambiente, presente nas reportagens com o selo do projeto Repensar. Neste período de tensões e instabilidades, o papel da imprensa é fundamental, conforme já reconheceu o próprio presidente da República. Claro que, na praxe do jornalismo, estamos tomando uma série de cuidados pessoais em relação ao risco de contágio. E o álcool em gel tornou-se companheiro inseparável da equipe.

No meu caso, também adoto todo um ritual de higienização quando volto para casa após o expediente. A começar por, ainda no lado de fora, tirar os sapatos. Trata-se de um hábito inspirado na sábia e milenar cultura japonesa. Ao manter os sapatos do lado de fora, evitamos o ingresso, na casa, de bactérias e outras impurezas que se acumulam sob nossos pés na rua e – dizem os japoneses – ainda mantemos energias negativas afastadas do lar. Penso em manter esse rito mesmo depois que toda essa pandemia tiver acabado.

Em seguida, entro sem, praticamente, cumprimentar ninguém. Após um breve “olá, pessoal”, corro ao banheiro. Só depois do banho e já em roupas limpas é que inicio a tradicional sessão de beijos na esposa e crianças – o que, contudo, também pode ser arriscado, mas que me parece imprescindível para manter a harmonia do lar e a sanidade psicológica de todos. Pelo menos, a minha.

Dias atrás, ao voltar do trabalho, tendo cumprido todo esse ritual de limpeza, deparei-me com inesperada obra de arte no quarto da Isadora, 11 anos. Malandra, havia argumentado com a Patrícia que, durante o confinamento, com o comércio fechado, convinha economizar papel. E, com ajuda das irmãs, fez direto na parede as pinturas que, até então, vinham tomando forma apenas nas folhas de A4. Apaixonada por cães, grafitou com tinta preta exemplares das mais diversas raças, que fitam o observador com semblantes simpáticos. (No Portal Gaz você pode conferir a foto de parte da pintura – mas na falta de uma objetiva grande-angular lá em casa, não consegui focar todos os cães que se espalham pela parede.)

– O que achou pai? – Quis saber Isadora.

Por um milésimo de segundo, peguei-me a calcular quantas latas de tinta seriam necessárias para restabelecer a cor originar da parede. Mas logo tive que admitir:

– Ficou bonito mesmo. Vamos deixá-la como está.

– Que tal eu fazer outra no quarto de vocês? – Sugeriu, em tom irônico.

– Hum… vamos ver mais adiante, dependendo de quanto tempo ainda vai durar a quarentena.

Mas a Patrícia, por sua vez, logo antecipou uma exigência:

– Na sala, não!

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