Começo me desculpando com o doutor Ruy Armando Gessinger, que escreve artigos neste espaço às quintas-feiras. Vai parecer que me intrometi na pauta que o articulista abordou na semana que passou e que pretende ampliar. Mas eu tenho os meus motivos. É que nesse sábado aconteceu o reencontro anual de ex-seminaristas em Arroio do Meio, no Vale do Taquari, berço e cenário de tantas lembranças, histórias, emoções, dores – por que não? – e muitas alegrias.
Mas gostaria que este artigo não ficasse restrito ao interesse do reduzido e privilegiado núcleo de alunos que frequentou o Seminário Sagrado Coração de Jesus e o Seminário São João Batista, em Linha Santa Cruz. Eu tive esse privilégio. Ao longo de dez anos cursei o Ginásio, o Científico e saí diplomado em Filosofia. Para quem nasceu em uma propriedade rural em Quarta Linha Nova, no interior de Santa Cruz do Sul, não era pouca coisa. Mas, na época, a única possibilidade de uma graduação.
Acima de tudo, sou grato. A todos pelo acolhimento, pelos ensinamentos, pelas amizades que me oportunizaram. Em especial aos meus pais, já falecidos, que nos confiaram – primeiro a meu irmão Roque e depois a mim – a uma instituição distante e para eles desconhecida.
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Com as condições que tínhamos e a estrutura viária daqueles tempos, uma viagem a Arroio do Meio durava um dia inteiro. Saíamos de casa ainda de madrugada para chegarmos ao destino no anoitecer. Três ônibus depois, muitas náuseas, vômitos, poeira e suor, enfim nos víamos em um lugar desconhecido, apavorados, tendo que arrastar uma mala – sem rodinhas como as de hoje – com roupas, calçados e alguns suprimentos para os próximos quatro meses.
Eu sei que eram outros tempos. Mas teríamos coragem – você e eu – de embarcar nossos filhos hoje para um destino incerto, desconhecido, apenas avalizado pela fé e pela esperança de realizar um sonho?
Lembro das noites de lágrimas que encharcaram o travesseiro de saudades da família. Lembro da aflição por não ter notícias dos pais. Recordo da emoção de receber uma carta, escrita com mãos trêmulas e cansadas, mas sinceras e autênticas, carimbadas de amor. Falo disso porque no sábado revivemos – ex-colegas e amigos para sempre – o cenário do começo desta história. Com certeza, é também a história de muitas pessoas que, em algum momento da vida, deixaram tudo para trás e foram mundo afora para apostar em um sonho ou em um projeto desafiador para a vida.
Saímos do aconchego do lar – que não tinha conforto não – para dividir espaço com uma centena de guris de origens e condições sociais, étnicas e econômicas as mais diversas. Não conhecia algumas culturas, mas saí enriquecido e fortalecido com os valores que aprendi, com os conhecimentos que agreguei e com as amizades que construí para a vida. Talvez seja porque o internato é um ambiente mais marcante, impactante na vida de pré-adolescentes e adolescentes. Mas muitas pessoas, em diversas circunstâncias, situações e momentos da vida, passam pela mesma experiência.
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Convido você, leitor, a pensar sobre isso. Revisite seu passado. Não para saber apenas o que deixou para trás, mas para entender e valorizar o que construiu a partir dele.
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