Os ventos do plebiscito no Chile atravessaram os Andes e chegaram ao Brasil. O líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros, defendeu num evento jurídico um plebiscito para perguntar ao povo se está satisfeito com esta Constituição ou quer outra melhor. O que falta é uma Carta atualizada, enxuta, menos passível de interpretações de Lewandowski ou Alcolumbre. Uma Constituição que se baste e dispense interpretações. São 250 artigos, mais 95 disposições transitórias e 107 emendas em apenas 32 anos. Para a maior potência do planeta, bastam sete artigos, com 27 emendas em 230 anos.

Por aqui, uma decisão singular da ministra Cármen Lúcia, de 2013, em liminar, mexe com bilhões de reais em royalties de petróleo, e o plenário do Supremo ainda vai votar isso no próximo 3 de dezembro. E se derrubar? Vigora até hoje liminar do ministro Joaquim Barbosa, que renunciou ao Supremo em 2014, suspendendo uma emenda constitucional que cria quatro tribunais regionais federais. Um único ministro do Supremo é mais forte que o poder constituinte do Congresso. Como confiar na base jurídica e legislativa do Brasil?

A Constituição de 1988 ainda foi feita sob a ressaca do período militar. O deputado José Genuíno, um dos mais ativos constituintes, me disse, em fins de 1989, que “se soubéssemos que iria cair o Muro de Berlim, não teríamos feito esta Constituição”. O dínamo da Constituinte, Nelson Jobim, me disse que os criminosos comuns foram brindados com direitos por causa de uma “síndrome do preso político”. O constituinte Delfim Netto, um frasista, me disse que “como a saúde é direito de todos e dever do estado, quando eu tiver diarreia vou processar o governo”. A Constituição tem 166 direitos individuais e coletivos e apenas 18 deveres. Não há dever que consiga sustentar tanto direito.

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Criou uma mistura de sistema presidencial com parlamentar; sistema híbrido, portanto infértil. Detalhista, trata até do sabonete e do papel higiênico: no art. 7º, fala que o salário-mínimo tem que abranger “moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social”. Estabelece o que nem as leis cumprem: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” (art.5º, caput). Logo depois, o art.6º estabelece que “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”. Faltou dizer quem paga. O constituinte Roberto Campos disse que “o problema brasileiro nunca foi fabricar Constituições, sempre foi cumpri-las”.

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