Nossos vizinhos argentinos são referência positiva em muitas áreas: no esporte, na espiritualidade, na educação, na ciência, na cultura, na produção primária. De lá é o atual grande líder católico, o papa Francisco. Lá está também a taça da Copa do Mundo de Futebol, conquistada por Messi e seus colegas no Catar, em 2022 (e houve até uma chapoletada na Seleção Brasileira em pleno Maracanã, na última terça-feira, 21, quando a Argentina venceu por um a zero).
Aquela terra já obteve cinco prêmios Nobel, algo que o Brasil, por exemplo, nem sabe direito o que é. E nossos hermanos, como gostamos de chamá-los, são fornecedores de grãos (soja, milho, trigo) e de proteínas animais para o planeta.
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Apesar de tudo isso, só não andam vivendo um bom momento em sua realidade socioeconômica. O que, como não poderia deixar de ser, respinga no debate político. Para entender ao menos um pouco melhor um contexto que, a bem da verdade, nem os próprios argentinos sabem como se formou, um livro que acaba de ser lançado no Brasil, ¿Qué pasa, Argentina?, da jornalista Janaína Figueiredo, é leitura providencial.
O volume, de 190 páginas, foi lançado pela Globo Livros e chega em momento singular: como os brasileiros puderam acompanhar, no último domingo os argentinos elegeram novo presidente, Javier Milei, de extrema-direita, no qual, agora, depositam as esperanças da implementação de medidas que venham resgatar o País de uma das maiores recessões da história.
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Com a experiência de quem cresceu na capital argentina desde os 10 anos, quando lá foi morar, com a mãe, e ali se formou e ingressou no Jornalismo, Janaína lança mão dos conhecimentos que reuniu, em entrevistas e leituras, para detalhar os fatos mais relevantes da história do país vizinho. Mais do que lá crescer, ela casou-se com um argentino e com ele tem dois filhos, com a mesma nacionalidade. No desempenho das funções, atuou como correspondente de O Globo naquele país, e dele se deslocava para pautas em toda a América do Sul, em especial na Venezuela.
Mas é à Argentina, e a seu povo, que dedica um olhar mais atento e demorado. E, assim, busca dimensionar o que representa para essa nação o fato de, nas primeiras décadas do século 20, ter sido uma das mais pujantes economias do planeta, em condições de atrair imigrantes de várias partes do mundo, principalmente espanhóis e italianos. Apoiada na produção primária, a Argentina crescia em todas as áreas, e Buenos Aires assumia seus ares de cidade europeia no Sul da América.
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Tudo isso começou a ruir a partir da década de 40. Em parte, como reflexo da crise global de 1929, mas não só. A esse cenário aliou-se um aumento nos gastos públicos, e isso por sua vez resultou em redução drástica de confiança na política econômica. A inflação subiu, os preços tornaram-se impagáveis para a população, que ficou empobrecida, e os investimentos externos foram interrompidos.
Em paralelo, a Argentina viveu embates fortes pelo poder, o que em muitas ocasiões descambou para uma ditadura. Os golpes tornaram-se frequentes. Nos anos 40, chegou ao poder Juan Domingo Peron, que mais adiante se casaria com a jovem Eva. Esta faleceu com 33 anos, e tornou-se uma espécie de mito. O peronismo (ou o Partido Justicialista, como se denomina) desde essa época é a grande força nacional, e nem o falecimento de Perón, em 1974, diminuiu sua influência na sociedade.
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Nos dias atuais, o país convive, uma vez mais, com o caos decorrente da recessão. Ele se traduz, principalmente, na falta de perspectivas e de oportunidades de subsistência. Como frisa Janaína, a pobreza extrema engolfa 40% da população. E a autora observa que, no cotidiano, um dos esportes nacionais é o debate, em programas de rádio e de TV ou em eventos, das razões que levaram a essa derrocada. O problema, como diz, é que, além do debate sem fim, nada muda na prática.
É nesse ambiente que o novo presidente, Milei, assumirá, e das decisões dele e de seu grupo dependerão a Argentina e seu povo para estancar a crise e retomar o crescimento. Se medidas não forem tomadas, como aponta Janaína, em questão de meses o que já é dramático poderá se tornar trágico. E sem nenhum espaço para o cômico, porque isso não teria graça nenhuma. Para ninguém.
“O fracasso do país é motivo de angústia nacional. No entanto, muitos argentinos não se conformam com essa situação – até mesmo os que optaram por emigrar continuam discutindo sobre o que falhou em tantas décadas, o que fez a Argentina perder o rumo. A única coisa certa, (…) é que eles amam seu país de maneira incondicional, na mesma intensidade com que sofrem os dramas diários que implicam morar na Argentina”.
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