Uma corrida de longa distância. Um percurso repleto de obstáculos, que exige esforço e superação. Mesmo distante, quando o atleta consegue avistar a linha de chegada, experimenta a sensação de alívio pelo que está prestes a alcançar. E, então, relaxa. Essa pode ser a descrição da etapa final de uma maratona, mas da mesma forma ilustra o sentimento da população que vislumbra o fim da pandemia pela proximidade da vacina.
No entanto, essa corrida ainda não chegou ao fim por aqui. A imunização avança e traz esperança à população, mas pesquisadores apontam que os números e a dinâmica de casos das últimas semanas podem indicar uma nova onda da doença. Para o infectologista do Hospital Moinhos de Vento, Paulo Gewehr, isso é resultado do relaxamento das medidas de prevenção. “A população jovem está se expondo mais e ainda não foi vacinada. Vê a vacina chegando e acha que a pande-mia está perto do fim. Somado a isso, há o esgota-mento emocional em relação ao confinamento, as questões econômicas e a cepa brasileira P.1, que é mais transmissível e causa doença grave nos jovens”, enumera o especialista em controle de infecção e em vacinas.
O caminho para brecar a chamada “quarta onda” do coronavírus, segundo o professor Fernando Spilki, da Universidade Feevale, é acelerar a vacinação. “A pandemia não acabou, em absoluto”, reforça. Ele destaca que houve investimentos dos municípios em unidades de terapia inten-siva (UTIs), o que permite lidar com o último estágio do processo. “Deveríamos estar mais atentos ao bloqueio da transmissão, evitando novos casos”, alerta ele, que é coordenador da Rede Corona-ômica.BR-MCTI.
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Com a pandemia chegando ao seu 15o mês, o quadro da saúde mental da população também requer cuidados. “As pessoas estão exauridas emocionalmente e, ao mesmo tempo, precisando manter os protocolos. A necessidade de cuidado consigo e com os outros persiste, e a insegurança quanto ao futuro causa um aumento diário da ansiedade”, observa a psiquiatra do Hospital Moinhos de Vento, Lorena Caleffi. Na avaliação dela, o aumento crônico de ansiedade traz consequências danosas para a saúde, sobretudo por desencadear reações inflamatórias no organismo, precursoras de diversas doenças clínicas.
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Já no início da Covid-19, houve aumento na incidência de transtornos mentais: estudo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) revelou elevação de 90% nos casos de depressão, enquanto crises de ansiedade e sintomas de estresse agudo mais do que dobraram. “O prolongamento da pandemia trará mais casos dessa ordem, mas a progressão é aritmética, e não geométrica”, diz a doutora. Segundo ela, pessoas que já tinham predisposição são as que apresentarão sintomas, e quem já vinha em tratamento poderá piorar seu quadro.
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De acordo com a psiquiatra, um importante sinal de alerta para depressão é quando o indivíduo perde a vontade de realizar as tarefas que antes eram prazerosas e percebe-se triste na maior parte do tempo. “Se esse estado é associado a um fator externo, podemos estar numa situação de luto, não necessariamente em um quadro depressivo. O luto tem sido muito mais comum no período da pandemia, tanto por perdas por falecimento, como por perdas de trabalho, financeiras e de convivência”, enumera. O abuso de álcool também é potencializado no cenário atual.
Nesse contexto, buscar a saúde mental é fundamental – e isso significa muito mais do que não ter uma doença, mas levar uma vida produtiva e com relacionamentos afetivos. “Conseguimos isso prestando atenção naqueles que são importantes para nós, exercendo atividades que nos tragam bem-estar físico e psíquico”, orienta Lorena.
A especialista é otimista ao pensar no futuro da sociedade pós-pandemia. “Mesmo em pequena escala, alguma mudança positiva sempre pode advir com a experiência”, afirma. Para a psiquiatra, a crise traz a oportunidade de modificar o comportamento. “Podemos deixar de ‘fazer por fazer’ ou dizer que ‘ sempre foi assim’, repensando atitudes antes automáticas. Dessa forma, poderemos ser pessoas mais autênticas, mais em harmonia com nosso jeito de ser.
Apesar do cenário desafiador, Paulo Gewehr avalia que as cidades gaúchas estão mais preparadas. “Há mais conhecimento sobre a doença, e parte importante da população está vacinada. Temos que evoluir para o uso da máscara e higienização das mãos, além do distanciamento social, da restrição de capacidade de estabelecimentos e da fiscalização”, defende.
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Na interpretação da imunologista Cristina Bonorino, professora titular da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) e integrante dos comitês científico e clínico da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI), a sociedade ainda está no meio de uma terceira onda. A diferença em relação às anteriores é o fato de que parte da população está vacinada. “Na primeira onda, se fez isolamento. Agora, não temos isso”, destaca. A imunologista lembra que apenas o aumento do número de leitos não é o suficiente para enfrentar o quadro. É preciso ampliar o número de médicos, equipes de enfermagem, medicamentos e ventilação – além, é claro, de seguir vacinando.
“Já que o mundo está diferente, será que não temos de pensar diferente a operação dos negócios?”. A provocação de Eduardo Baltar, CEO da consultoria de gestão Merithu, faz ainda mais sentido diante do prolongamento da pandemia e da iminência de uma nova onda. Na avaliação dele, para fazer frente a esse momento, a tecnologia precisa estar inserida no contexto das organizações. Mas não basta a transformação digital: é preciso buscar a proximidade com o cliente e ter domínio da gestão. “Toda ameaça pode ser vista como oportunidade. É preciso ter visão e usar o poder mental do time, a criatividade. O que entrega resultado são os processos e como as pessoas estão organizadas”, observa.
Desde o início da pandemia, a Merithu vem monitorando os resultados de 300 empresas de capital aberto no País. O estudo da consultoria mostra que, no segundo trimestre de 2020, foi registrada uma queda de mais de 70% nos lucros. As adaptações foram feitas e, já no trimestre seguinte, houve uma clara recuperação. “E o quarto trimestre foi fantástico. Tudo isso mostra que essas companhias estão aprendendo a lidar com a pandemia”, esclarece Baltar.
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Mesmo os pequenos negócios têm muito a aprender com essa lição, segundo o consultor. Gestão, governança, inovação e controle dos números são pontos em comum de todas as organizações que se sobressaíram. “É preciso ter a gestão na mão, ter dados”, reforça. Para chegar até aqui, os gestores precisaram apertar o cinto e criar processos para atender melhor os clientes e, assim, atravessar a turbulência. “As empresas fizeram tudo isso muito rápido. Certamente temos processos a otimizar, por isso é importante olhar para dentro. O mercado está reagindo, as empresas estão reagindo e, no pós-pandemia, todos estarão mais bem preparados.”
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