Li que o tradicional Hotel Siri, em Tramandaí, está sendo demolido para dar lugar a duas torres com 18 andares. É mais um pedaço da história de milhares de famílias gaúchas tragado pelo progresso.
Apesar do bom movimento registrado no último veraneio, o Hotel Siri é resultado da sucessão familiar de seu fundador. Os herdeiros preferiram livrar-se do imóvel, amealhar um bom dinheiro e abandonar a atividade hoteleira cheia de oscilações do nosso litoral.
Passei quase 50 anos da minha vida como veranista de Tramandaí. Na minha mais tenra idade, ia ao chalé de madeira do meu avô, Bruno Kirst. A chegada à praia marcava longos dias de trabalho duro que se iniciava pela remoção das verdadeiras dunas que se formavam à entrada da residência.
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Lembro de um ano que a areia se acumulou até a altura das janelas, resultado de um inverno marcado por fortes ventos que açoitaram o litoral gaúcho e catarinense. As mulheres se dedicavam à faxina naquela casa com incontáveis quartos, uma cozinha enorme, uma sala imensa, banheiro e uma área coberta localizada nos fundos. Ali eram realizados lautos churrascos para uma legião de esfomeados parentes que acorriam ao chalé nos fins de semana.
O fim do Hotel Siri integra a recomposição da paisagem de nossas praias, além das dificuldades urbanas normais. Em Tramandaí, por exemplo, os alagamentos em dias de chuva nos fins de tarde são marca registrada. Por tratar-se de uma cidade plana, o escoamento é demorado, acarretando inúmeros contratempos e prejuízos.
Meus filhos, de 21 e 23 anos, passaram muitos veraneios em Tramandaí. Um dos programas obrigatórios à tardinha era vislumbrar o balé dos botos no Rio Tramandaí, no Imbé. A gurizada ficava excitada à espera dos golfinhos gaudérios. Até hoje, no verão, as recordações voltam, se mantêm intactas.
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A desfiguração de nossas praias tem como exemplos emblemáticos os balneários de Capão da Canoa e Torres. Nessas duas cidades, a orla é marcada por arranha-céus que constrangem a passagem dos raios solares. A explosão imobiliária, aliada à dificuldade em manter imóveis grandes e antigos, fez da beira-mar local de espigões que ocupam áreas de casas as quais outrora abrigaram várias gerações de veranistas. O desenvolvimento engole o passado na inexorável marcha da civilização.
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