Tão logo encerrado o recesso do Judiciário, o primeiro caso a ser retomado pela 1ª Vara Criminal de Santa Cruz do Sul em 2025 foi a principal investigação policial do ano passado. Foi realizada nessa quarta-feira, 8, a audiência final da instrução processual sobre o esquema de desvios de verbas, doações e cestas básicas da Associação de Auxílio aos Necessitados (Asan).
A sessão, presidida pela juíza Márcia Inês Doebber Wrasse e que durou três horas, entre 15 e 18 horas, foi marcada pelo depoimento dos três réus: Marco Antonio Almeida de Moraes, de 50 anos, que era administrador da Asan; seu filho Marco Antonio Reis de Moraes, de 24, apontado como proprietário da MA Construtora; e Vilmar de Matos, de 42, que era funcionário da MA Construtora.
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Atual presidente da Asan, Rodolfo Eidt acompanhou a audiência ao lado da advogada da entidade, Liane Modesto. Samara Dorfey fez a defesa de Marco Antonio Almeida de Moraes, que foi levado ao Fórum em escolta da Polícia Penal. O criminalista Luiz Carlos Rech defendeu Marco Antonio Reis e Vilmar, dois acusados que estão em liberdade.
Ex-titular da 1ª Promotoria de Justiça Criminal e atual chefe da Promotoria da Violência Doméstica, Flávio Eduardo de Lima Passos atuou como representante do Ministério Público (MP) no lugar de Gustavo Burgos de Oliveira, que está de férias. Apontado pela Polícia Civil e MP como o principal investigado no caso, sendo o único preso preventivamente no decorrer da apuração, Marco Antonio Almeida de Moraes negou envolvimento nas acusações que lhe foram imputadas.
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Contou que durante o pagamento dos serviços comunitários no local após ser condenado pela Justiça Federal, foi convidado pelo então presidente da entidade a assumir a coordenação do lar de idosos, que conta com 75 residentes e fica na Rua Padre Luiz Müller, Bairro Bom Jesus. “Deixei claro que o pagamento seria por nota de prestação de serviço pela empresa que era do meu filho”, comentou.
Ele admitiu que foram emitidas notas no nome de outras empresas, mas apenas para fins contábeis de baixa no caixa da Asan, uma vez que surgiam gastos esporádicos. Por exemplo, corte de grama ou cuidadores freelance de última hora nos fins de semana, que eram pagos, mas normalmente não computados porque eram registrados com recibos.
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Disse ainda que alguns valores que entraram como pagamento para a MA Construtora, a partir de empresas no modelo Microempreendedor Individual (MEI) criadas em nomes de outras pessoas, foram apropriados por ele, mas não soube mensurar o montante, e que não tinham a ver com a Asan. “Fica meu pedido de desculpas para o Marco Reis e o Vilmar pelo que eu fiz. Em momento algum eles estiveram cientes do que estava acontecendo”, disse ele.
“Ele que fez essa anarquia, ele que se vire”
Em depoimento forte, o ex-funcionário da MA Construtora e mestre-de-obras Vilmar de Matos disse que conheceu Marco Antonio Almeida quando este procurava uma equipe para trabalhar em construção. Disse que pensava ser ele o dono da empresa ligada ao setor da construção, não o filho Marco Antonio Reis, como veio a descobrir quando a investigação policial veio à tona.
Ele relatou que chegou a trabalhar na construção de um banheiro na Asan, mas em horário alternativo, sendo pago em dinheiro. Afirmou ter ouvido falar sobre Marco Antonio Almeida ser “dono” do asilo, e que ele teria chegado a ter uma escolta armada. Ainda negou as acusações sobre ter intermediado notas falsas.
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“Ninguém tem culpa de nada dessas coisas que ele fez. Só recebia o dinheiro do meu trabalho. Se eu tivesse pegado alguma coisa, eu teria um carro bom, não um velho que estou pagando parcelado. Ele que fez essa anarquia, ele que se vire”, disse.
Já em seu depoimento, o filho do principal investigado, Marco Antonio Reis de Moraes, admitiu que criou a empresa em 2020 e aceitou a proposta do pai, de usar a MEI para receber o salário de administrador da Asan.
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No entanto, quando subiu o patamar da empresa, de MEI para Limitada (Ltda.), em 2023, passou a não ter mais controle. Apenas seu pai fazia toda a gestão da MA Construtora e tinha acesso exclusivo ao aplicativo do banco, por exemplo.
Ao término da sessão, a advogada Samara Dorfey solicitou a revogação da prisão preventiva de seu Marco Antonio Almeida de Moraes, detido há exatos cem dias.
Entre os motivos elencados pela criminalista estava que, com o final da instrução, a questão da coação de testemunhas estava eliminada, pois não havia mais pessoas a serem ouvidas. Para ela, medidas cautelares poderiam ser estipuladas em vez da preventiva.
No entanto, o promotor Flávio Eduardo de Lima Passos se manifestou contra a soltura, explicando que a manutenção da prisão seria um fundamento para garantir a ordem pública. A juíza Márcia Inês Doebber Wrasse decidiu por manter a prisão do investigado, recusando o pedido da defesa. Na sequência, a sessão foi encerrada.
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Conforme a advogada Samara Dorfey declarou à Gazeta do Sul, ela irá impetrar um pedido de habeas corpus para garantir a soltura de Marco, que retornou ao Presídio Regional de Santa Cruz do Sul em escolta da Polícia Penal.
Com o final da instrução processual ontem, a Justiça irá abrir prazo para as manifestações finais da defesa e da acusação. Posteriormente, será proferida a sentença.
“Nunca falsifiquei uma assinatura”
Marco Antonio Almeida de Moraes afirmou que, se ocorreu um desvio de 500 quilos de carne, como mencionado por testemunhas, ele não ficou sabendo, e havia nutricionista e pessoas responsáveis pelo controle de alimentos. “Eu nunca falsifiquei uma assinatura. A Asan contratou um posto de trabalho junto à MA Construtora. A empresa do meu filho foi contratada, e eu fui destinado para o trabalho.”
Sobre os benefícios dos idosos, negou ter se apropriado de qualquer valor. Ressaltou que 30% do dinheiro ele nem sequer via, pois era gerenciado de forma integral por uma funcionária antiga da Asan. A respeito da acusação de querer se apropriar do valor restante de um residente falecido, Almeida disse que, em casos do tipo, segundo uma funcionária, o valor deveria ficar para a Asan, em vez de devolver para parentes que nunca iam ver os idosos.
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“Eu falei que a única forma correta para isso seria criar um fundo com o conselho administrando, não a Asan”, disse ele. Por fim, afirmou que nunca ficou com panetones pertencentes aos idosos, como apontado na investigação, e que tinha em casa apenas alguns que ganhou ou comprou.
Questionado pela juíza Márcia sobre os desvios de mantimentos da Asan para manifestações em frente ao quartel, entre novembro de 2022 e janeiro de 2023, após as eleições presidenciais, Almeida disse que havia comentários na Asan sobre o presidente ter solicitado tal destinação, mas não sabia informar se de fato isso tinha acontecido.
Sobre a emenda parlamentar do deputado federal Covatti Filho, no valor de R$ 150 mil, direcionada para aquisição de 44 aparelhos de ar-condicionado que jamais foram instalados, ele explicou que o recurso teria uma rubrica de custeio, que não permitiria aquisições de material permanente. Por isso, a compra não teria ocorrido.
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