A Polícia Civil de Santa Cruz do Sul instaurou inquérito para apurar os crimes de estelionato e apropriação indébita majorada, cometidos por uma imobiliária instalada na área central do município. Segundo a delegada Ana Luísa Aita Pippi, da 1ª Delegacia de Polícia, desde o início do mês pelo menos oito vítimas registraram ocorrência.
A maioria delas está relacionada a contratos de aluguel em que a agenciadora retirou os valores e não os repassou aos proprietários. A estimativa é de que existam mais pessoas lesadas que ainda não se manifestaram.
O nome da imobiliária, que não está registrada no Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci RS), e a identidade da corretora são mantidos em sigilo para não atrapalhar as investigações. Ainda conforme a delegada, a agenciadora está incorrendo em conduta dolosa.
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“Ela não está fazendo acordo com as vítimas e isso claramente representa sua conduta de má-fé”, afirmou. Para a polícia, os casos teriam sido registrados somente agora pelo fato de as vítimas terem primeiro tentado um acordo com a corretora.
A situação mais grave envolve a compra de um apartamento, na qual o prejuízo foi de R$ 32 mil. O caso teria acontecido em junho do ano passado, após a vítima procurar a imobiliária para adquirir o imóvel. Ela teria sido orientada pela corretora a fazer uma linha de investimento da própria imobiliária.
O valor pago seria utilizado a título de entrada e renderia juros. Passados alguns meses, sem que a compra do imóvel fosse efetivada, o cliente tentou reaver o valor com a golpista, mas sem sucesso. Uma advogada foi contratada pela vítima e tenta uma negociação. Uma denúncia também foi encaminhada para o Creci.
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A delegada orienta que as pessoas lesadas procurem a Polícia Civil. “A pessoa deve fazer um registro junto à polícia para a esfera criminal, mas isso não a isenta de procurar um advogado ou o juizado especial para a cobrança.” Afirma que nos próximos dias as vítimas serão chamadas para prestar mais esclarecimentos, assim como a suposta corretora.
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Vítimas relatam problemas recorrentes com agenciadora
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A Gazeta do Sul conversou com algumas pessoas que se dizem lesadas. Sherlen dos Santos, que alugou a sala de um prédio comercial na Rua Capitão Fernando Tatsch por intermédio da imobiliária, afirmou que, além do aluguel, pagava o seguro da loja. Segundo ela, dois meses após iniciar o funcionamento, houve um assalto no local e o prejuízo foi de R$ 5 mil.
“Ela disse que o seguro da loja era obrigatório. Logo após o assalto, entrei em contato com ela, que me enrolou. Esperamos mais alguns dias e ligamos para a seguradora, que informou que não havia recebido os valores. Apenas de uma parcela que eu mesma havia depositado direto. Ela nunca repassou o dinheiro do seguro”, disse. Além dessa situação, o proprietário da sala procurou Sherlen para saber os motivos do atraso no pagamento do aluguel.
“Ele mandou uma mensagem pedindo uma previsão de pagamento de três meses que estariam em atraso. Mandei uma foto dos comprovantes a ele”, explica. Por mês, era pago à imobiliária em torno de R$ 1,5 mil proveniente do aluguel e do seguro. A vítima disse que não registrou o caso, mas contratou um advogado.
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Em outra situação, uma mulher que também tem sala comercial locada no Centro foi procurada pelo proprietário do prédio para saber os motivos do atraso no aluguel. “Ele perguntou por que não estávamos pagando. E eu simplesmente mostrei a ele todos os boletos que eram fornecidos por ela e que estavam pagos”, disse. O aluguel mensal da sala corresponde a R$ 2 mil. Segundo a empresária, há pelo menos três meses o valor não era repassado ao dono.
Na frente do prédio onde funcionava a imobiliária, a reportagem encontrou Sérgio Pohl, de 58 anos, pedreiro. Em outubro do ano passado, ele adquiriu um imóvel por intermédio dessa empresa. O valor pago foi de R$ 90 mil. “Eu vim aqui em um dia e no outro fechei negócio. Tinha esse dinheiro na conta e queria investir em algo.”
Pohl alega que a transferência do imóvel ainda não foi feita e seus documentos continuam retidos. “Minha certidão de casamento e outros documentos estão todos na imobiliária.”
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A residência comprada fica no Bairro Pedreira e foi alugada por intermédio da imobiliária à antiga proprietária. No entanto, o pagamento do aluguel nunca foi repassado ao atual dono.
“Aluguei a casa para a mesma pessoa que me vendeu no valor de R$ 700,00. Faz dois meses que venho buscar o dinheiro do aluguel, e a imobiliária está fechada. A responsável alega que está doente, outros dizem que ela sofreu um acidente. Eu tenho todos os comprovantes de pagamentos e transferências de dinheiro que efetuei.”
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Golpe descoberto
Outro caso envolve uma publicitária de 27 anos que mantém um contrato de locação junto à imobiliária. A Gazeta do Sul conversou com a jovem e, segundo ela, o golpe foi descoberto quando ela tentava devolver o apartamento.
“Eu procurei ela, porque queria entregar o apartamento, mas ninguém atendia o telefone e a imobiliária estava sempre fechada. Fui atrás do proprietário do imóvel, que ficou surpreso ao saber que ele estava locado e afirmou que, dos seis meses de contrato, nunca tinha recebido um real da imobiliária.” Por mês, ela pagava R$ 600,00. A denúncia foi feita no Creci pela locatária e o locador.
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Sanções
O delegado regional da Delegacia da 1ª Subregião do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci-RS), Ricardo Fernando Bartz, afirma que nos últimos dias duas pessoas procuraram o órgão. Uma delas seria a vítima de estelionato que perdeu R$ 32 mil ao tentar adquirir um imóvel. A outra situação seria caso de apropriação indébita majorada. A locatária e o locador compareceram juntos para informar que os valores do aluguel não estariam sendo repassados ao proprietário.
De acordo com o delegado, as pessoas que se sentirem lesadas devem registrar uma denúncia junto ao Creci e tentar reverter a situação por meios jurídicos. “O Creci regulamenta a profissão. Então, se isso for comprovado, essa pessoa vai sofrer sanções que vão desde uma advertência simples até a cassação do registro.”
Bartz também informou que a corretora possui registro no Creci, mas a imobiliária não está inscrita no Conselho. O coordenador de fiscalização do Creci-RS, Rodrigo Cabral, afirmou que “a empresa já foi autuada três vezes por operar sem o devido registro”.
Campanha
A Sociedade das Empresas Imobiliárias de Santa Cruz do Sul (Seisc) lançará nos próximos dias campanha publicitária para alertar a população sobre os cuidados ao procurar por serviços no setor.
Conforme o vice-presidente da Seisc, Jorge Moojen, o assunto foi debatido na última reunião mensal. “As imobiliárias que são sérias, que trabalham dentro das leis e são sócias da entidade, querem se resguardar para que não caia este respingo de uma empresa ruim nas demais.”
O presidente da entidade, Flávio Bender, ressalta a importância de contratar empresas associadas à Seisc. “A nossa maior preocupação é fazer um bom trabalho e deixar a comunidade tranquila”, afirmou.