“O pessimista é um otimista bem-informado.” Emprego esse adágio com frequência por considerá-lo realista. Um ano inteiro de dor, luto, medo e disseminação generalizada de imagens de morte me levou a crer que o ser humano é uma espécie incapaz de exercer a solidariedade.
Antes de ser apedrejado, explico que se trata de uma força de expressão. Toda generalização, além de burra, é injusta. Lamento, porém, que quem deveria espalhar ao menos um pouco de esperança e de cor no breu do pavor diário se locupleta da tragédia planetária.
Os radicais de todas as ideologias, matizes e siglas continuam radicais. Ignoram a possibilidade de estarem – ao menos uma vez! – equivocados, além de desconhecer preceitos mínimos de convivência social, hoje restrita ao smartphone.
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A covardia do anonimato – um fenômeno tradicional verificado nos estádios de futebol, onde um idiota na multidão incendeia milhares – adquiriu contornos de epidemia, somada ao fenômeno digital das redes sociais, da radicalização onipresente.
Tente redigir, em qualquer plataforma/ferramenta digital, a pueril frase “eu gosto de água”. Em segundos sua “timeline” será invadida por ofensas, agressões e todo tipo de insultos. A isso se somarão, também, raros elogios, mas que, ao final dos comentários, conterão uma alfinetada ofensiva contra os detratores.
Lembram daquela insistente cobrança dos pais de outrora, e que hoje está fora de moda?
– Meu filho, vem cá. Por acaso tu esqueceu as palavrinhas mágicas?
“Bom dia”, “obrigado”, “por favor” e “desculpe”, entre outras expressões, tornaram-se sinônimo de pieguice, ingenuidade, atitude de ingênuos.
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O bombardeio das funestas estatísticas onde o índice de recuperados figura em letras miúdas nos noticiários (embora supere os 90%) deprime, entristece, endurece corações, nos faz insensíveis devido à transformação da tragédia em produto. São mercadorias da política, da grande mídia, da manipulação de informações e do não direito ao contraponto.
Empatia se transformou em um termo da moda. Assim como o mote repetido à exaustão no início da crise sanitária mundial, dirigido aos empresários: “Não demita. Vai passar”. O abre-fecha no País e no RS faz esse slogan soar uma ofensa de quem gera empregos e luta contra o aumento da miséria. Como o prezado leitor/leitora, conheço inúmeros abnegados pequenos empresários que há meses não dormem, obcecados pelo desafio de pagar os boletos, botar comida na mesa.
A ampla defesa e o direito ao contraditório estão sepultados. Ligue o rádio, a TV, leia. Todos denunciam, investigam, julgam, impõem o veredito, aplicam a pena. Triste mundo este nosso, que já clamou por liberdade. Depois de atingir esse objetivo, retrocedeu aos tempos medievais da opinião única.
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