O prestígio, a glória e os eventuais infortúnios da Áustria estão fortemente ligados à sua posição de fronteira, entre europeus ocidentais e povos eslavos. Desde a fundação, no século 4 a.C., do assentamento romano de Vindobona, atual Viena (Wien), a região passou por frequentes invasões estrangeiras.
O domínio de tribos da Baviera no século 4 determinou a língua alemã, a religião cristã e os costumes, até hoje próximos aos do sul da Alemanha. A germanização foi consolidada por Carlos Magno, que, em 794, incorporou o país ao Império Carolíngio, chamando-o de Reino do Leste (daí o nome em alemão do país, Österreich).
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Seguiram-se investidas boêmias (tchecas) e húngaras através do Vale do Rio Danúbio, até que, em 1278, Rudolf I conquistou o território e deu origem à dinastia dos Habsburgo, que duraria mais de seis séculos. Em vez de conquistar por guerras, os Habsburgo eram mestres no domínio através de casamentos, que chegaram até mesmo no Brasil. A esposa de Dom Pedro I, Maria Leopoldina, era filha de Francisco II da Áustria, o último imperador romano-germânico.
Após o domínio napoleônico, a Áustria juntou forças com a Hungria para formar o Império Austro-Húngaro, que tinha Viena como capital. O prestígio da cidade atraiu famílias ricas de toda a Europa e, com eles, vieram músicos, artistas e arquitetos que construíram o esplendor barroco da capital austríaca. Na música, Mozart, Beethoven, Haydn, Brahms, Mahler, Bruckner, Schubert e vários membros da família Strauss produziram em Viena suas obras-primas.
As origens das duas guerras mundiais também estão ligadas à Áustria. A primeira, quando a invasão austríaca de parte da Sérvia provocou o assassinato, em Sarajevo, do arquiduque austríaco Franz Ferdinand, estopim da Grande Guerra. A segunda, quando um nativo repulsivo e com um bigode ridículo contaminou a Alemanha com sua cruel insanidade, provocando outro desastroso conflito global.
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Lembro que a Áustria não se uniu permanentemente à Alemanha no século 19 graças principalmente à rivalidade com a Prússia de Otto von Bismarck (1815-1898), o arquiteto da unificação teutônica. Além disso, depois da Segunda Guerra, os aliados proibiram que os austríacos se unissem à Alemanha ocidental.
Em 1955, a Áustria se tornou uma república e catapultou seu desenvolvimento econômico, tornando-se um dos países com a melhor qualidade de vida do planeta e um dos epicentros culturais da Europa.
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Fechei os olhos por um instante diante do Hotel Sacher, nos fundos da magnífica Ópera de Viena. O local é famoso por servir a famosa Sacher Torte, inventada por Eduard Sacher (1843-1892), fundador do estabelecimento. Meu encantamento, contudo, não era pela deliciosa torta de chocolate com geleia de damasco. No aspecto gastronômico, aliás, prefiro o Wiener Schnitzel, costeleta de vitela empanada que é um dos orgulhos de Viena.
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Até o século 19, no local onde hoje está o hotel, ficava o Theater am Kärntnertor, casa de espetáculos em que Ludwig van Beethoven estreou, há exatos dois séculos, sua Nona Sinfonia. Surdo e já sofrendo dos males que tirariam sua vida três anos depois, Beethoven conduzia o andamento da exibição ao lado do maestro Michael Umlauf.
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Naquele 7 de maio de 1824, solistas e um enorme coral entoaram a letra de “Ode am Freude” (Hino à alegria), adaptação do próprio Beethoven do poema de 1785 “À Alegria”, de Friedrich von Schiller. Deixo aqui um trecho – no original e em tradução livre –, imortalizado na Sinfonia Coral.
Freude, schöner Götterfunken
Tochter aus Elysium
Wir betreten feuertrunken
Himmlische, dein Heiligtum
Deine Zauber binden wieder
Was die Mode streng geteilt
Alle Menschen werden Brüder
Wo dein sanfter Flügel weilt
Alegria, belo fulgor divino
Filha de Elísio (o paraíso)
Ébrios de fogo entramos
Em teu santuário celeste
Tua magia volta a unir
O que o costume rigorosamente dividiu
Todos os homens se tornarão irmãos
Sob a proteção de tuas asas
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O momento político mundial, por vezes, parece indicar que estamos na mão contrária da evolução. Na música de Beethoven, porém, flutua a utópica esperança de unir o que nossos hábitos, preconceitos e vícios insistem em separar. O estrondoso finale, hino oficial da União Europeia desde 1985, nos inspira, como irmãos que somos, a acreditar que, um dia, viveremos mais fraternalmente.
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