Partindo do porto de Liverpool, três horas de navegação ao noroeste me conduziram até a Ilha de Man, território insular isolado entre a Irlanda e a Grã-Bretanha. Vindos do leste, há 15 séculos, missionários irlandeses chegaram e se estabeleceram na pequena ilha. Além do cristianismo, eles traziam consigo a herança celta, identidade da nação de 48 quilômetros de comprimento por 24 quilômetros de largura. Junto com o inglês, o manês é a língua oficial. Uma das variações da família linguística celta (como o irlandês e o gaélico escocês), o idioma absorveu um tempero viking, graças às invasões nórdicas.
A Ilha de Man é hoje uma dependência da Coroa britânica, mas permanece autônoma. Na prática, os 80 mil habitantes da ilha têm moeda, sistema legal, governo e parlamento próprios, mas dependem do país de Charles III – em troca de uma taxa anual – no que se refere à defesa e à representação internacional.
Durante a invasão viking, no ano 979, foi fundado o Tynwald, o mais antigo parlamento do mundo ainda em funcionamento. Em 1099, Man se tornou parte do Reino da Noruega, até o rei Magno VI decidir vendê-la para a Escócia, em 1266. A partir daí, Escócia e Inglaterra se revezaram no domínio da nação por séculos, até ser finalmente incorporada à Coroa Britânica, em 1765. Oficialmente, porém, a ilha jamais fez parte do Reino Unido. Como prova da vanguarda local, a Ilha de Man foi um dos primeiros lugares do mundo a conceder direito de voto às mulheres, em 1881.
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Entre as várias curiosidades do território manês está a raça de gatos manx, felinos nativos da ilha que têm uma característica singular: a ausência de cauda.
Outra particularidade é a ausência de limite de velocidade fora de áreas urbanas. Eu suspeito que essa seja a causa (ou consequência) de um dos eventos anuais mais esperados do motociclismo, que acontece na ilha. A renomada corrida de rua TT (tourist trophy) ocorre nas ruas e rodovias de Man desde 1907. É considerada a prova de automobilismo mais perigosa do mundo. Em um fenômeno passional e de certa forma irracional, não se trata de se alguém morrerá durante as provas, mas sim de quantos morrerão a cada ano sobre suas potentes motocicletas. Foram 250 mortos até hoje e, na edição de 2005, velocidades de mais de 200 quilômetros por hora causaram nada menos do que 11 fatalidades. Apesar de não mais fazer parte do circuito internacional de motociclismo, o evento segue com enorme prestígio em suas várias categorias.
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Ao longo dos séculos anteriores, a economia da ilha foi alavancada pelo contrabando. Até o século 19, Man era conhecida como o paraíso dos traficantes. O status legal independente e a costa rugosa, propícia para atracar e ocultar mercadorias, facilitava o comércio ilegal de tabaco, bebidas, armas e até de pessoas. Hoje, os negócios por ali são mais legítimos, com força nos setores bancário e de tecnologia da informação.
A propósito, no topo da lista estão os sites de apostas, responsáveis por 17% do PIB. As vantagens fiscais também fazem de Man um dos locais com maior número de jatos privados registrados do mundo. Jornais noticiaram recentemente o caso do piloto de Fórmula 1 Lewis Hamilton, que registrou em Man sua aeronave Challenger 605, avaliada em R$ 140 milhões. A economia de impostos do britânico foi de R$ 27 milhões.
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Presente na bandeira, nas cédulas da libra manesa e nos monumentos da nação, o triskelion é um símbolo de origem grega trazido, provavelmente, da Sicília. Trata-se de uma forma circular com três pernas, que também se reflete no lema da nação: Quocunque Jeceris Stabit, latim para “Para onde me atirares, cairei em pé.”
Entre os filhos mais famosos da ilha, estão os irmãos Maurice, Robin e Barry Gibb, mais conhecidos como os Bee Gees. Os músicos têm uma estátua de bronze na capital, Douglas.
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Os nativos de Man fazem o possível para proteger sua língua, sua cultura e suas tradições. 52% dos residentes da ilha são estrangeiros, que quase sempre aportam em Man para usufruir dos benefícios fiscais. Alguns deles tentam mudar os hábitos locais. Para estes, os maneses têm sempre uma frase pronta, irônica e direta: “Há um barco partindo pela manhã”.
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