A capital do Reino Unido, no auge da expansão imperial britânica e como palco da revolução industrial, foi, por vários séculos, uma espécie de capital do mundo. Hoje, traços desse apogeu estão por toda parte. O que mais me atrai nesta cidade de 9 milhões de habitantes, onde se falam mais de 300 línguas, e sob a qual correm 21 rios enterrados pela atual metrópole, não são os pontos turísticos tradicionais, mas as menos conhecidas curiosidades das ruas, prédios, histórias e os quase 200 museus. Divido aqui duas delas.
A influência londrina na economia de Santa Cruz do Sul
Há alguns dias, estive com a família no Consulado Geral do Brasil em Londres, no encontro das Ruas Oxford e Bond. Em 1847, nessa mesma via, agora conhecida como New Bond Street, um cidadão britânico abriu um pequeno negócio, vendo o estabelecimento prosperar rapidamente com a venda de tabaco e cigarros de fabricação própria. Quando o proprietário faleceu, de câncer, com apenas 38 anos, a esposa Margaret e o irmão Leopold assumiram e expandiram a empresa, que mais tarde acabou sendo incorporada no outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos. O prédio da pequena loja da Bond Street número 22 não existe mais. Segue vivo, porém, o nome do fundador, o sr. Philip Morris.
Curiosamente, em 1873, ano em que Philip morreu, os ingleses William Hedges e Richard Benson fundaram outra tabacaria na mesma rua, no número 13. Na metade do século passado, deu-se a fusão da empresa Philip Morris com a Benson & Hedges. A Philip Morris é, atualmente, a maior corporação de tabaco do mundo, com valor global de mercado de 145 bilhões de dólares (2020), seguida por outra empresa derivada da companhia, o Grupo Altria, com US$ 97 bilhões, e pela British American Tobacco (BAT), com US$ 92 bilhões.
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A BAT iniciou como uma empresa americana, em 1902, com a fusão da American Tobacco Company e da inglesa Imperial Tobacco Company. Esta última ainda existe como corporação separada, chamada, hoje, de Imperial Brands, com sede em Bristol, Inglaterra. Como bem sabem os santa-cruzenses, a Souza Cruz é a subsidiária brasileira da BAT desde 1914.
“A Bandeira Estrelada”: a conexão antagônica do hino nacional americano com um antigo bar
Na esquina das ruas Strand e Arundel, próximo da Igreja de São Clemente, um bar (pub) chamado “Coroa e Âncora” era o ponto de encontro de um clube de cavalheiros chamado Sociedade Anacreôntica. Anacreonte foi um poeta grego que celebrava o vinho, a música e o amor às mulheres. Em cada reunião, os alegres beberrões entoavam com entusiasmo seu canto próprio, chamado “A Canção Anacreôntica”. Hoje, o local tem uma lanchonete com nome francês, que não serve bebidas alcoólicas, e onde ninguém canta.
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A letra do hino dos Estados Unidos é a primeira estrofe do poema “A Defesa do Forte McHenry”, escrito em 1814 pelo advogado e poeta amador Francis Scott Key. Francis testemunhou o bombardeio britânico do Forte McHenry, em Baltimore, e as palavras foram inspiradas pela enorme bandeira americana, na época com 15 estrelas e 15 listras, que seguiu tremulando até a vitória americana sobre a Grã-Bretanha na chamada Guerra de 1812. A melodia escolhida para o hino, ironicamente, foi a da Canção Anacreôntica. Ou seja, a glória e o patriotismo cantados por uma nação fundamentada no purismo religioso foram inseridos em uma melodia criada por ébrios de um clube hedonista do reino contra o qual os Estados Unidos lutavam. Para um país com tantos contrastes, o paradoxo do hino até faz algum sentido.
Há 12 anos, recebi a cidadania norte-americana em uma bela cerimônia, recheada de rituais patrióticos, e que contou com a participação, via teleconferência, do então presidente Barack Obama. Junto comigo, estavam cidadãos de dezenas de países, e alguns repetiam que aquele era o dia mais importante da vida deles. No final da solenidade, chegou a hora de cantar o hino, pela primeira vez como cidadãos do país de George Washington. Observei a emoção nos olhos marejados de todos em minha volta. Um terço da minha vida tinha sido vivida em solo estadunidense e eu estava certamente honrado com a naturalização. No momento do hino, contudo, fiquei pensando na origem daquela conhecida melodia, o que acabou tirando um pouco da emoção do momento. A ignorância, por vezes, pode ser uma bênção.
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