Cultura e Lazer

Pelo mundo: riqueza e tradição no país da Copa do Mundo

Na aproximação para o pouso em Doha, uma jovem ao meu lado levanta-se para ir ao banheiro. Com longos e bem cuidados cabelos, veste calça jeans e camiseta. Poucos minutos depois, senta-se novamente e tudo o que se vê dela são os olhos, coberta pela Abaya, vestimenta feminina tradicional do Catar, e o Niqab, véu que cobre a face. A transformação não é só na roupa. Estamos pousando em uma monarquia absolutista, onde o código detalhado de conduta islâmica, a Sharia, é a principal fonte da constituição. Estive no Catar duas vezes, a trabalho. Foram passagens curtas, porém marcantes, neste país que se tornou independente da Grã-Bretanha em 1971.

Chamou-me a atenção a quantidade de estrangeiros, quase 90% da população de 2,8 milhões de habitantes. O estilo de vida é semelhante ao dos Emirados Árabes Unidos, porém com menos ostentação, com uma pitada levemente maior de liberalismo, mais direitos e voto para mulheres, maior liberdade de imprensa, relativa liberdade de religião e a lei, ainda que baseada na Sharia, um pouco mais flexível do que na maioria dos países da região. Não é à toa que a rede de televisão Al Jazeera escolheu o Catar como sede. Pela relativa vanguarda, o país não é muito bem-visto pelos países islâmicos mais conservadores. Contudo, é melhor não se deixar iludir com o relativo liberalismo. A lei local ainda prevê chicotadas e apedrejamento para certos crimes, e o homossexualismo pode ser punido com a pena de morte.

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A maioria dos estrangeiros que vivem no Catar são trabalhadores de baixa escolaridade, que procuram oportunidades melhores do que nos países de origem. Quase todos são do Nepal, das Filipinas e de Bangladesh, e há mais nepaleses do que cataris no país. Existe, obviamente, uma divisão clara e brutal entre a classe mais abastada e a vasta massa de trabalhadores, o que fica claro já no aeroporto. Passageiros que viajam em classe executiva e primeira classe desembarcam em um luxuoso terminal, enquanto os demais se dirigem a outro terminal, separadamente.

Museu de Arte Islâmica guarda uma rica coleção de artefatos religiosos
Centro Cultural Islâmico, marco de Doha

Caminhei bastante pela capital Doha, que concentra mais de 90% da população do país. Visitei o então recém-inaugurado, moderno e rico Museu de Arte Islâmica. Projetado pelo arquiteto chinês Ming Pei e inaugurado em 2008, foi construído baseado em formas geométricas inspiradas no mundo muçulmano. O agradável Corniche, promenade ao longo da baía de Doha, oferece mais de sete quilômetros de calçadas e jardins, irrigados pela água dessalinizada do Golfo Pérsico.

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Mercado árabe proporciona artesanato, bons restaurantes e ótimas conversas | Foto: Acervo Pessoal

O tradicional Mercado Árabe (Souq Waqif) é uma experiência sempre interessante, com variados artigos do artesanato local, tecidos, especiarias e ótimos restaurantes. No Catar, a comida árabe tem forte influência da cozinha indiana e iraniana, deixando-a ainda mais rica em sabores. Nos restaurantes mais típicos, a comida é saboreada sem talheres, usando o próprio pão (shawarma ou pita) ou as mãos como colher, em grandes pratos, servidos no centro da mesa. Seguem-se sobremesas excelentes, quase sempre preparadas com tâmaras, mel e pistache. Em alguns restaurantes, observei os funcionários prepararem uma espécie de biombo ao redor da mesa para as mulheres, que podem então levantar os véus e comer com privacidade.

No Catar, como nos Emirados Árabes, além do pesado investimento estatal, há muito capital estrangeiro, por vezes na forma de cidades inteiras no meio do deserto, com infraestrutura completa, e aguardando um único complemento: os habitantes. A fonte desses recursos, muitas vezes vindos da Rússia ou China, não é questionada pelo governo, e deixa uma ponta de dúvida com relação à legalidade da origem do dinheiro.

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Em uma mistura de mesquitas, construções tradicionais e modernos arranha-céus no vasto distrito de negócios de Doha, os contrastes são os mesmos que vi em outros países da região do golfo. Há, obviamente, muita riqueza nesse país península, assentado sobre a terceira maior reserva de gás natural do mundo. Estrangeiros trabalham arduamente na construção civil e no setor de serviços básicos, com salários relativamente baixos e poucos direitos trabalhistas. No final de 2022, quando os torcedores sentarem nos modernos, confortáveis e climatizados estádios que estão sendo construídos para a próxima Copa do Mundo, seria bom lembrar, ao menos por um instante, que ali estão cimentados sangue e suor de muitos trabalhadores de regiões pobres do planeta, que, nem sempre, estavam ali por pura opção.

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Heloísa Corrêa

Heloisa Corrêa nasceu em 9 de junho de 1993, em Candelária, no Rio Grande do Sul. Tem formação técnica em magistério e graduação em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. Trabalha em redações jornalísticas desde 2013, passando por cargos como estagiária, repórter e coordenadora de redação. Entre 2018 e 2019, teve experiência com Marketing de Conteúdo. Desde 2021, trabalha na Gazeta Grupo de Comunicações, com foco no Portal Gaz. Nessa unidade, desde fevereiro de 2023, atua como editora-executiva.

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