A estátua de France Preseren (1800-1849) está no local de maior destaque da principal praça de Liubliana. Acima do poeta esloveno, sua platônica musa parece seguir inspirando o conjunto de bronze. Respiro aliviado quando uma cidade homenageia um poeta em vez de algum pseudo-herói militar ou político. São detalhes como esse que mostram por que a Eslovênia é considerada um oásis para a mente e o espírito. Preseren foi um brilhante poeta lírico com uma vida quase sempre tomada por agonia e perplexidade, sentimentos transformados em uma magnífica obra poética.
A pequena e montanhosa nação entre os países bálticos e a Europa Central foi ocupada por tribos eslavas no século 6. Cristianizados décadas depois, foram dominados por mil anos pelos Francos e por sua sucessão germânica, o Sacro Império Romano, até a chegada dos Habsburgos, austríacos que governaram a região de meados do século 14 até 1918.
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A união com a Iugoslávia aconteceu no final da Primeira Guerra, inicialmente como parte de um reinado seguido pela República Federal Socialista da Iugoslávia, criada durante a Segunda Guerra Mundial. Apesar da destruição trazida por nazistas e fascistas, a proximidade com o ocidente (Itália e Áustria) e a marcante identidade nacional contribuíram para tornar a Eslovênia a mais pujante das repúblicas iugoslavas sob a batuta de Josip Broz Tito, um filho de uma eslovena com um croata.
A independência veio em junho de 1991. Em poucos anos, o país obteve grandes avanços econômicos, com saudável equilíbrio entre os campos liberal e progressista. Até hoje, a Eslovênia segue sendo o país eslavo com maior PIB per capita, o que facilitou a rápida adesão à Comunidade Europeia e à Otan.
320 mil dos 2,1 milhões de habitantes do país estão na capital, Liubliana. Liubliana quer dizer “a amada”, termo que combina com os belos monumentos barrocos, as fachadas Art-Nouveau e as charmosas pontes sobre o Rio Liublianica, que atravessa a cidade.
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O templo mais famoso do país, com 65% de católicos, é a rosada Igreja Franciscana da Anunciação (século 17). Originalmente vermelha, a fachada desbotou naturalmente até assumir o rosa-salmão atual, adotado como cor definitiva.
O símbolo da cidade, o dragão, está em todos os lugares. A ponte Zmajsky Most (ponte do dragão) representa a lenda da fundação de Liubliana pelo grego Jasão, que teria domesticado ali a mítica criatura. Para admirar a melhor vista da cidade e da belíssima região, vale a escalada até o Castelo de Liubliana, fortificação de estilos gótico e romanesco que cresceu com a cidade.
Antes de deixar a capital, eu não poderia deixar de visitar meu lugar preferido em todas as cidades eslavas: o Mercado Público. O imperdível labirinto de cultura e tradição traz pelo menos uma inovação curiosa. Uma máquina automática fornece leite in natura refrigerado. Basta levar o próprio galão, depositar a moeda local (Euro) e observar a “ordenha” eletrônica em ação.
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Migrações e xenofobia seletiva
Uma filha da Eslovênia retorna agora às manchetes globais, embora eu não tenha sentido grande orgulho em seus conterrâneos. Melanija Knavs, hoje Melania Trump, tornou-se a primeira esposa estrangeira de um presidente americano. Paradoxalmente, aquele que quer defenestrar os imigrantes dos Estados Unidos é filho de uma imigrante escocesa, casado com uma eslovena, divorciado de uma tcheca e adotou, recentemente, um bilionário sul-africano como fiel escudeiro.
Não é sua única incoerência. Como outros líderes conservadores populistas da atualidade, o próximo ocupante da Casa Branca porta a cruz cristã como amuleto demagógico. Deve ter esquecido que a mesma cruz se tornou símbolo religioso ao ser carregada em Jerusalém por um imigrante galileu, pobre, revolucionário e condenado à morte.
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Contrastando com as cenas dos presépios, o menino do Oriente Médio que nasceu em uma estrebaria veio ao mundo em ambiente de medo e violência, e logo precisou se refugiar em um país vizinho para não ser morto. Passados dois mil anos, crises de refugiados políticos e econômicos seguem pelo planeta. O nascimento de Jesus nos chama a reconhecer a presença divina em todas as pessoas, em especial nas que buscam dignidade e sobrevivência, dentro ou além de suas fronteiras.
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