Para uma parte significativa dos alemães que zarparam para o Novo Mundo, as últimas imagens na terra natal incluíram a cidade portuária de Hamburgo – oficialmente, Cidade Livre e Hanseática de Hamburgo –, uma das três cidades-estado do país. Encravada entre os estados de Schleswig-Holstein e da Baixa Saxônia, a cidade de Felix Mendelssohn, Helmut Schmidt e Angela Merkel deve grande parte de sua riqueza ao portentoso Elba, rio que liga o maior porto do país, o terceiro da Europa, ao Mar do Norte, distante 109 km a noroeste. Um navio que deixa o porto ainda precisa navegar por horas até desembocar nos mares do mundo.
No período em que morei em Bremem, outra cidade-estado alemã e igualmente um dos portos de partida para muitos emigrantes, Hamburgo era destino frequente nos finais de semana, com pouco mais de uma hora de viagem entre as duas cidades hanseáticas. A saudação usada pelos 1,8 milhão de habitantes da segunda maior cidade da Alemanha, em vez dos formais Guten Morgen, Guten Abend ou Guten Tag, se resume a um simpático “moin”, que funciona em qualquer hora do dia e serve até para dizer “tchau”.
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A segunda maior cidade da Alemanha tem um espírito peculiar, com calor humano bem acima da média para o norte do país de Goethe, e não foi à toa ter sido escolhida pelos Beatles para se desenvolverem musicalmente e alavancarem a meteórica carreira. John Lennon chegou a dizer “nasci em Liverpool, mas fui criado em Hamburgo”.
O panorama cultural agrada a todos os gostos e desejos, desde a monumental e recém-inaugurada sala de concertos Elbphilarmonie, passando pela música de todos os estilos tocada nos bares do bairro St. Pauli, até a cena pouco ortodoxa da “milha do pecado” (sündigste Meile), como é conhecida a Rua Reeperbahn. Na via paralela, Herbertstrasse, é vetada a presença de mulheres e crianças, e (quase) tudo é permitido. A experiência, no mínimo antropológica, pode não ser recomendável para todos. Longe dali, crianças e adultos ficam maravilhados com o Miniatur Wunderland, um mundo em miniatura que inclui cidades, um aeroporto, cadeias de montanhas, um vulcão em erupção e incríveis 15,4 quilômetros de miniferrovias, além de mais de 250 mil diminutos habitantes.
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Arrasada durante a Segunda Guerra Mundial, o que vemos hoje é resultado de uma intensa reconstrução nas últimas décadas. Apesar disso, a cidade soube conservar a tradição na cidade antiga (Altstadt), onde estão a belíssima e enorme sede do governo local (Rathaus), a magnífica igreja de São Miguel e boa parte das mais de 2 mil pontes, mais do que qualquer outra cidade do planeta. Fora do centro antigo, a natureza em torno dos lagos artificiais de Alster e os jardins de Planten un Blomen são cenários perfeitos para caminhadas e reflexões. Chama a atenção também o bairro Speicherstadt, complexo de depósitos construídos sobre as águas do Elba no fim do século 19, agora revitalizado e tombado pela Unesco.
Além das pontes físicas, encontrei na região exemplos de elo harmônico entre povos de diferentes origens. Na região de fronteira de Schleswig-Holstein, território dinamarquês e austríaco até a Guerra Austro-prussiana de 1866, povos nativos de origem dinamarquesa (10% da população) têm representatividade no governo, com partido político, escolas, clubes culturais e museus dedicados à minoria étnica. Do lado dinamarquês, habitantes de origem germânica têm as mesmas garantias.
A longevidade política e a influência global de Angela Merkel, antiga chanceler e líder de fato da Comunidade Europeia, em ações de pacificação e harmonia entre as nações, deve ter sido influenciada pelo espírito integrador da cidade e da região em que nasceu. Fica como inspiração para o Brasil, que, do chamado descobrimento até hoje, despreza e negligencia os verdadeiros donos da terra. Outro exemplo sensacional são as pequenas bibliotecas instaladas dentro de centenas de ônibus coletivos, onde adultos e crianças retiram e devolvem livros constantemente.
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Na saída do porto de Hamburgo, o chamado Willkomm-Höft (Ponto de Boas-vindas) é o local onde cada navio é saudado com a bandeira e o hino do país de origem da embarcação. A tradição não existia na época do êxodo alemão para as Américas, mas, na alma de muitos retirantes, além da expectativa de partir para o desconhecido, havia, quem sabe, a esperança de um dia receber a saudação de retorno e poder pisar mais uma vez na Heimatland.
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