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Pelo direito de não ser

Ligo a TV na hora das notícias. No destaque, a ação da Polícia Federal em torno do vereador Carlos Bolsonaro, do Rio. O filho do ex-presidente é apontado como um dos principais envolvidos nas espionagens efetuadas pela Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, durante o governo de Jair Bolsonaro. É o babado da vez. A agência, criada por Fernando Henrique Cardoso, é um órgão da presidência da República. Mas não poderia ser usada para monitorar adversários políticos, como dizem que ocorreu.

Na mesma noite, olho Instagram, Facebook e Twitter. Petistas e simpatizantes comemoram a nova bomba. E na mesma medida, bolsonaristas e simpatizantes inundam as redes assegurando que se trata, mais uma vez, de mentiras com o objetivo de legitimar o Planalto com apoio da Globo e do Supremo Tribunal Federal. É um tal de “comunista” pra cá, “facista” pra lá, “ladrão” ali, “cérebro de minhoca” adiante, “corrupto”, “racista”, “extrema-direita”, “extrema-esquerda”…

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Estou bem cansada disso. E a probabilidade de esse clima se agravar no futuro me faz desejar estar longe em 2026. Ir pra Islândia, por exemplo. E sem internet. Porque se tiver um jeitinho de acessar, vou acabar acompanhando. Essa rede é absurdamente viciante. O que mais assusta é que nesta ilimitada troca de acusações tem sobrado pouco espaço para a dúvida. Quem está de um lado tem certeza que o outro é culpado por tudo que há de errado no Brasil. Quem é do outro, pensa exatamente igual. Só que na direção contrária.

Estamos nessa toada há tempos. Sem perspectivas. Vivenciamos na política e em todos os seus desdobramentos uma prática desumanizante, encarceradora. Que nos transforma em doutrina, em preto ou branco, bom ou mau, amigo ou inimigo, luz e sombra, verdade ou mentira. Ocorre que não somos doutrina. Não somos ideologia. Somos pessoas. Carne, osso, sangue e sentimentos. Somos plurais, complexos, avançados em alguns aspectos, conservadores em outros. Ora preconceituosos, ainda que neguemos publicamente, ora libertários.

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Temos que recuperar o direito a nossa humanidade. A nossas contradições. Sem apanharmos por isso. Você se acha de esquerda, mas é a favor do lucro? Pode. De direita, mas contra o liberalismo econômico? Pode, ora bolas. Ninguém precisa fechar questão com um lado a não ser na hora do voto. Ou nem isso. Temos direito de praticar a dúvida, o ceticismo, a paixão e a compaixão. Tudo junto, que daí fica melhor.

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Guilherme Bica

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