A cerimônia de premiação do 4º Festival Santa Cruz de Cinema esteve à altura das demais noites de um evento tão potente em seu conteúdo e acolhedor a cada momento: além dos prêmios (sobre os quais me alongo a seguir), tivemos números musicais, homenagens afetuosas e belas aos atores Ítala Nandi e Matheus Nachtergaele e ao ilustrador José Luiz Benício, ouvimos ainda discursos que sublinham a estreita relação entre o evento e a comunidade – que é o combustível para que este venha se tornando um dos festivais de cinema mais interessantes e queridos do circuito nacional –, por meio da renovação dos compromissos de patrocinadores e do poder público.
Quanto aos prêmios, pode-se dizer que o júri (formado pelas produtoras Sofia Ferreira e Priscila Guerra e pelo professor Pedro Garcia) tenha valorizado tanto o mérito estético e criativo quanto também encontrado caminhos no reconhecimento à diversidade das obras em competição. O grande vencedor da noite foi o pernambucano Inabitável, dirigido por Matheus Farias e Enock Carvalho, vencedor em quatro categorias: Melhor Roteiro, Melhor Direção (ambos para Farias e Carvalho) e Melhor Filme segundo o Júri Popular Presencial e o Júri Oficial.
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Aniversariante dessa sexta-feira, Enock terá a árdua tarefa de transportar tantas belas Tipuanas produzidas por Rudinei Kopp para o Recife. Sua fala foi intensa e comovente, lembrando, a partir da temática do curta, da violência sofrida por travestis e transsexuais no Brasil, país que continua sendo o que mais mata essa população no planeta; numa triste coincidência, a personagem principal do filme, chamada Roberta do Nascimento, teve seu nome reproduzido nas páginas dos jornais em fevereiro, sem relação direta com a obra: uma travesti do Recife, em situação de rua, homônima à personagem ficcional, foi brutalmente assassinada; ela dará nome a uma nova casa de acolhimento. Emocionado, Enock diz torcer para que não seja necessário que outras pessoas sejam mortas para que se tomem atitudes com relação a essa carnificina. Enquanto esse mundo melhor não vem, o cinema é que se torna uma fenda na realidade, na busca de uma realidade menos inabitável.
Em outras categorias, a distribuição de prêmios foi mais heterogênea: o árduo trabalho de articulação de ideias e imagens de arquivo na construção narrativa de Ser Feliz no Vão rendeu o prêmio de Melhor Montagem ao montador e diretor Lucas H. Rossi dos Santos. A impressionante qualidade técnica da animação Stone Heart, por sua vez, foi reconhecida por meio do prêmio de direção de arte – também atribuído ao próprio diretor da obra, Humberto Rodrigues. Mais um diretor acabou premiado numa categoria técnica: Marcus Curvelo, cujo sensível e suave preto-e-branco no curta A Destruição do Planeta Live mereceu o prêmio de Melhor Direção de Fotografia.
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Nas categorias de atuação, o baiano Leandro Villa, de Fica Bem, ganhou o prêmio por sua passagem da comédia para o drama intimista, além de uma presença cênica marcante; a atriz e diretora Gabriela Lamas, de Eu Não Sou um Robô, garantiu a permanência de uma Tipuana da Mostra Nacional no Rio Grande do Sul – o curta ainda ganharia, com imenso mérito, mais uma estatueta: a de Melhor Filme Gaúcho. O outro prêmio para o cinema gaúcho foi para o rapper baiano Baco Exu do Blues, por sua música em Desvirtude, dirigido por Gautier Lee. O prêmio de Melhor Desenho de Som ficou com Caio Vasconcelos, pelo frenético e intenso Copacabana-Madureira, e o Júri Popular Online comoveu-se com a história da comunidade de plantadores de cacau retratada em Dois Riachões: Cacau e Liberdade. Na Mostra Olhares Daqui, foi reconhecida a mise-en-scène e a qualidade dos diálogos de Não Há Ninguém Perto de Você, dirigido por Victor Castilhos – que, generosamente, dedicou o prêmio aos demais integrantes da Mostra, que demonstra o potencial do cinema que vem sendo realizado nessa Santa Cruz do Sul que tanto acolhe, valoriza e aprecia o cinema brasileiro, gaúcho e santa-cruzense.
Pedro Guindani é produtor, roteirista e diretor em cinema e televisão.
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