A notícia de que parentes de vereadores em Santa Cruz do Sul vêm sendo nomeados para cargos em comissão na Prefeitura este ano reacendeu o debate sobre nepotismo na administração pública. Mas afinal, existe ou não irregularidade nessa situação?
Embora uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) vede a indicação de familiares de agentes públicos para funções de confiança, especialistas têm interpretações distintas a respeito da extensão dessa proibição. E o passado recente mostra que não há mesmo clareza quanto ao assunto. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a esposa do governador José Ivo Sartori (PMDB), Maria Helena, possui status de secretária desde 2015. Já no Rio de Janeiro, o prefeito Marcelo Crivella (PRB) teve suspensa a nomeação do filho para o cargo de secretário da Casa Civil em fevereiro.
Em Santa Cruz, dos dez vereadores que integram a base governista na Câmara, pelo menos três têm parentes que foram empregados em cargos de segundo e terceiro escalão na Prefeitura desde janeiro, incluindo filho e esposa.
No entendimento do professor titular de Direito Constitucional da Ufrgs e da FMP, Eduardo Carrion, nomeações como essas são “flagrantemente inconstitucionais”. “Cabe examinar cada caso, mas a súmula do STF já dirimiu eventuais dúvidas. Essa repartição de cargos públicos entre amigos e parentes, muitas vezes sem qualificação, desmerece a cidade”, alegou.
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Na mesma linha, para o advogado e coordenador do curso de Direito da Unisc, Edison Botelho, a regra é clara: não se pode nomear parentes em linha reta ou colateral, independente do poder. Quando isso acontece, afirma ele, configura uma agressão a um dos princípios básicos da Constituição, o da impessoalidade. “O poder público é um só, Executivo ou Legislativo. E se há parentes, há um ilícito. Quem concorre, sabe que existe esse limitador”, disse.
Já segundo outra professora de Direito da Unisc, Caroline Bittencourt, o indicativo que o Supremo Tribunal Federal vem utilizando para definir se há ou não o nepotismo é a chamada “designação recíproca”, ou seja, a “troca” de uma nomeação de um parente por outra. “Fato é que o Poder Judiciário tem analisado caso a caso e seguidamente inovado no debate sobre a configuração das hipóteses de nepotismo no cenário político brasileiro”, acrescentou.
ENTENDA
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1 O que é nepotismo?
É a prática pela qual um agente público usa de sua posição de poder para nomear, contratar ou favorecer parentes, em linha reta ou colateral, sejam por vínculo da consanguinidade ou da afinidade. A proibição é prevista na Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, que abarca todos os órgãos e entidades que compõem a administração pública, tanto federal quanto estadual e municipal.
2 O que é nepotismo direto e cruzado?
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Nepotismo direto é quando uma autoridade (um prefeito, por exemplo) nomeia seu próprio parente para um cargo. Nepotismo cruzado é quando uma autoridade nomeia parente de outra e vice-versa, configurando uma troca de favores entre elas. Ambas as situações são vedadas.
3 Existem exceções na regra?
A súmula prevê que a vedação não se aplica a cargos de natureza política, o que inclui ministros e secretários municipais e de Estado. Assim, estariam abrangidos pela regra apenas cargos de chefia, assessoramento e direção. Algumas decisões recentes, porém, consideram que nomeações fundadas apenas no grau de parentesco violam o interesse público, independente do cargo. É o que se discute no caso do prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella.
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O QUE DIZEM
CÂMARA DE VEREADORES
Para o presidente Paulo Lersch (PT), independente de um eventual parentesco, o que deve ser priorizado na nomeação de cargos de confiança é a qualificação. Ele alegou ainda que indicações de parentes são situações que sempre aconteceram no serviço público. “Essa acomodação política sempre existiu e sempre vai existir. Se a pessoa é ou não parente, cabe a quem nomeou ver. Mas se a pessoa é competente e faz um bom trabalho, qual o problema?”, questionou.
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PREFEITURA
Por intermédio da Secretaria Municipal de Comunicação, a Prefeitura informou que não comenta nomeações de cargos em comissão.
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