Cultura e Lazer

Para um herói do mundo real: escritora santa-cruzense lança livro neste sábado

O novo livro da escritora santa-cruzense Kethlin Nadine Meurer, Meu pai é um herói, a ser lançado neste sábado, a partir das 15 horas, no Quiero Café, em Santa Cruz do Sul, descortina olhar afetuoso, sereno e sábio sobre a vida. O título já deixa entrever o tema, mas o leitor se depara, além da homenagem enunciada, com declaração de amor revestida de saudade e reconhecimento pelos ensinamentos que o narrador recebeu e carrega consigo.

E esse narrador, ainda que a autora seja uma jovem jornalista, é um menino. O Antônio, que conta a história, é uma espécie de alter-ego da autora. Ele lida com profunda e irremediável perda, mas também explicita que seu pai José e sua mãe Joana foram os melhores exemplos que ele poderia ter tido em sua formação.

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Exatamente o que faria a própria Kethlin. Quem teve a oportunidade de testemunhar a relação dela com seus pais, Gerson e Silvane, saberá bem o quanto eram unidos e parceiros em cada instante. Iluminavam, os três, o ambiente no qual estivessem. No dia 13 de julho de 2016, Gerson recebeu visita inesperada no posto de gasolina que a família administrava e junto ao qual moravam: assaltantes. Ele foi baleado e não resistiu. A filha, que estava em casa, viu a cena.

Seria impossível que uma vivência tão dramática não a marcasse para sempre, e não levasse a reelaborar o sentido da existência. Em Meu pai é um herói, tem-se uma filha que, tendo assimilado uma ausência, faz a contabilidade dos ganhos na convivência com o pai e a mãe. E compartilha esse legado, humano e intenso, conosco.

Uma autora madura com a alma leve de menina

Em grande medida, Meu pai é um herói dá sequência ao tom de conversa ou de filosofia e reflexão que Kethlin Meurer adotara em seu livro de estreia, o volume de crônicas Todos somos gigantes, lançado em 2019 pela editora Catarse. Naquela ocasião, reunira textos que já escrevia desde a adolescência, parcela dos quais gestados quando ainda pudera conviver com o pai, Gerson, evidenciando conversas e ensinamentos.

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Agora, em Meu pai é um herói, o olhar e o sorriso afetuoso de Gerson pairam como uma presença sutil, a cada vez que o pequeno Antônio, o narrador, detalha suas próprias vivências com seu pai, José, um torneiro mecânico que decide empreender na área para a qual é vocacionado. Entre um livro e outro, a própria Kethlin amadureceu. E em parte pela necessidade de elaborar a enorme perda, impossível de preencher. Seu olhar é sereno, sábio, filosófico, existencial. Na vida real, formou-se em Jornalismo pela Unisc, em 2021, e prosseguiu com um pós em Escrita Criativa e Copyright. Ela e a mãe deixaram a Linha Nova, na qual residiam; a mãe fixou-se na cidade de Santa Cruz e Kethlin na Linha Pinheiral, com o companheiro Régis Hermes, engenheiro agrícola e produtor rural.

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Profissionalmente, depois de passagem por redação de jornal, hoje presta assessoria em comunicação social e gerencia redes sociais para clientes. Em 2023, começou a elaborar os textos de Meu pai é um herói, que agora sai sob o selo da editora Vírtua, de Caxias do Sul, em 100 páginas. É a Kethlin caminhando com passos firmes e serenos na vida adulta, mas com a elogiável alma leve de menina sorridente.

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Serviço

  • o quê: lançamento do livro Meu pai é um herói, da jornalista e escritora santa-cruzense Kethlin Meurer, sob o selo da editora Vírtua
  • quando: neste sábado, a partir das 15 horas
  • onde: no Quiero Café, na Rua Thomaz Flores, 526
  • para adquirir: exemplares estarão à venda no local, ao valor de R$ 40,00; posteriormente, o livro poderá ser adquirido em livrarias ou com a própria autora.

Sobre ser filha de um herói

O pai da jornalista e escritora Kethlin Nadine Meurer, Gerson Artur Meurer, morreu assassinado durante uma tentativa de assalto ao posto de combustíveis do qual a família era proprietária, em Linha Nova, em julho de 2016. A filha, então ainda estudante de Jornalismo, presenciou a cena e incumbiu-se de agilizar a busca por socorro, logo após o ocorrido. Quase oito anos passados desde aquele fatídico dia, e agora já em atuação na Comunicação Social, Kethlin encontra na literatura uma forma de elaborar e sistematizar a ausência do pai amado, e de eternizar as memórias e o legado que ele deixou. A arte a ajuda a seguir adiante.

Em seu novo livro, Meu pai é um herói, uma das palavras recorrentes (e, com a palavra, o conceito e seus significados) é “marca”. O narrador, o menino Antônio, ressalta a importância dos valores humanos, éticos, que o pai (os pais, porque igualmente enfatiza a presença acalentadora da mãe) lhe deixou, como guia de conduta e de princípios para a vida.

E o jornalista Guilherme Bica, editor do Portal Gaz e amigo de longa data de Kethlin, da qual foi colega de trabalho, aponta um outro legado de Gerson, e que se encarrega de projetar para o futuro a sua forma de ser e agir. “No caso dele, deixou mais do que marcas; na verdade, deixou uma filha que é o seu espelho”, menciona Bica, na primeira das abas de capa do livro.

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E, de fato, o novo livro de Kethlin promove inúmeras reflexões, providenciais e salutares no mundo de hoje. Faz pensar sobre o papel (os papéis) que podem ou até devem cumprir os pais (no caso de sua obra, focando o exemplo do pai, já ausente). Faz pensar sobre o que torna um pai um herói, no mundo atual, no mundo real, tão amplamente dominado pelas virtualidades, pelo digital.

Mas se o livro é sobre um pai herói, é também sobre ser filha de um herói. E, nesse caso, o que sobressai da leitura é a constatação: filha de herói, heroína é. Pela simples razão de que assimilar tamanha perda, reerguer-se e seguir em frente, com dignidade, olhar sereno e sorriso no rosto, não é para todos. É para quem é filha de herói.

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Novo livro é também uma homenagem de Kethlin Meurer ao pai, que foi assassinado | Foto: Rafaelly Machado

Entrevista

Magazine – Teu novo livro apresenta-se como um romance. É uma obra de ficção que se estrutura, também, a partir de memórias pessoais, isso?

Isso mesmo. Trago neste livro algumas situações que vivi, outras que criei e adaptei. O livro não é uma autobiografia. Minha intenção é tocar o coração das pessoas, fazer com que reflitam sobre perdas, sobre o que verdadeiramente importa e faz sentido. Aprendi muitas coisas com o meu falecido pai. No livro, busco passar alguns desses ensinamentos que tive para também, de alguma forma, marcar as pessoas da mesma maneira que meu pai tanto marcou a minha vida. A Joana, esposa do José e mãe do Antônio, também é citada em diversas páginas do livro e traz características marcantes.

Por que escrever (e por que escrever esse livro) é tão importante para ti?

Escrever me faz bem. Sempre gostei muito de escrever. Por natureza já sou muito comunicativa, mas é na escrita que, na maioria das vezes, eu coloco para fora sentimentos que existem em mim. E poder escrever sobre o que aprendi com o meu pai é extremamente gratificante. Eu só desejo que as pessoas tenham um pai, uma mãe ou outro ser humano que sirva de inspiração assim como o meu pai foi para mim.

Qual a tua expectativa em relação à forma como os leitores receberão esse novo livro, ou o que gostarias de propor a eles, em termos de leitura?

Se as pessoas sentirem um pouco da emoção que senti quando escrevi cada página deste livro, eu vou ficar imensamente feliz. Espero que o livro provoque uma reflexão na vida das pessoas e que contribua, de alguma forma, para que elas se tornem seres humanos ainda melhores. A vida é curta demais e é por isso que precisamos viver o hoje, amar hoje e aproveitar cada momento, porque o amanhã nem sabemos se vai chegar.

O personagem central (e narrador) de teu livro é um menino. Como foi o desafio de narrar a história (e olhar o mundo) sob o ponto de vista de um menino?

Como o livro traz algumas coisas que vivi, quis adaptar algumas situações e acabei escolhendo um personagem masculino. Apesar de eu ter 28 anos, sinto que para algumas situações da vida eu ainda carrego o olhar de uma menina cheia de sonhos, esperança e que às vezes acredita e confia muito na bondade das pessoas, sendo que nem todas as pessoas são tão boas assim. É por eu ainda carregar um pouco da essência de uma menina, que não se tornou tão difícil narrar em primeira pessoa e sob o olhar de um menino. Cresci, amadureci, tenho muito o que aprender. Errei, mas também aprendi. Estamos em constante evolução o tempo todo. Mas, para o meu pai e minha mãe, eu sei que serei para sempre uma garotinha.

Destaco uma frase de teu livro: “Meu pai não só me ensinou e ensinou minha mãe sobre marcas, mas marcou de fato a minha vida”. Quais as grandes marcas que teu pai te legou e que gostarias de mencionar?

Tanto o meu pai quanto minha mãe me ensinaram coisas maravilhosas. Amo demais os dois. Mas confesso que tenho muito do meu pai em mim e nas minhas atitudes. Quem o conheceu concorda com isso e, inclusive, já me falou sobre isso.

Meu pai me ensinou que sempre vale a pena sermos do bem, que a vida vai nos machucar, mas não podemos deixar de sorrir, de ver o lado bom das coisas que acontecem. Meu pai me ensinou a colecionar memórias. Eu não lembro do quanto ele tinha no bolso, das roupas que ele usava. Eu lembro dos momentos em que ele esteve comigo, da dedicação dele comigo, das vezes que ele me filmava brincando de ser jornalista.

Meu pai me ensinou a amar as pessoas e respeitá-las do jeito que elas são. Me ensinou que temos que tratar bem qualquer pessoa, independentemente do quanto ela tem no bolso ou das roupas que ela veste. Ele me ensinou o que é ser em um mundo em que tanta gente só se preocupa com o ter.

A vida acaba confrontando a pessoa com perdas de certa forma irreparáveis. Como é lidar com elas, em tua impressão? A vida tem de continuar?

Sempre digo que a vida continua. O ser humano nunca está preparado para lidar com qualquer tipo de perda, mas penso que cada pessoa tem a sua trajetória e tudo tem um porquê. Apesar de meu pai ter falecido em um assalto, eu ter presenciado tudo e ele ter praticamente morrido na minha frente, não alimentei a raiva e entendo que preciso continuar sonhando, me dedicando, sendo do bem, porque é isso o que ele quer.

A vida nunca vai ser fácil, mas nós escolhemos como lidar com os sentimentos que carregamos no coração. Me formei, já estou lançando meu segundo livro e não tive meu pai fisicamente comigo nesses momentos, mas enquanto ele estiver na minha memória e no meu coração, sempre estará vivo.

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Romar Behling

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Romar Behling

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