A atriz australiana Cate Blanchett tornou-se notícia no Brasil, nesta semana, por motivos diferentes dos habituais. Ganhou destaque por citar e elogiar uma artista brasileira. No último sábado, ao receber homenagem pelo conjunto de sua obra no Festival de Cinema de San Sebastian, na Espanha, Blanchett incluiu no discurso de agradecimento trechos de livros de Clarice Lispector e chamou a escritora – falecida em 1977 – de “gênia absoluta”.
Certo, os brasileiros não precisam do endosso de uma atriz estrangeira para ler Clarice, mas incentivo nunca é demais. Os trechos lembrados pela vencedora do Oscar (duas vezes, por O Aviador e Blue Jasmine) viralizaram na internet e reforçaram a curiosidade em torno da autora, famosa pelo caráter enigmático e por vezes místico de sua literatura. E de sua figura.
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Um deles: “Eu sei de muito pouco. Mas tenho a meu favor tudo o que não sei e – por ser um campo virgem – está livre de preconceitos. Tudo o que não sei é a minha parte maior e melhor: é a minha largueza. É com ela que eu compreenderia tudo.” É uma parte de “Diálogo do desconhecido”, texto publicado na coletânea A descoberta do mundo.
Noutro momento, durante entrevista coletiva, Cate Blanchett – para quem Clarice Lispector é fonte de “coragem em tempos incertos” – voltou a citar a escritora: ‘Só consigo a simplicidade com muito trabalho.” Frase pinçada no romance A hora da estrela, talvez o mais conhecido da brasileira.
Que, na verdade, nasceu na Ucrânia, em 1920. Clarice veio ao mundo como Chaya Pinkhasivna Lispector, filha de judeus em Chechelnyk, na região de Vinnytisa. Sua família chegou ao Brasil em 1922, fugindo da perseguição religiosa durante a Guerra Civil Russa. No Recife, ela ganhou o nome que todos conhecem.
Hoje é a autora brasileira mais traduzida do mundo, à frente de Machado de Assis nesse quesito. Uma literatura densa, por vezes hermética, em que as paisagens interiores têm mais relevo que as exteriores. E não é necessário entender tudo. “Mas tenho a meu favor tudo o que não sei e – por ser um campo virgem – está livre de preconceitos.”
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Em tempos de preconceitos enraizados, pode soar como provocação. Mas é Clarice. Que, numa crônica de Para não esquecer, ensinou: “A criação não é uma compreensão, é um novo mistério”.
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