A investigação sobre possíveis casos de abuso de menores durante o transporte escolar, em Santa Cruz do Sul, identificou novas vítimas. O motorista de uma van foi preso ainda na segunda-feira. A Polícia Civil já havia constatado três casos. O número de vítimas só deverá ser divulgado na próxima semana, quando será concluído o inquérito. A direção do Presídio Regional pediu a transferência do suspeito.
Responsável pela investigação, a delegada Lisandra de Castro de Carvalho, da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), confirmou que a polícia ouviu e identificou novas vítimas. Duas crianças e um adulto, com deficiência, já tinham relatado ter sofrido abusos sexuais do motorista. Os crimes teriam acontecido dentro da van, durante o período em que ele fazia o transporte.
Até o momento, a polícia não divulgou mais detalhes para não atrapalhar as investigações. Por se tratar de um crime contra a dignidade sexual, o caso corre em segredo de Justiça. O nome do preso não foi divulgado pela polícia, até para evitar que as vítimas, que eram transportadas por ele, possam ser identificadas.
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O motorista poderá ser transferido do Presídio Regional. O pedido foi feito pela direção da casa prisional nessa sexta-feira, após a divulgação de vídeos em que ele aparece sendo agredido por outros detentos. A transferência depende agora da aprovação do Judiciário. Ainda na noite de quinta-feira, o suspeito precisou ser isolado dos outros detentos. Vídeos com imagens dele sendo agredido dentro de uma cela passaram a circular nas redes sociais.
O diretor do presídio, Aledison Correia Picolini, acredita que em outro município o caso pode não ter a mesma repercussão. Por isso, fez contato com outra penitenciária da região, que aceitou receber o preso. Ele preferiu não adiantar qual seria o município. A expectativa é receber uma posição sobre o caso até a próxima segunda-feira. Enquanto isso, o suspeito deverá permanecer isolado dos demais. Na quinta-feira, ele foi retirado da cela onde estavam 16 homens. Dois detentos foram identificados pelas imagens e responderão a um processo disciplinar.
Apreensão de celulares
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Duas celas do Presídio Regional passaram por revista após a divulgação de imagens do suspeito sendo agredido. Nove celulares foram apreendidos durante essas buscas. Já o preso foi encaminhado para atendimento médico. No entanto, não se constatou nenhuma lesão de maior gravidade. Ele também foi levado à Polícia Civil para registro do caso.
Sobre o ingresso de celulares na casa prisional, o diretor Aledison Correia Picolini lembrou que foram fixadas telas de proteção sobre as galerias A e B; e a outra, das galerias C e D, está no início da instalação. “É claro que a gente sabe que, de uma maneira ou outra, entraram os telefones, ou não teríamos achado esses aparelhos, mas a gente vem buscando fechar essas válvulas de entrada”, afirmou.
ENTREVISTA
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Roselaine Ferreira da Silva
Psicóloga
Gazeta – Qual a orientação para os pais ficarem atentos a casos de abuso? Deve-se ouvir mais as crianças e observar o comportamento?
Roselaine Ferreira – Sim, em especial estarem atentos a comportamentos, pois as crianças nem sempre falam o que se passa com elas, seja por receio ou medo de algum castigo. Ou porque, dependendo da idade, elas não sabem diferenciar o que é certo ou errado, o que pode ser feito ou não. Como no caso de um possível abuso, as carícias que o abusador realiza podem ser entendidas pela criança como algo inofensivo. No entanto, elas denunciam em comportamentos considerados inapropriados para a idade, como: excessivo isolamento ou excessiva familiaridade com pessoas estranhas; problemas no sono, sendo mais agitado, ou excesso de sono, revelando tendência depressiva, excesso de agressividade ou excesso de apatia. O interessante, nas crianças, é que elas sempre denunciam pela intensidade dos sintomas. É importante verificarmos tudo aquilo que se encontra em excesso, independente do comportamento.
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Gazeta – Nos casos em que for constatado que houve mesmo abuso contra a criança, de que forma os pais devem lidar com isso?
Roselaine – É importante buscar ajuda profissional. Porque essa situação mobiliza toda a família. Os pais, obviamente, se sentem assustados, “machucados” emocionalmente e traídos em seu papel de pais. A família como um todo se sente traída. Dessa forma, é imprescindível o auxílio psicológico de um profissional que esteja isento do turbilhão de emoções que essa situação gera.
Gazeta – Deve-se falar sobre o que aconteceu ou isso pode causar um novo trauma para a criança?
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Roselaine – É importante ter bom-senso, ou seja, evitar falar e tornar esse assunto um segredo torna-se muito ansiogênico e cria sentimentos persecutórios na criança. Ela pode criar a fantasia de que foi a culpada pelo que aconteceu e, além disso, pode entender que é a responsável por sua família estar entristecida, abatida ou raivosa, sentimentos estes gerados nos familiares. Na mesma via, enfocar sempre esse assunto, retomando várias vezes seu conteúdo, acaba gerando estresses desnecessários. Por essa razão é importante a busca de um profissional que auxilie a família, assim como a criança, a falar sobre o assunto, tendo esse profissional um papel de “mediador”, de quem irá transformar em palavras sentimentos que a família, muitas vezes, não compreende. Esse profissional também terá a função de auxiliar na elaboração dos sentimentos tão confusos que marcam a criança neste momento.
Gazeta – O abuso, quando ocorre na infância, pode deixar traumas na vida da vítima?
Roselaine – O abuso, por si só, é um trauma. Dessa forma, a criança já vivencia um, o qual marca suas emoções. Porém, é importante essa elaboração com o auxílio de um psicólogo. Porque ela terá a chance de expor seus sentimentos em um espaço terapêutico, com alguém que está preparado para escutá-la, acolhê-la, de forma a transformar sua angústia em algo menos doloroso. Podemos nos questionar: mas os pais não devem fazer isso? Os pais a acolhem, mas não a escutam, de maneira profissional, não estão atentos às fantasias que um suposto abuso sexual gera na criança. Fantasias desde sentir-se responsável pelo ato ou por aquilo que ela provoca na família, como já exposto, até fantasias de sedução, nas quais a criança que é abusada pode desenvolver a idéia de que ela “sempre irá atrair a atenção dos adultos como atraiu a atenção do abusador”.
Gazeta – É possível superar essa situação do abuso sexual?
Roselaine – Mais uma vez, reitero ser importante o auxílio de um profissional capacitado para lidar com essas questões, pois qualquer forma de abuso (seja físico, emocional, sexual) provoca nas crianças e em seu contexto familiar inúmeras fantasias, medos, ansiedades que podem ser amenizadas ou elaboradas para o futuro bem-estar da criança e de quem convive com ela. Quem vivencia essa situação não está fadado ao insucesso na vida, mas é importante “cuidar das feridas provocadas” para uma melhor e mais rápida “cicatrização”, sendo essa a cura para todo possível sintoma ou problema psíquico.
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